Agricultura urbana produz seis vezes mais CO2 do que a tradicional

Estudo avaliou agricultura urbana em cinco países. Infra-estruturas, consumíveis e abastecimento de água são principais fontes de emissões, mas impacto social benéfico é factor positivo a avaliar.

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As hortas urbanas promovem o bem-estar dos seus utilizadores, de acordo com os estudos Oxana Ianin
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A agricultura urbana é uma forma de produção de alimentos que tem o potencial de mudar padrões de consumo e transforma a relação que as pessoas têm com a terra e com a forma de se alimentarem, mas como todas as actividades é também responsável pela emissão de dióxido de carbono (CO2) e outros gases com efeito de estufa. Um novo estudo avaliou as emissões de diferentes tipos de agricultura urbana e concluiu que, em média, esta actividade produz seis vezes mais CO2 equivalente do que a agricultura convencional.

O trabalho, publicado na nova revista Nature Cities, advoga formas de tornar a agricultura urbana mais sustentável.

“A agricultura urbana oferece uma variedade de benefícios sociais, nutricionais e ambientais de carácter local, o que a torna uma característica apelativa para as cidades sustentáveis do futuro”, disse Jason Hawes, aluno de doutoramento da Faculdade para o Ambiente e a Sustentabilidade da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, e primeiro autor do artigo, citado num comunicado daquele estabelecimento.

Entre 20% e 30% da população urbana global tem alguma actividade ligada à agricultura urbana, de acordo com algumas estimativas, adianta o comunicado. “Este trabalho ajuda a mostrar formas de assegurar que a agricultura urbana beneficia o clima, assim como as pessoas e os lugares que serve”, adiantou Jason Hawes.

A investigação avaliou 73 explorações de agricultura urbanas em cinco países diferentes: Alemanha, Estados Unidos, França, Polónia e Reino Unido. Das 73 explorações, nove eram jardins colectivos urbanos (espaços comuns, geridos por um grupo de jardineiros), sete eram quintas urbanas (geridas de uma forma profissional e com o objectivo principal de produzirem alimentos) e 55 eram jardins individuais. Duas das explorações não entraram em nenhuma das três categorias acima. O trabalho teve um contributo de cientistas cidadãos para se recolher os dados.

De acordo com os resultados, as fontes de emissão de carbono estão ligadas a três dimensões do trabalho agrícola no contexto urbano: emissões de gases com efeito de estufa na produção e transporte do material usado para construir infra-estruturas, como os canteiros levantados e os barracões; consumíveis como fertilizantes, o tecido usado para tapar a terra e não deixar crescer outras ervas e a gasolina quando se utilizam máquinas; e a água para a irrigação que, se o abastecimento vier da rede ou de furos, pode necessitar de energia para ser transportada.

Contabilizando estas fontes de emissão, a equipa de investigadores calculou que, em média, a agricultura urbana emite 0,42 quilogramas de CO2 equivalente por serviço (esta unidade representa a quantidade de gramas necessários para cada tipo de alimento para uma pessoa durante um dia, de acordo com as directrizes alimentares), enquanto a agricultura convencional emite 0,07 quilogramas de CO2 equivalente – ou seja, emite seis vezes menos.

“A maioria dos impactos climáticos nas quintas urbanas são causados pelos materiais usados para as construir – a infra-estrutura”, disse por sua vez Benjamin Goldstein, professor na Faculdade para o Ambiente e a Sustentabilidade da Universidade de Michigan, citado no mesmo comunicado. “Estas quintas tipicamente só operam por alguns anos ou por uma década, por isso os gases com efeito de estufa emitidos para produzir estes materiais não são usados de uma forma eficaz. Por outro lado, a agricultura convencional é muito eficaz e é difícil de competir com isso.”

Se se conseguir estender os anos de vida destas explorações, então é possível baixar o peso das emissões libertadas na produção dos materiais usados nas infra-estruturas. Outra forma de evitar este impacto é usar material em segunda mão na construção das infra-estruturas, aponta o artigo. Este método faz parte de uma ideia de economia circular ou de “simbiose urbana”, como se lê no artigo, que pode ter a agricultura urbana no seu epicentro.

Os autores defendem a compostagem a partir do material orgânico descartado na cidade como fertilizante natural das quintas e jardins urbanos, além das águas da chuva e das águas tratadas como formas de reduzir as emissões de gases com efeito de estufa associadas às fontes de água tradicionais.

O tomate é excepção

Embora em média a agricultura urbana emita mais CO2 equivalente – isto de acordo com os países analisados –, há muitas diferenças entre o tipo de exploração e até consoante as culturas agrícolas. As quintas urbanas, que são mais intensivas, têm emissões semelhantes à agricultura tradicional, por exemplo.

Por outro lado, o tomate que cresce naturalmente num pedaço de terra no meio da cidade é muito menos poluente do que aquele que cresce em estufas. Além disso, no caso de alimentos que sejam transportados de avião, mesmo sendo produzidos convencionalmente, têm mais emissões associadas do que os mesmos alimentos produzidos no jardim urbano, que estão num contexto de proximidade.

“As excepções reveladas pelo nosso estudo sugerem que os praticantes de agricultura urbana podem reduzir o impacto climático cultivando culturas que, tipicamente, são produzidas em estufas ou transportadas por meio aéreo”, defendeu Jason Hawes.

Há ainda um ponto importante relativamente ao bem-estar pessoal e à importância social que a agricultura urbana promove e que é importante ser colocada nesta equação das emissões de gases com efeito de estufa, adiantam os autores.

“Uma análise do custo-benefício de um jardim colectivo no Reino Unido estimou que os benefícios sociais, como a melhoria do bem-estar e a diminuição de admissões nos hospitais, contabilizaram 99,4% do total do valor gerado economicamente naquele sítio”, lê-se no artigo. “Uma vez que a distribuição das emissões segue muitas vezes a geração de valor económico, os espaços de cultivo que maximizam os benefícios sociais podem superar a agricultura convencional quando os benefícios da agricultura urbana são considerados de forma holística.”

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