Monumento Catástrofe, um documentário sobre as histórias que ficaram por construir

Os Left Hand Rotation também acharam que estava na hora de contar outras histórias”. É daqui que parte o documentário Monumento Catástrofe, que o colectivo espanhol começou a filmar em 2020, indo de norte a sul de Portugal à procura de monumentos em honra a vítimas colectivas.

Inserida no projecto A volta ao mundo em 80 catástrofes, a longa-metragem coloca os memoriais no centro da narrativa. Estes símbolos da memória colectiva são observados criticamente, com a dupla espanhola a ir além da história neles entalhada, contando “as outras” que ficaram por assinalar. 

A função do monumento enquanto detentor da memória colectiva é desconstruída ao longo do filme, que passa pelo Monumento às Vítimas da Tragédia Entre-os-Rios, em Penafiel, a Capela dos Ossos, em Campo Maior ou pelo Monumento à Tragédia no Mar, em Matosinhos. As filmagens detêm-se também nos Açores, na ilha do Faial. Aqui, conta-se a história dos inúmeros baleeiros que perderam a vida no mar, mas também das mortes que nunca se contaram, as das baleias.

Para os autores do guia turístico com 24 monumentos, a memória “é algo horizontal, que se transforma”. Por oposição, os monumentos são construções “verticais”, construídas a partir de materiais não perecíveis e “símbolos do poder hegemónico instituído”. Monumento Catástrofe procura desconstruir concepções históricas onde ainda prevalece uma retórica colonialista dominante, descrevem. “É preciso uma restauração da história”, atiram.

Talvez um dos desfechos mais inesperados do documentário que pode agora ser visto gratuitamente, comenta o colectivo sediado em Lisboa, seja confrontar quem o vê com a própria mortalidade. Para os criadores, assumir que “somos seres vulneráveis” é imperativo para que a nossa relação com a natureza, “e com o outro”, não seja ditada pela dominação, mas antes “baseada na humildade”, defendem.

Texto editado por Renata Monteiro