Albânia vai começar a receber requerentes de asilo resgatados em águas italianas

Ursula von der Leyen vê o acordo como um “exemplo de pensamento inovador”, ONG falam em pacto “ilegal” e “desumanizante”. Por ano, Roma espera processar 36 mil pedidos de asilo em território albanês.

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O parlamento albanês ratificou o acordo assinado em Novembro com a Itália Reuters/FLORION GOGA
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Pela primeira vez, um Estado-membro da União Europeia vai enviar migrantes que chegam ao seu território para um terceiro país, que não faz parte da UE. Depois da aprovação no Parlamento albanês, que aconteceu esta quinta-feira, Itália e Albânia podem agora começar a pôr em prática o acordo assinado em Novembro pelos seus governos.

Brevemente, dois centros de acolhimento financiados e geridos por Roma em território albanês vão poder acolher 3000 pessoas em simultâneo – se os processos decorrerem com a rapidez desejada, a primeira-ministra italiana, Georgia Meloni, acredita que, por ano, poderão passar pelas novas instalações 36 mil requerentes de asilo. Um dos centros vai registar os pedidos; o outro vai alojar os requerentes à espera de resposta.

Um grupo de 30 deputados do Partido Democrático albanês (conservador, de centro direita), na oposição, tentou bloquear a ratificação do acordo, recorrendo ao Tribunal Constitucional, mas os juízes declaram, no fim de Janeiro, que o texto “respeita a Constituição”.

Derrotados, os deputados conservadores bloquearam o voto (aprovado por 77 parlamentares numa assembleia de 140), denunciaram um “acto irresponsável e perigoso para a segurança nacional” e acusam o Governo do socialista Edi Rama de ter abdicado da soberania territorial.

Apoiado pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que o descreveu como uma “iniciativa importante”, um “exemplo de pensamento inovador, baseado numa partilha justa de responsabilidades com terceiros países, em linha com o direito da UE e a lei internacional” (“inovador e inteligente”, nas palavras de Meloni), o acordo tem sido duramente criticado por organizações de direitos humanos.

A Amnistia Internacional descreveu-o como “ilegal e impraticável”, sublinhando que a Comissão Europeia “já deixou claro que a legislação da UE em matéria de asilo não pode ser aplicada fora da UE”. A ONG International Rescue Committee disse que este pacto “desfere mais um golpe ao princípio da solidariedade da UE”, notando que a noção de “processamento de migrantes” usada no debate “é profundamente desumanizante”.

O projecto é idêntico ao que o Reino Unido negociou com o Ruanda, para enviar para o país os requerentes que cheguem a território britânico “por vias irregulares”, como o Canal da Mancha, mas que o Supremo Tribunal declarou ilegal. Ainda assim, o primeiro-ministro conservador, Rishi Sunak, garante que os primeiros aviões “vão descolar na Primavera, tal como planeado”.

É precisamente na Primavera que Meloni espera ter os centros na Albânia em funcionamento. Segundo a imprensa italiana, o projecto envolve um investimento de 600 milhões de euros nos primeiros cinco anos.

As autoridades italianas vão pagar todas as despesas envolvidas, incluindo os cuidados médicos dos requerentes de asilo, e serão legalmente responsáveis pelos migrantes ao longo de todo o processo. Terão também a cargo a segurança nos centros – a polícia albanesa vai ocupar-se da segurança no exterior das instalações e durante o “transporte de migrantes de uma zona à outra”.

No final, caberá a Itália receber estas pessoas ou encarregar-se das suas deportações, caso os pedidos de asilo sejam negados.

O Governo italiano liderado por Meloni declarou, em Abril do ano passado, o estado de emergência migratório, que lhe permite acelerar o repatriamento daqueles que as autoridades considerarem que não têm direito a asilo – outros países europeus têm aprovado medidas com o mesmo objectivo, como a Alemanha em Janeiro.

Em 2023, segundo dados do Governo da direita radical, chegaram a Itália quase 158 mil migrantes; no ano anterior, tinham sido 105 mil.

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