Há municípios a eutanasiar gatos sem necessidade, acusa provedora do animal

“Estou determinada a acabar com isto”, diz Laurentina Pedroso. Associação de veterinários dos municípios respondem que eutanásia é uma ferramenta necessária.

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Desde 2018 que a lei proíbe o abate dos habitantes de canis e gatis por falta de espaço Ana Luísa Silva
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A provedora nacional do animal, Laurentina Pedroso, garante que existem municípios a eutanasiar gatos sem necessidade.

Segundo esta responsável, o que está a suceder é que quando recolhem gatos vadios para os esterilizar e devolver à rua algumas autarquias os testam à sida e à leucemia felinas – o FIV e o FeLV, patologias contagiosas. E que nos casos em que o teste acusa a existência de anticorpos os serviços municipais optam pela eutanásia, mesmo que o animal não apresente sinais da doença.

Laurentina Pedroso falou do tema numa conferência dedicada ao bem-estar animal promovida em Lisboa pelo Instituto da Conservação da Natureza, que há cerca de três anos detém a tutela da pasta dos animais de companhia. E anunciou que vai propor medidas que inviabilizem este procedimento. “Estou determinada a acabar com isto. Um teste positivo não significa que os animais estejam doentes”, observa a professora de Veterinária. “Quando se trata de gatos muito novos, às vezes ainda são anticorpos maternais”.

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Laurentina Pedroso, provedora nacional dos animais DIEGO NERY

Mesmo tendo testado positivo à leucemia ou à sida, acrescenta, um gato pode ter muito tempo de vida. “Ainda não somos Deus para decidirmos sobre a vida destes bichos”, declara Laurentina Pedroso, que diz ter sido alertada por associações de defesa dos animais para a existência de centenas de eutanásias nestas circunstâncias.

O assunto não é pacífico. O bastonário dos veterinários, Jorge Cid, diz que desconhece casos destes, mas deixa ao mesmo tempo claro que a decisão clínica pertence sempre ao veterinário, na margem de discricionariedade que lhe cabe ter sopesadas as circunstâncias.

Também o presidente da Associação dos Veterinários dos Municípios, Ricardo Lobo, garante que não só a lei permite a opção pela eutanásia nestas circunstâncias como se trata de uma decisão com fundamento científico: erradicar alguns animais para que a doença não alastre aos restantes membros da colónia.

“No caso da leucemia basta um toque de nariz ou a partilha de comedouros para haver contágio. Já a sida felina transmite-se pelas relações sexuais ou pelas arranhadelas.” Muitas vezes, sublinha, “a eutanásia é uma ferramenta necessária”.

Mas nem sequer se trata de uma prática comum testar colónias de gatos a FIV e FeLV, ressalva, razão pela qual os casos não deverão ser muitos. Seja como for, conclui Ricardo Lobo, um veterinário que colocasse animais infectados com o restante grupo sujeitar-se-ia a uma sanção disciplinar. E manter em cativeiro, numa jaula, os gatos vadios doentes não constitui uma solução exequível, até pelo sofrimento emocional que isso acarretaria a animais que sempre andaram em liberdade.

Desde 2018 que a lei proíbe o abate dos habitantes de canis e gatis por falta de espaço. Em 2017 foi no entanto publicada uma portaria que abre a porta à eutanásia em determinadas situações: nos casos em que o animal tenha causado graves ferimentos a alguém, tenha um comportamento demasiado agressivo e ainda quando seja portador de patologias transmissíveis aos humanos ou de doenças infecto-contagiosas, “representando a sua permanência no centro de recolha de animais uma ameaça à saúde animal”. Está ainda autorizado o abate dos bichos que constituam perigo para a saúde pública, no âmbito de um surto infecto-contagioso.

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