Fentanil: DGS revê circular sobre opióide responsável por “epidemia” nos EUA

Direcção-Geral da Saúde vai rever documento de 2008. O fentanil está no centro de uma grave crise de toxicodependência nos EUA.

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Nos Estados Unidos, o fentanil está na origem de uma crise de toxicodependência que já fez milhares de vítimas mortais Reuters/SHANNON STAPLETON
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A Direcção-Geral da Saúde vai rever a circular relativa ao uso de medicamentos opióides fortes na dor crónica não oncológica, anunciou a instituição, no dia em que foi noticiado que já há em Portugal casos de dependência de fentanil.

O jornal Expresso noticiou esta sexta-feira que 12 pessoas já pediram ajuda em Portugal para serem tratadas por dependência de fentanil – um analgésico opióide altamente viciante e que está a causar uma "epidemia" de mortes por overdose nos EUA.

Contactada pela Lusa sobre a circular em vigor – que é de 2008 e diz que apesar de não haver dados suficientes "parecem não se confirmar os receios de tolerância e da adição induzidos por estes medicamentos" – a DGS respondeu que, "tendo por referência os dados epidemiológicos e evidência científica disponíveis", vai rever o documento.

O Expresso relata vários casos de dependência deste opióide e, citando o Instituto para os Comportamentos Aditivos e as Dependências (ICAD), diz que os casos ocorreram no ano passado e um já este ano.

Entre estas 12 pessoas, escreve, "oito usavam fentanil juntamente com outras drogas, mas as restantes quatro estavam exclusivamente viciadas nesta substância, que nos últimos anos tem vindo a ser cada vez mais prescrita pelos médicos para o controlo da dor".

Na resposta enviada à Lusa, a DGS lembra que, apesar de ser de 2008, a circular em causa refere que "os medicamentos opióides fortes actualmente disponíveis em farmácia de oficina [agora designada por "farmácia comunitária"] implicam a prescrição e utilização de uma receita especial".

"A utilização de "receita especial" reflecte a preocupação com o carácter excepcional destes fármacos", insiste.

A DGS reforça que a prescrição destes fármacos tem legislação que regula a sua utilização, "não estando isentas a avaliação médica individual de cada situação".

Contactada pelo Expresso, a presidente do Colégio de Medicina da Dor da Ordem dos Médicos, Graça Mesquita, disse que não existe em Portugal nenhum mecanismo de monitorização ou controlo de prescrição específico para o fentanil. Todos os médicos, independentemente da especialidade, podem receitá-lo, sendo que os médicos de família estão entre os que mais o prescrevem.

Questionada sobre esta matéria, a DGS responde que não tem competências sobre a regulação e monitorização do sector farmacêutico, nomeadamente sobre o consumo de medicamentos opióides, ou sobre a prevenção de comportamentos aditivos e dependências.

Na resposta, refere igualmente que a monitorização regular dos doentes para avaliação da eficácia terapêutica quanto à redução da intensidade da dor e identificação de efeitos secundários "remete para o ato em saúde em contexto individual (ex. avaliação clínica, em consulta), e não para uma monitorização de base populacional".

Nas farmácias, o fentanil – o quarto analgésico opióide mais prescrito em Portugal – é vendido habitualmente sob a forma de adesivos ou comprimidos.

O facto de produzir efeitos mais rapidamente do que outros opióides, como a morfina, faz com que seja frequentemente administrado ou prescrito em situações de dor intensa, aguda ou crónica.

De acordo com um estudo divulgado no ano passado por investigadores da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, morrem por dia nos Estados Unidos da América cerca de 300 pessoas devido ao uso deste opióide.

Nos últimos 10 anos, o fentanil tornou-se uma droga mais consumida do que a heroína. A epidemia criada pelo consumo deste opióide sintético poderá matar mais de 1,2 milhões de pessoas até ao final desta década, segundo a estimativa de um estudo publicado em 2022 na revista The Lancet.

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