Apostas desportivas online “são altamente adictivas” e criam “ciclo mental vicioso”

Associação da publicidade às apostas tem impacto em públicos mais vulneráveis. Instituto de Apoio ao Jogador defende mais políticas de jogo responsável.

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No top 10 da UEFA, não há outra Liga tão exposta aos patrocínios das casas de apostas como a portuguesa Daniel Rocha

As apostas desportivas online "são altamente adictivas" e a sua ligação ao desporto, seja pela publicidade ou associação, apresentam um "ciclo vicioso" em termos psicológicos, que apresenta problemas, disse à Lusa a psicóloga clínica Assunção Neto.

Segundo a especialista do Grupo de Actuação em Psicologia & Performance, as apostas desportivas têm um efeito no cérebro que "funciona da mesma forma de qualquer outra adição", seja o álcool, drogas, medicamentos ou outros comportamentos adictivos.

A associação da publicidade ao fenómeno desportivo, remetendo a pessoa para acertar no resultado e em dezenas de outros factores possíveis tem também efeitos nefastos, sobretudo para pessoas vulneráveis a este tipo de problemas. "Torna-se mais fácil influenciar as pessoas, por várias razões. As pessoas já vão ver desporto porque o desporto permite uma sensação intensa que a maioria das pessoas não consegue ter de outra forma na vida", defende a profissional clínica.

As apostas, um fenómeno de jogo, ficam ligadas a este momento de prazer e "a algo muito socialmente aceite". "O próprio jogo da aposta tem este componente mágico, de "vou apostar e receber alguma coisa em troca".

Já o líder do Instituto de Apoio ao Jogador, Pedro Hubert, defende mais políticas de jogo responsável para o jogo online. Considera ainda que as apostas desportivas exigem uma alteração legislativa, uma "rede de apoio mais eficaz" e um mecanismo de auto-exclusão mais robusto.

O relatório do Serviço de Regulação e Inspecção de Jogos (SRIJ) relativo ao segundo trimestre de 2023, nota um aumento de 2,9% face aos três meses anteriores, fruto dos mais de 190 mil novos registos, contra o cancelamento de cerca de 80 mil, sendo que a maioria dos apostadores (81%) tem menos de 45 anos.

Para o líder do Instituto de Apoio ao Jogador, a publicidade é também um factor impactante, sendo "particularmente grave porque as pessoas não têm nenhuma capacidade decisão de se exporem ou não". "Fiz um estudo com pacientes que tinham tido recaídas e perguntei o que poderia incitar mais à recaída. O que mais mencionaram foi a publicidade, os prémios, os bónus, os convites a jogar”, afirma Pedro Hubert.

Manifestando-se pouco virado “para a proibição total”, considera que o reconhecimento do jogo como problema patológico abre caminho a que “se possa fazer mais” do que um código de boas práticas em publicidade, até porque começam a surgir países em que este tipo de mensagens, nas camisolas e outros espaços, já não é permitido.

A psicóloga clínica, Assunção Neto, duvida que a legislação em torno das apostas desportivas possa "apertar", até porque a própria lei só permite jogar a partir dos 18 anos "e não é o que acontece". A aposta, então, terá de ser "na educação, e em permitir às pessoas que tenham uma vida melhor e não precisem tanto de jogar", para contrariar uma temática que "têm um potencial adictivo mesmo muito grande".

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