Paulo Rangel: Abusos na Igreja são “problema sistémico e de encobrimento”

Em entrevista ao podcast do PÚBLICO Toma Partido, o social-democrata Paulo Rangel admitiu que “não ter medo de dizer” que é cristão o “diferencia na sociedade portuguesa”.

O social-democrata Paulo Rangel não tem medo de dizer que é cristão nem de apontar o dedo à Igreja Católica portuguesa, que diz não ter estado à altura da sua responsabilidade quando a Comissão Independente para o Estudo dos Abusos de Menores na Igreja (CIEAMI) apresentou os resultados da investigação que levou a cabo. Em entrevista ao podcast do PÚBLICO Toma Partido, que vai para o ar esta terça-feira, o eurodeputado diz que a instituição precisa de estar mais presente no terreno e de ser menos "complacente" com o poder.

“Os abusos [sexuais] são uma tragédia sem fim e são uma perversão grave. Durante muito tempo poderíamos perguntar se era uma questão marginal; episódica, de duas, três pessoas… Mas hoje percebe-se que há um problema sistémico e de encobrimento [por parte da Igreja Católica]”, defende o social-democrata.

Para Paulo Rangel, a reacção da Igreja católica portuguesa à existência de casos de abuso sexual no país “foi positiva num primeiro momento”, diz, elogiando a criação da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos de Menores na Igreja (CIEAMI).

O problema, continua o católico, foi a ausência de “capacidade para lidar com os resultados desta comissão”. “Isso foi muito negativo, porque a tal contrição, o tal arrependimento, e a purificação [da Igreja] passava, obviamente, por um reconhecimento do mal e daquilo que foi feito de mal”, considera. Apesar de considerar que a Igreja, num todo, “reconhece o mal”, a Igreja portuguesa, em particular “falhou”.

“Os bispos portugueses pediram um mês para analisar os resultados [apresentados pela comissão]… Um mês para harmonizar posições e ter uma resposta concreta… E depois o que vimos é que não foram capazes de produzir uma resposta comum. Estavam divididos. Como é que podiam estar divididos numa coisa destas?”, questiona.

O eurodeputado diz ser “evidente que a Igreja portuguesa não esteve à altura daquela que era a sua responsabilidade enquanto portadora da mensagem de Cristo”, algo que “desiludiu muita gente”. “Jesus não hesitaria em denunciar e em ser, até, extremamente duro com uma situação destas”, assegura.

Paulo Rangel acusa ainda a instituição de falhar “clamorosamente do ponto de vista da intervenção pública”. Falta, à Igreja portuguesa, “capacidade profética de intervir no espaço público, é demasiado complacente com o poder”, diz. Um exemplo desta atitude, considera o católico social-democrata, foi o almoço do então cardeal patriarca de Lisboa, Manuel Clemente, e do bispo Américo Aguiar com o primeiro-ministro no âmbito da Jornada Mundial da Juventude. "Nós não esperamos uma Igreja Católica de corte, mas uma Igreja Católica que esteja no terreno e que esteja a denunciar aquilo que está mal”, critica.

Questionado sobre a forma como o catolicismo influencia o seu papel na política, Rangel admite que marca a diferença ao admitir que é cristão. “O que me diferencia na sociedade portuguesa — e há outros assim, a começar pelo Presidente da República — é não ter medo de dizer sou cristão”, diz, acrescentando que hoje em dia “há uma certa vergonha” de o fazer, inclusivamente por parte dos políticos.

“Isso não pode ser porque a separação entre a Igreja e Estado não é pegar na religião e pô-la num canto. A religião é uma coisa normal. E as pessoas não têm que ter medo disso”, conclui.

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