Aproveitaram um calhau e fizeram uma capela única no país

Em Vieira do Minho mora a capela da Senhora da Lapa, um exemplar único no país. Este domingo, a autarquia do concelho do Minho promove uma caminhada que passa no lugar.

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Neste domingo há passeio até à capela da Senhora da Lapa
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Neste lugar dá-se aquele caso em que por muitas palavras que se escrevam, só vendo é que se acredita no que lá está. Mas tentaremos: no final do século XVII, um casal subiu ao monte da Penamourinha, em Vieira do Minho, concelho do interior minhoto, e vislumbrou, entre sobreiros, um gigante penedo. A fé e a adoração pela padroeira do lugar, a Senhora da Lapa, instigou a criatividade e o casal decidiu escavar o calhau, encaixando nele uma pequena capela. Hoje, o santuário é um dos postais de Vieira do Minho, que este domingo promove uma caminhada ao lugar.

Na designada capela da Senhora da Lapa o que mais impressiona é o cruzamento entre o enorme penedo granítico, de grande inclinação, a servir-lhe de tecto e de telhado e que lhe dá um aspecto semelhante a uma gruta, e a envolvente natural, marcada pela presença de mais formações rochosas. A cerca 650 metros de altitude, o lugar pauta-se pelo misticismo e oferece, a quem lá vai, um passadiço que deambula por entre sobreiros centenários, desembocando num miradouro de onde se avista toda a singularidade da flora minhota.

A configuração do interior da capela acaba por ser de somenos: lá dentro, em meia dúzia de metros quadrados, estão quatro filas de bancos de madeira, separados por um pequeno corredor, apontados para a estátua de Senhora da Lapa. Na fachada, encontra-se um nicho com outra estátua da padroeira com a data de 1694, correspondente ao ano de construção da capela.

A diferença desta capela, comparando-a com outras do país, está na maneira como a “pedra pousa na natureza”, comenta ao PÚBLICO Eduardo Pires de Oliveira, historiador de arte e excelso conhecedor da arquitectura religiosa minhota. Ali, onde já foi “dezenas de vezes”, reside uma das paragens obrigatórias para quem quer conhecer a região. “É um sítio fabuloso, de uma ruralidade assustadoramente maravilhosa. Quando quero levar alguém a conhecer o Minho, essa capela é um dos sítios onde vou. As pessoas ficam tolas, não acreditam no que vêem”.

Há, no país, outras capelas, como a Anta-capela de Alcobertas, em Rio Maior, construídas sob pedra, mas nenhuma “tem paralelo” com a Senhora da Lapa. “Temos antas e dólmenes que foram transformadas em capelas, mas aí são construções humanas do megalitismo, da pré-história”. Já a capela minhota, que é apenas “um calhau e uma cruz”, é exemplo de “como pegar na natureza e aproveitá-la”. E se o Minho é a civilização do granito, ali mora a sua “quinta-essência”.

Ermitério transformado em santuário

A origem da capela da Senhora da Lapa – lapa que no Minho remete a pedra – está relacionada a um de dois cultos da padroeira: “há um ligado à presença de jesuítas, com origem na Beira Alta, em Sernancelhe, no século XVI, e outro que chegou de São Paulo, do Brasil, no século XVIII”. Aqui deu-se o primeiro caso, explica Eduardo Pires de Oliveira. “O culto ali presente é do século XVI, em que provavelmente algum ermitão – aqueles que iam para sítios isolados rezar a Deus – parou ali”.

No lugar terá sido criado, em primeiro lugar, um “ermitério”. A fé foi alimentando o lugar e ali nasceria um santuário que foi “crescendo”, resultando na construção da capela - de acordo com a bibliografia apresentada pela Câmara de Vieira do Minho, a capela terá sido construída a mando de João Gonçalves e sua esposa Margarida da Silva.

A partir do século XVIII, há um “recrudescimento do culto” que transformou a capela num dos locais mais visitados da freguesia de Soutelo. “Aquilo está sempre limpo, é um espanto. O trabalho tem sido bem feito”, elogia Eduardo Pires de Oliveira. O que o historiador diz pode ser comprovado este domingo, pelas 10 horas, hora a partir da qual a autarquia promoverá uma caminhada de quatro quilómetros com destino à capela.

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