Benfica, Sp. Braga e Portimonense na lista dos clubes que ignoraram sanções à Rússia

Em causa estão transferências de jogadores para clubes russos, após a guerra na Ucrânia. Investigação de consórcio de media internacional identifica 30 negócios na Europa sob suspeita.

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Tomás Tavares foi transferido do Benfica para o Spartak Moscovo em Janeiro deste ano LUSA/TIAGO PETINGA
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O Benfica, o Portimonense e o Sp. Braga são os três clubes portugueses que constam da lista de 28 emblemas europeus que terão ignorado as sanções aplicadas à Rússia na sequência da invasão da Ucrânia. Em causa, segundo uma investigação denominada Offside Deals e levada a cabo por um consórcio de 12 órgãos de comunicação social internacionais, estão transferências de jogadores que violam as disposições adoptadas pela União Europeia e pelos EUA.

Os negócios envolvem maioritariamente os clubes radicados em Moscovo, como é o caso do Dínamo, que tem como patrocinador principal o VTB Bank, a segunda maior entidade financeira da Rússia, de capitais maioritariamente públicos, e que foi alvo de sanções. É assim com todos os clubes que sejam controlados por oligarcas ou por bancos próximos do Kremlin.

O Dínamo, de resto, encabeça a lista destes negócios com a venda do médio Arsen Zakharyan à Real Sociedad, a troco de 13 milhões de euros. Mas está longe de ser um caso isolado. No total, as 28 equipas realizaram 30 transferências a envolverem clubes russos, furando a proibição de fazer negócios com empresas e pessoas próximas de Vladimir Putin ou de depositar mais de 100 mil euros na conta de qualquer entidade russa.

Segundo a investigação, citada pelo jornal espanhol El País, um dos membros do consórcio de media, 18 jogadores vieram para a Europa a troco de um total de 66 milhões de euros, ora por força do pagamento a clubes sujeitos a sanções, ora por envio de verbas para contas bancárias relacionadas com os clubes ou os seus proprietários. Em ambos os casos, práticas proibidas pela Comissão Europeias e pelos Estados-membros.

Na prática, estes 30 movimentos sob suspeita representam a grande maioria de todas as 45 "trocas comerciais" existentes entre clubes europeus e russos desde que começou a guerra na Ucrânia. A informação foi obtida através da compilação de dados públicos do mercado de transferências, dos proprietários das equipas russas, da lista das sanções aplicadas pela Europa, EUA e Reino Unido, incluindo negócios a envolver bancos estatais, petrolíferas, milionários da lista da Forbes ou senhores de guerra como Ramzán Kadírov, a cuja equipa (o Akhmat Grozny) o Lyon e o Red Bull Salzburgo adquiriram jogadores.

Aos emblemas francês e austríaco juntam-se, na lista dos 28 clubes, a Real Sociedad, o Espanyol, o Cádiz, o Almería e o Elche, em Espanha, mas também a Udinese, a Salernitana, o Bolonha e o Torino, em Itália, os dois países mais representados (França também conta com quatro clubes, com o Lorient, o Clermont Foot e o Nice a juntarem-se ao Lyon). Portugal "contribui" com três negócios, todos eles de venda de jogadores.

O Benfica e o Portimonense equivalem-se no valor da operação, com ambos os futebolistas a saírem por uma verba a rondar os dois milhões de euros. No caso dos "encarnados", trata-se da venda do lateral Tomás Tavares ao Spartak Moscovo, no caso dos algarvios, trata-se do defesa Willyan Rocha, transferido para o CSKA Moscovo. Já o Sp. Braga surge na lista com a saída do avançado Guilherme Schettine para o Oeral Jekaterinenburg, por 400 mil euros.

O PÚBLICO pediu uma reacção a Benfica e Portimonense, mas não obteve resposta. O Sp. Braga informou que não vai tecer comentários sobre o tema.

Subterfúgios e omissões

Quer na operação de compra, quer na de venda, levantam-se problemas evidentes. Quando se adquire o passe de um jogador a um clube sujeito a sanções, como sucedeu com a Real Sociedad e o Elche, o pagamento está proibido. E mesmo que os donos da equipa não constem da lista de sanções, a norma europeia sobre depósitos proíbe colocar à disposição das entidades russas mais de 100 mil euros numa conta bancária. No caso da venda a um clube com proprietários ou dirigentes sancionados, será difícil receber o montante do negócio, já que o movimento financeiro deverá ser congelado.

Ángel Saz-Carranza, director do Center for Global Economy and Geopolitics, da ESADE, abordou o caso: “Estes clubes podem ter infringido as sanções: se a equipa for de um oligarca ou de uma entidade sancionadas, facilmente será considerado um incumprimento”, afirma, citado pelo EI PAÍS.

Mas como podem avançar os negócios face a estas restrições? Um porta-voz da Real Sociedad explicou ao diário espanhol como avançou a transferência de Arsen Zakharyan: "Fizemos todas as verificações: a categoria futebolista não estava incluída nas listas de sanções". Um argumento que também terá sido usado por outros clubes, incluindo os que negociaram com o Spartak Moscovo, que pertence à Lukoil, um dos gigantes do gás e do petróleo a nível mundial, sancionado pelos EUA desde 2014.

Emblemas como o Red Bull Salzburgo, o Nice ou o Sparta de Praga, para além de vários clubes espanhóis, empurram a responsabilidade para a FIFA e para a UEFA, instâncias que, argumentam, monitorizam as transferências e não levantaram problemas no momento dos negócios firmados com entidades russas.

Embora no decurso da investigação nenhum clube tenha explicado detalhadamente como realizou o pagamento - os pagamentos directos não são permitidos pela UEFA e os depósitos, neste contexto, também estão vedados -, dois emblemas espanhóis assumiram ter feito uma transferência para uma terceira conta, depois de um acordo com o clube russo. Como exemplo temos o caso do neerlandês Tony Vilhena, contratado pelo Espanyol ao Krasnodar, com os 2,5 milhões de euros a serem transferidos para uma conta de um banco europeu previamente acordada com o clube.

"Um modus operandi típico é utilizar redes societárias com entidades sediadas em países nos quais não se apliquem as sanções, por forma a que não se possa conhecer quem é o verdadeiro titular por trás dessa entidade jurídica. Outro é o pagamento de transacções fora dos circuitos bancários europeus, em bancos aos quais não se apliquem essas sanções", explica ao El País Mariano García Fresno, chefe da Unidade de Análise e Comunicação do órgão centralizado de prevenção do branqueamento de capitais.

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