Unidades “integradas” de saúde, em vez de ULS

A polémica sobre as unidades locais de saúde é, na sua essência, disparatada. Se retirássemos a palavra “locais”, provavelmente perderíamos a maioria dos opositores ao modelo.

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Ao aproximarmo-nos a passos largos de (mais) um momento eleitoral particularmente importante, têm sido muitas as expressões de opiniões sobre o tema Saúde que nos últimos anos ocupou uma posição particularmente relevante na análise e escrutínio públicos.

Nos últimos meses, temas como a falta de médicos no Serviço Nacional de Saúde (SNS), o papel do setor privado e do setor social na prestação de cuidados, a “crise” (permanente) das urgências ou a criação generalizada de unidades locais de saúde (ULS) foram objeto de inúmeras discussões, polémicas e afirmações públicas. Estas últimas foram, não raras vezes, eivadas de desconhecimento, aproveitamento e hipocrisia.

É neste contexto que a polémica sobre as ULS é, na sua essência, disparatada. Se retirássemos a palavra “locais”, provavelmente perderíamos a maioria dos opositores ao modelo. Se não, vejamos:

O que se pretende com este tipo de “nova” organização é uma verdadeira integração de cuidados, sem a qual a despesa em saúde atingirá rapidamente a insustentabilidade. E pretende-se que essa integração de cuidados promova uma eficiência de processos, por sua vez com mais qualidade, o que resultará numa melhoria da saúde e numa diminuição da despesa.

Mas essa integração não ocorre apenas entre cuidados de saúde primários e cuidados de saúde hospitalares. É também uma integração entre o prestador público e as entidades privadas. Veja-se o exemplo dos cheques-cirurgia, emitidos por falta de cumprimento dos tempos máximos de resposta garantidos, os cheques-dentista ou os meios complementares de diagnóstico e terapêutica (vulgo MCDT) executados em entidades convencionadas. Existem vários outros exemplos.

É também a integração entre unidades hospitalares com diversificadas diferenciações para especialidades que não estejam presentes na unidade de base populacional. Ou destas com outras de dedicação temática, como os IPO.

Integração também no contexto da formação pré e pós-graduada, que não é já apenas apanágio dos clássicos hospitais universitários, e que engloba a formação de médicos, enfermeiros, nutricionistas, psicólogos, assistentes sociais, técnicos de diagnóstico e terapêutica, técnicos auxiliares de saúde, entre outros.

A multidisciplinaridade, o foco na “jornada do paciente” entre níveis de cuidados, a aproximação da prestação desses mesmos cuidados ao ponto onde o doente se encontra e o potencial de inovação tecnológica no contexto do atrás referido são apenas alguns exemplos do que este modelo traz de positivo, e que deve, assim, ser incentivado.

Esta reorganização em ULS suporta igualmente a alteração de um modelo de financiamento baseado no ato, que promovia o despesismo e a ineficiência, e cuja substituição era absolutamente indispensável. A mudança de paradigma de financiamento trará certamente desafios relevantes, mas do ponto de vista do potencial positivo do mesmo não deixa grandes dúvidas a quem, no terreno, é responsável pela sua implementação.

Por isso, deixo o desafio de “colocarmos de parte” o nome “unidade local de saúde” e deixarmos as organizações agora criadas ou confirmadas exercer a sua missão de proximidade, eficiência e complementaridade como “unidades integradas de saúde”, que é aquilo que verdadeiramente são!

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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