Em Tóquio, os “preços absurdos” das casas também afastam jovens trabalhadores

Como noutras cidades, é cada vez mais difícil para os jovens trabalhadores japoneses encontrarem um apartamento com um preço razoável e boas condições no centro de Tóquio.

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Nagawa, Nagano, Japão Abby Chung/Pexels

Mie Kawamata sonhava ter uma casa onde pudesse cuidar de um pequeno jardim e onde a filha de um ano pudesse brincar ao ar livre, mas que fosse perto o suficiente para poder trabalhar no centro de Tóquio.

No entanto, depois de muita procura, Kawamata e o marido, ambos a trabalhar na área da contabilidade, desistiram da ideia de comprar uma casa e optaram por um apartamento com cerca de um terço do tamanho desejado.

"Não tenho a certeza se as pessoas ainda conseguem comprar uma casa," disse Kawamata, 31 anos. "Os preços das casas e das rendas subiram muito em comparação com os últimos anos, mas, no final, os salários não aumentaram assim tanto."

Depois de enfrentar décadas de deflação e crescimento estagnado, o Japão está a viver um boom de investimento que tornou os apartamentos no centro de Tóquio inacessíveis para os jovens trabalhadores japoneses.

O aumento significativo do investimento fez com que o preço médio de um condomínio novo no centro de Tóquio aumentasse 60%, atingindo um recorde de 129,6 milhões de ienes (cerca de 828 mil euros) na primeira metade deste ano, de acordo com o Instituto de Economia Imobiliária.

Para os habitantes locais, o aumento nos preços fez de Tóquio a segunda cidade mais inacessível do mundo, ficando apenas atrás de Hong Kong, de acordo com um relatório global de imobiliário do banco de investimento UBS.

Um apartamento de 60 metros quadrados em Tóquio agora custa 15 vezes o salário de um trabalhador qualificado, dez vezes mais do que o que se pagava há uma década e muito acima dos valores em Londres, Singapura e Nova Iorque, como mostrou o relatório do UBS.

Devido, em parte, às taxas de juro baixas, o aumento dos preços está a ser impulsionado por compradores estrangeiros que estão a aproveitar a desvalorização do iene, que agora está próxima dos valores de há 33 anos, e por aqueles que procuram transferir fundos para fora da China, onde uma crise imobiliária e preocupações geopolíticas estão a fazer arrefecer o investimento, de acordo com especialistas imobiliários.

Os estrangeiros investiram mais de 1,8 biliões de ienes em imóveis japoneses desde 2019, superando os fluxos de investidores institucionais, fundos imobiliários e empresas, de acordo com a consultoria Cushman & Wakefield.

E ainda há mais. Os fundos de especulação imobiliária acumularam durante a pandemia, e o Japão parece ser um dos destinos principais na Ásia para esses fundos, afirmou a directora da Cushman & Wakefield, Mari Kumagai.

"Se quiserem manter o dinheiro na região da Ásia-Pacífico, tende a ser na Austrália, Singapura ou Japão", afirmou Kumagai, acrescentando que o Japão é o mais atractivo dos três, com base na estabilidade do valor e na dimensão da economia.

Os preços médios de condomínios no centro de Tóquio subiram no último ano devido à grande oferta de residências de luxo que entraram no mercado. Um exemplo disso é o novo complexo Azabudai Hills, que apresenta a maior torre de escritórios do país e cerca de 1400 unidades residenciais. O projecto Azabudai, que se ergue sobre a icónica Tokyo Tower, está a atrair a atenção de investidores em Taiwan, segundo Wang Mao San, presidente da Shingi-fusaya Realty Inc.

Os taiwaneses muito ricos estão a adquirir propriedades em Tóquio avaliadas em mais de 100 milhões de ienes para segundas residências, enquanto os investidores se concentram em condomínios na faixa de 30 a 70 milhões de ienes em Tóquio e na metrópole ocidental de Osaka, afirmou.

No Japão, a situação política e económica é estável", disse Wang sobre a atractividade do mercado. "Tóquio ainda não é tão cara em comparação com outras grandes cidades como Hong Kong e Londres."

Um condomínio de luxo na área de Motoazabu em Tóquio tem um preço inferior a metade do preço de Hong Kong e é 45% mais barato face a Londres, de acordo com dados do Instituto de Imobiliário do Japão.

Isso é pouco reconfortante para Mari Mochizuki, uma mãe solteira e gestora de vendas de uma empresa de música que tem procurado em vão um apartamento grande o suficiente para acolher o piano e, talvez, um gato.

Aos 39 anos, está ansiosa para encontrar um lugar que mantenha o seu valor de revenda caso tenha de se mudar por causa do trabalho. No entanto, as opções que encontrou no centro da cidade são ou muito caras ou desgastadas, o que a obriga a expandir a busca para as extremidades norte da capital.

"Parece que os preços de todos os apartamentos de tamanho razoável estão a subir absurdamente, até mesmo aqueles em áreas afastadas ou com interiores surpreendentemente baratos", desabafa.

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