Madeira pede a Marcelo que não promulgue diploma sobre nova lei da droga

O presidente da Assembleia Legislativa da Madeira diz que não foram ouvidos os órgãos de governo próprio das regiões autónomas, o que leva “à inconstitucionalidade e ilegalidade” do decreto aprovado.

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O presidente da Assembleia Legislativa da Madeira, José Manuel Rodrigues, enviou uma carta a Marcelo Rebelo de Sousa Miguel Nobrega

O presidente do Parlamento da Madeira, José Manuel Rodrigues, pediu esta segunda-feira ao Presidente da República para não promulgar o decreto-lei sobre o regime sancionatório relativo à detenção de droga para consumo, alegando "violação da Constituição da República Portuguesa".

Numa carta envida a Marcelo Rebelo de Sousa, o presidente da Assembleia Legislativa da Madeira alerta para o facto de o diploma ter sido aprovado, a 19 de Julho, sem o "cumprimento do dever de audição dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas".

Em causa está o decreto que "clarifica o quadro normativo penal relativo à detenção de droga para consumo independentemente da quantidade e estabelece prazos regulares para a actualização das normas regulamentares", incluindo as novas substâncias psicoactivas (drogas sintéticas).

O texto final foi apresentado pela comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, na sequência de dois projectos de lei do PSD e do PS, e recebeu no hemiciclo os votos a favor do PS, IL, BE, PCP, PAN e Livre, o voto contra do Chega e a abstenção do PSD e dos deputados socialistas Maria da Luz Rosinha, Carlos Brás, Rui Lage, Fátima Fonseca, Catarina Lobo, Maria João Castro, Tiago Barbosa Ribeiro, António Faria e Joaquim Barreto.

Na missiva enviada ao Presidente da República, José Manuel Rodrigues sublinha que a obrigação de consulta dos órgãos de governo próprio "é efectiva e verifica-se, desde logo, por se tratar de um diploma significativamente sensível do ponto de vista da abordagem política e legislativa, cuja matéria carece de avaliação continuada, bem como de discussão aberta e informada, que não poderia deixar de fora parcelas do território nacional com particularidades próprias".

"A cooperação institucional da Assembleia da República com a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, em matéria respeitante à região, com relevante e particular incidência na mesma, foi por aquela descurada", reforça José Manuel Rodrigues, que desempenha o cargo de presidente do Parlamento regional por indicação do CDS-PP, no âmbito do governo de coligação com o PSD, estabelecido em 2019.

Rodrigues reitera que, no caso do decreto que relativo à detenção de droga, o incumprimento do dever de audição de órgãos de governo próprio das regiões autónomas, pela Assembleia da República, "conduz à inconstitucionalidade e ilegalidade do mesmo".

O representante solicita, por isso, que o diploma não seja promulgado, por violação da Constituição da República Portuguesa, do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira e da lei relativa à audição da Assembleia Legislativa.

No debate na Assembleia da República, que decorreu no início de Julho, PSD e PS justificaram os seus diplomas sobre a descriminalização de drogas sintéticas com a necessidade de distinguir entre traficantes e consumidores, alertando também para o impacto que essas novas substâncias estão a ter nas regiões autónomas.

Antes da aprovação do texto final, o director da Unidade Operacional de Intervenção de Comportamentos Aditivos e Dependências da Madeira (UCAD), Nelson Carvalho, alertou para a importância de a lei equiparar as drogas sintéticas às clássicas sem criar "zonas dúbias".

Em declarações à Lusa a 4 de Julho, o responsável explicou que a proposta do PSD visava apenas equiparar as novas substância sintéticas às drogas clássicas em termos de tráfico e consumo, com referência às quantidades, ao passo que o projecto do PS criava "algumas zonas cinzentas", ao referir que a aquisição e detenção de substâncias em quantidade necessária para consumo médio individual durante o período de dez dias constituíam um "mero indício de que o propósito pode não ser o de consumo".

"Criam-se algumas zonas cinzentas, dúbias, que depois podem dar azo a que indivíduos que tenham quantidades acima do que é permitido possam provar em tribunal que é para seu consumo, quando efectivamente era para traficar", advertiu Nelson Carvalho.

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