Agricultores rejeitam cortes e ameaçam revolta. “A agricultura não pode ser sacrificada”

O momento ainda é de “diálogo” com o Governo, mas o protesto de rua está em cima da mesa. Agricultura recusa reduções de 70% de água nos pomares.

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Agricultores do Algarve estão preocupados com a falta de água para as suas produções Rui Gaudêncio
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Os agricultores algarvios rejeitam a proposta de cortes de 70% na água para o regadio, e ameaçam sair em protesto. “Neste momento, não queremos colocar em cima da mesa o que possa vir a acontecer, mas basta olhar para a Alemanha, paralisada com protestos [dos agricultores]... Aqui, no Algarve, podem acontecer coisas semelhantes”, avisa o presidente da associação AlgarOrange, José Oliveira, advertindo: “Não gostaríamos de chegar a essa situação.”

Com a mesma mensagem de que os cortes são incomportáveis para os agricultores, Macário Correia frisa que a postura ainda é de “diálogo” com o Governo, manifestando-se ao mesmo tempo impaciente com a inércia da administração central para investir os fundos do Plano de Recuperação e Resiliência: “Existe dinheiro [200 milhões do PRR], façam obras, mexam-se!” As declarações foram feitas durante uma conferência de imprensa nesta terça-feira em Loulé, em que era dada a conhecer a reacção do sector agrícola depois de várias associações de agricultores do Algarve terem estado reunidas na segunda-feira.

A situação de seca que a região vive, lembrou o ex-autarca Macário Correia (actual presidente da Associação de Regantes do Sotavento Algarvio), é conhecida há uma década. “Alguém não tomou as decisões no tempo certo”, aponta. Há uns anos, prosseguiu, “alguns titulares de cargos de Estado, desdenharam, desprezaram, para arrancar com novas barragens”. Agora, diz, é “correr atrás dos prejuízos”.

De acordo com o plano de eficiência hídrica, sublinha Macário Correia, “este plano mostra que as perdas do ciclo urbano são de 30 milhões de metros cúbicos, isto é crime”. “Nós não aceitamos que quem desperdiça água desta maneira seja compensado com uma redução simbólica de 15%.” Com a água que desaparece nas canalizações das cidades e vilas, exemplifica, seria possível fazer 10 mil hectares de regadio. Já as perdas do sector agrícola, esclarece, são de cinco milhões de metros cúbicos.

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Macário Correia na conferência imprensa de agricultores do Algarve nesta terça-feira LUÍS FORRA/LUSA

As câmaras municipais dispõem no PRR de uma verba de 35 milhões para reparar as redes de abastecimento público. “Obras, não conhecemos”, critica Macário. O antigo presidente da câmara de Tavira e Faro esclarece: “Sabemos que beber água é prioritário sobre qualquer uso, não podemos é ter rotundas relvadas e, nalguns casos, empreendimentos turísticos com consumos per capita de mil litros por dia.”

O que propõem os agricultores é que o Governo autorize “ir aos furos municipais buscar água”, uma vez que esse direito passou para a empresa Águas do Algarve – que gere, em alta, o sistema de abastecimento público. Por outro lado, sugere ainda a redução do caudal ecológico de algumas barragens e, em simultâneo, arrancar com “urgência” com as obras para acabar com as perdas na rede de abastecimento público.

A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), salientou, “tem posições coincidentes com as nossas”. Uma coisa parece-lhe certa: “A agricultura não pode ser sacrificada.” Durante a tarde desta terça-feira, os representantes do sector têm encontros marcados com a ministra da Agricultura e o ministro do Ambiente.

A Comissão Interministerial de Acompanhamento da Seca deve reunir-se na quarta-feira, dia em que deverá ser anunciada a decisão do Governo sobre como é que a região vai lidar com a escassez de recursos hídricos. Prevê-se que sejam anunciadas medidas a somar à intenção de impor cortes de 70% para a agricultura e de 15% para os consumidores urbanos, o que inclui o sector do turismo.

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