Criminalidade no Porto era mais baixa no ano passado do que em 2019

Imigrantes cuja casa foi invadida foram ouvidos esta terça-feira na Polícia Judiciária.

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Vigília e manifestação organizada pelo SOS Racismo, depois de um grupo de encapuzados ter entrado numa casa de imigrantes, agredindo-os com paus Paulo Pimenta (arquivo)
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Apesar do sentimento de insegurança de que se queixam moradores e lojistas da freguesia do Bonfim, no Porto, a evolução da criminalidade na cidade parece ter sido sensível à pandemia de covid-19 mas não ao aumento da imigração. A criminalidade no município e no distrito do Porto foi o ano passado mais baixa do que em 2019 e em 2018, apesar de nestes seis anos ter mais do que duplicado o número de estrangeiros residentes no distrito.

O professor da Faculdade de Psicologia da Universidade do Porto, Luís Fernandes, que foi director científico do antigo Observatório Permanente de Segurança, sublinha que, em geral, os estudos mostram que os imigrantes cometem menos crimes que os locais. Mas reconhece que, se há um grupo grande de estrangeiros a viver num país, é normal que cometam crimes como os nacionais.

O investigador insiste que é exactamente igual ser assaltado por um argelino ou por um português e que a reacção do sistema penal deve ser a mesma, já que somos todos iguais perante a lei. Compreende, contudo, que alguns fenómenos possam gerar um sentimento de insegurança. “Quanto mais diferente o outro for, mais medo gera”, constata.
Daí que o universitário considere importante que as polícias respondam ao crime quotidiano, sem descurar o trabalho de descobrir quem são estes grupos extremistas, como o que invadiu na madrugada da sexta-feira passada uma casa onde vivem 11 imigrantes.

O grupo, que teria entre 10 e 15 elementos, segundo a PSP, ia armado com bastões, paus e facas, tendo agredido parte dos imigrantes. Esta terça-feira, uma parte das vítimas do ataque, a maioria cidadãos argelinos, foi ouvida pela Polícia Judiciária, no âmbito da investigação ao crime de que foram alvo.
Luís Fernandes diz-se mais preocupado com os extremistas do que com a simples delinquência, porque, enquadrando-se no crime organizado, são mais perigosos.

Estrangeiros duplicaram em cinco anos

De volta aos números. Em 2022, o último ano para o qual existem dados oficiais, o extinto Serviço de Estrangeiros e Fronteiras contabilizava 66.434 estrangeiros residentes no distrito do Porto, mais do dobro dos 32.614 registados em 2018, ou seja, cinco anos antes. Representavam 8,5% dos estrangeiros a nível nacional. Na cidade do Porto, os residentes não nacionais eram 23.312, ou seja, 9,7% do total dos mais de 240 mil habitantes do concelho.

O ano passado, as autoridades registaram 14.552 crimes na cidade, menos 5,6% do que os contabilizados em 2019 e uma redução de 8,7% face a 2018, segundo os dados dos sucessivos relatórios anuais de segurança interna. Os crimes registados no município do Porto em 2023 significaram um agravamento face aos 13.417 registados no ano anterior e aos 10.956 contabilizados em 2021, o primeiro ano completo da pandemia de covid-19. Em 2020, ano em que, em Março, o novo coronavírus paralisou o país e grande parte do mundo, as forças de segurança registaram 12.188 ocorrências.

A evolução da criminalidade no distrito do Porto teve exactamente a mesma tendência, ou seja, o ano passado o número de ocorrências era inferior a 2019. E não só relativamente a esse ano, mas aos cinco anos anteriores. Em 2023, as autoridades contabilizaram no distrito 55.730 crimes, menos que os 57.879 registados cinco anos antes.
Para Luís Fernandes, que dirigiu durante vários anos o Centro de Ciências do Comportamento Desviante da Faculdade de Psicologia da Universidade do Porto, era expectável que esta tensão entre nacionais e estrangeiros acontecesse. “Era uma questão de tempo. O mesmo aconteceu há 20 ou 30 anos em países europeus mais desenvolvidos que atraíram grandes vagas de imigrantes”, lembra o professor universitário.

O investigador lamenta que o país precise dos imigrantes para trabalhos que os nacionais não querem fazer, como na agricultura, mas depois não “integre devidamente estas pessoas”. E lamenta que alguns tenham a crença que existem portugueses puros e se esqueçam que existem quatro milhões de emigrantes portugueses.
Quanto à cidade do Porto, o investigador recorda que a cidade assistiu nos últimos anos a uma alteração profunda na ocupação do seu espaço, essencialmente no centro, que primeiro se esvaziou e depois foi povoado pelos turistas. “Este repovoamento ainda não gerou novos equilíbrios”, lamenta.

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