Descida de 1500 milhões no IRS afinal só traz alívio adicional de 200 milhões

Redução anunciada por Luís Montenegro já incorpora o corte de 1327 milhões decidido por Costa, admite o novo ministro das Finanças. É um “embuste”, diz Pedro Nuno Santos.

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Joaquim Miranda Sarmento durante o debate do programa de Governo, na quinta-feira António Cotrim/Lusa
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O novo ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, admitiu esta noite que a nova redução do IRS anunciada por Luís Montenegro só rondará 200 milhões de euros.

A descida será dessa ordem de grandeza, porque a larga maioria do corte fiscal de 1500 milhões de euros prometido no Parlamento pelo primeiro-ministro decorre da redução que está em vigor, aprovada com o Orçamento do Estado para 2024 por iniciativa do Governo de António Costa.

Numa entrevista no Telejornal da RTP, Miranda Sarmento confirmou que a redução de 1500 milhões de euros não pode somar-se ao desagravamento de 1327 milhões que já está de pé, que resulta de três medidas (não apenas da redução das taxas, mas também da actualização dos valores que definem os escalões em 3% em relação a 2023 e do aumento do patamar do mínimo de existência, regra que garante uma isenção parcial ou total dos rendimentos para quem ganha menos).

Embora a primeira declaração de Montenegro já indiciasse que a redução seria desta dimensão, porque o primeiro-ministro disse no Parlamento que o corte de 1500 milhões era “face ao ano passado”, não era totalmente claro que a medida se cingisse a esta dimensão.

O líder do Partido Socialista, Pedro Nuno Santos, fala num “​embuste” e reclama os louros da maior descida para o PS.

Questionado se, afinal, o novo corte será inferior a 200 milhões (173 milhões), o novo ministro disse que o montante exacto não está fechado porque o executivo ainda está a “calibrar” a proposta de lei que aprovará no Conselho de Ministros da próxima semana, mas admitiu que o valor em causa corresponderá a “mais de 200 milhões” de euros.

Confrontado com o facto de o impacto de 1500 milhões vir, na maioria, do que já está em vigor pela mão do PS, Joaquim Miranda Sarmento defendeu-se dizendo que o PSD já tinha apresentado uma proposta de descida do imposto durante o Verão de 2023, antes de o Governo de Costa apresentar a sua no Orçamento do Estado para 2024. E salientou que, no final de contas, entre 2023 e 2024, haverá um “desagravamento fiscal significativo”.

A proposta do Governo de coligação do PSD e CDS-PP, disse, traz uma descida maior (porque não se cinge aos cinco primeiros patamares de rendimento, mas sim até ao oitavo) e será “mais ambiciosa” do que aquela que o partido apresentou no Verão. Face a 2023, abrangerá “muitos” mais contribuintes do que na versão do PS.

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A proposta que os sociais-democratas lançaram durante a discussão do OE para este ano, já depois de conhecida a proposta do executivo mas baseada naquela que o partido tinha anunciado em Agosto, baixa as taxas do IRS dos oito primeiros escalões.

Nos cinco primeiros patamares de rendimento (aqueles em que já há uma descida face a 2023), os valores propostos pela bancada do PSD são próximos dos que estão em vigor, embora em dois casos as taxas sejam superiores.

Neste momento, a taxa do primeiro escalão é de 13,25% e, no OE, o PSD apontava para uma taxa de 13%; no segundo patamar, a taxa em vigor é de 18% e, neste caso, o PSD propunha que ficasse nos 19%. O mesmo se passa com o terceiro degrau, em que a taxa em vigor é de 23% e o PSD propunha que ficasse nos 23,5%; no quarto escalão, a taxa é de 26% e a bancada social-democrata colocava em cima da mesa uma descida para os 25,5%; no quinto, acontece o mesmo: ficou nos 32,75% e o PSD queria uma descida para 32%.

A partir daí, do sexto ao nono, não houve alterações nas taxas (embora os contribuintes também sintam uma descida do IRS por causa da progressividade do imposto). Para o sexto, o PSD propunha baixar as taxas dos actuais 37% para 34%; para o sétimo, de 43,5% para 43%; e para o oitavo, de 45% para 44,75%.

É um desagravamento que “favorece sobretudo as famílias da classe média”, disse Miranda Sarmento.

“Portugueses foram enganados”, diz PS

Em declarações ao PÚBLICO, o secretário-geral do PS é duro na reacção à clarificação de que o impacto adicional será menor e pede explicações a Luís Montenegro.

“Embuste, fraude e logro” são adjectivos usados por Pedro Nuno Santos. O líder socialista considera que “os portugueses foram enganados” e que o chefe de Governo “deve uma explicação ao país”.

“Já não estamos em campanha eleitoral e é hora de governar com seriedade e competência”, continua Pedro Nuno Santos, acrescentando que “não estamos perante um choque fiscal, mas perante um choque de desfaçatez”.

Pedro Nuno Santos diz que a maior fatia do desagravamento é “da responsabilidade do Governo socialista” e critica o executivo por, durante a manhã desta sexta-feira, no segundo dia de debate ao Programa do Governo, não ter esclarecido notícias que davam conta de uma duplicação no corte fiscal face OE deste ano. “Deixaram e quiseram que se passasse a ideia de que iam apresentar uma medida quer representava uma poupança de 1500 milhões”, afirma, sublinhando que o corte foi mesmo apresentado por Montenegro como “a principal medida do programa”.

Ajuste nas retenções

O ministro confirmou, tal como o PÚBLICO noticiou esta sexta-feira, que será com base na nova versão da tabela do IRS que o fisco irá calcular o imposto final sobre todos os rendimentos ganhos em 2024, de 1 de Janeiro a 31 de Dezembro, por causa do princípio da anualidade do imposto.

A partir do momento em que as novas taxas estiverem em vigor, o Ministério das Finanças conta ajustar as tabelas de retenção na fonte, confirmou também o ministro. Isso significa que mensalmente, os trabalhadores por conta de outrem e os pensionistas irão sentir um novo alívio no IRS entregue ao Estado, quando as entidades empregadoras ou a Segurança Social, a Caixa Geral de Aposentações ou outras entidades processarem os salários e as reformas.

Quando isso acontecerá, ainda não se sabe: dependerá do momento da entrada em vigor da nova lei e do momento em que o ministro das Finanças ou a secretária de Estado dos Assuntos Fiscais assinar o despacho com as novas tabelas mensais e ele for publicado em Diário da República para que as entidades pagadoras ajustem os sistemas informáticos e passem a aplicá-los nos processamentos salariais e de reformas seguintes.

Notícia actualizada às 21h54:
Incluídas declarações de Pedro Nuno Santos ao PÚBLICO, de sentido idêntico às anteriormente citadas, que resultavam de declarações ao Expresso.

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