World Central Kitchen: o “112 da ajuda alimentar”

Os “socorristas alimentares” da organização fundada pelo chef José Andrés já enviaram ajuda humanitária para Gaza por terra, ar e mar.

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A WCK suspendeu a sua actividade depois de sete dos seus funcionários terem sido mortos pelo Exército israelita Reuters/ISRAEL DEFENSE FORCES
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Em 2010, na sequência do terramoto que devastou o Haiti, o chef José Andrés partiu para a ilha caribenha para, através da comida, entregar "conforto e esperança" àqueles cuja vida foi virada do avesso. Foi assim criada a World Central Kitchen (WCK), uma organização não governamental, responsável por entregar mais de 350 milhões de refeições em locais afectados por desastres naturais ou guerras. Catorze anos passados desde a sua fundação e depois de passagens por Porto Rico, pelos Estados Unidos e pela Ucrânia, a equipa tem reunido esforços para ajudar a população de Gaza. Nesta segunda-feira, sete dos seus trabalhadores foram mortos pelo Exército israelita.

Nascido nas Astúrias, em Espanha, José Andrés e a família partiram para Barcelona quando o agora chef tinha apenas seis anos. Aos 21 anos, rumou aos Estados Unidos onde estabeleceu o seu império. O grupo de restauração de que é dono, o ThinkFoodGroup, tem já 40 restaurantes com o seu nome.

De acordo com o site da organização, a World Central Kitchen "responde a desastres naturais, a crises provocadas pelo homem e a emergências humanitárias em todo o mundo" e define-se como "uma equipa de socorristas alimentares que se mobiliza com a urgência do agora para levar refeições às pessoas que mais precisam delas", já que "uma refeição nutritiva em tempos de crise é muito mais do que um prato de comida — é esperança, é dignidade e é um sinal de que alguém se preocupa".

Depois do trabalho feito no Haiti, o chef viajou até Houston, no Texas, atingida pelo furacão Harvey e, um mês depois, para Porto Rico, destruído pelo furacão Maria. É na sequência dessas tragédias que a WCK se estabelece como o "911 (112) da ajuda alimentar", como a própria se descreve.

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José Andrés num encontro o Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, em 2022 Ukrainian Presidential Press Service/Handout via REUTERS

No entanto, a organização "não responde a uma lista fixa de desastres ou crises", basta que o acesso a comida seja interrompido para que as equipas do chef hispano-americano, que chegou a ser nomeado para o Nobel da Paz, em 2019, se dirijam para o local afectado. É exemplo disso o trabalho desempenhado pela organização durante a pandemia, onde foram distribuídas 40 milhões de refeições em mais de 400 cidades.

Também a guerra na Ucrânia exigiu que os trabalhadores humanitários na WCK se mobilizassem para distribuir mais de 260 milhões de refeições, tanto no território ucraniano quanto nas fronteiras do país.

Com a escalada da violência no Médio Oriente, a World Central Kitchen enviou equipas para Gaza, Israel e para os países vizinhos, para "alimentar todos e quaisquer civis que não tenham acesso a alimentos", de acordo com a CEO da organização, num comunicado divulgado a 11 de Outubro último. Assim, a ONG norte-americana tem sido capaz de enviar ajuda humanitária por terra, ar e mar, através de parcerias com outras instituições próximas do terreno, como é o caso da Anera, uma organização que, desde 1968, tem trabalhado de perto com as comunidades afectadas pelos conflitos na região.

Em Dezembro, a WCK conseguiu implementar em Rafah — para onde fugiram milhares de palestinianos, vindos do Norte de Gaza —​ uma cozinha, destinada a alimentar todos os que procuram ali refúgio. O combustível rapidamente se tornou um dos bens de difícil acesso em Gaza, pelo que a WCK desenvolveu fogões específicos que, em vez de gás, utilizam madeira, sem perder a eficiência e a capacidade de cozinhar muitas refeições.

A WCK também instalou mais de 60 cozinhas comunitárias que permitem descentralizar a distribuição de produtos alimentares. "Estas cozinhas, geridas por palestinianos, têm capacidade para produzir cerca de 2000 refeições por dia", refere a ONG, que treina equipas para serem capazes de gerir as cozinhas e entrega camiões com alimentos, instrumentos necessários e fogões.

No início de Fevereiro, José Andrés juntou-se à Força Aérea da Jordânia e dos Países Baixos para lançar, pelo ar, ajuda humanitária.

Por terra, a ONG do chef galardoado com duas estrelas Michelin tem enviado camiões carregados de comida e água que, ao chegarem a Gaza, são distribuídas pelas equipas da Anera, em abrigos e em hospitais.

Foi também a World Central Kitchen que permitiu que, pela primeira vez, chegasse ajuda por mar ao enclave, através do corredor marítimo de Chipre, de onde partiu o navio da ONG espanhola Open Arms com 200 toneladas de alimentos, descarregadas através de um cais construído pelos próprios trabalhadores da organização norte-americana.

No início desta semana, outro navio vindo do Chipre entregou 330 toneladas de ajuda humanitária à população de Gaza.

Depois de sete dos seus trabalhadores terem sido mortos numa operação do Exército israelita, a WCK suspendeu a sua actividade na Faixa de Gaza.

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