A transformação de um amor de Verão

O Verão é tempo de afinações, de arrumações de pensamento, de redefinição de prioridades, de redesenhar dos planos, e do recolher a coragem para não se ter medo de ser feliz.

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Rui Gaudencio
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A única razão pela qual passamos pelo Inverno é para nos deliciarmos no sabor do merecido Verão. A pele quente, as hormonas agitadas, os corpos à vista atravessam o mundo das ideias que está a fervilhar em recomeço, em renascimento, desta que é a arte de viver que terá pitadas de euforia, mas acima de tudo se sustenta numa plataforma de paz interior que só pode nascer do amor e da verdade. O Verão é amor, é verdade, é nascimento, é uma reconexão que só se atinge quando há desconexão.

Desligar. Desconectar. Afastar. Esvaziar o pensamento. Estar off-line. Viver apenas o presente repousado em planos simples. Esquecer as obrigações e permitirmo-nos a navegar no ócio que é onde nós planeamos a estrada da vida que não tem uma meta, mas que é desenhada pelo caminho que nos trará mais felicidade.

Todos precisamos de férias, todos precisamos de descansar porque o nosso cérebro precisa de tempo e espaço para se expandir, para se colocar em perspectiva, para fazer um zoom out do que nós somos, para nos vermos com mais verdade, e para percebermos do que mais gostamos em nós e na nossa vida, para depois então nos reconhecermos com amor e verdade, e aí, renascemos sem precisarmos de morrer por completo.

Um amor de Verão é a razão pela qual vale a pena viver, mesmo que seja só na dimensão do plano, ou na dimensão do sonho, um amor de Verão é uma necessidade fisiológica que vem à frente da água que bebemos ou do ar que respiramos. Um novo amor de Verão pode estar na pessoa que sempre esteve ao nosso lado, ou numa escolha do belo acaso. Há magia nas descobertas e há uma magia maior na continuidade.

O amor de Verão está nos amigos que já temos e nos que descobrimos, está nos lugares que carregam as memórias que compõem o nosso esqueleto, ou na magia de deixar pegadas em terras nunca antes navegadas. Um amor novo, um amor de Verão pode estar em qualquer pessoa, em qualquer lugar, em qualquer momento, mas está, acima de tudo, pronto para brotar na verdade que habita no nosso coração. Ele já lá está, é só deixá-lo sair.

Nunca estamos tão próximos de nós quando nos afastamos de quem somos. O amor não é sorte, o amor é uma escolha. O Verão tem dias mais longos e traz-nos o conforto do calor para podermos trabalhar nas nossas escolhas. Pausamos o trabalho que nos paga as contas e que nos permite contribuir com a nossa parte para o bolo da sociedade, para trabalhar com afinco no mundo das ideias, dos valores, do certo e do errado, na honestidade do que nos pede o nosso corpo, na consciência da simplicidade da nossa existência, na insignificância da nossa vida, para que renasça em nós, outra e outra vez, o poder da transformação de um amor de Verão. Do amor pelo Verão, e do Verão do amor.

Não vale de nada tudo que temos se não tivermos amor, a começar pelo amor-próprio, que por sua vez só existe na consciência do amor pela vida alheia, pelo outro, e pela força da poesia que nos permite sempre afinar a lente do nosso olhar. O Verão é tempo de afinações, de arrumações de pensamento, de redefinição de prioridades, de redesenhar dos planos, e do recolher a coragem para não se ter medo de ser feliz.

Não é tanto a Passagem de Ano, ou a passagem do nosso ano que nos permitem reflectir sobre a magia e a liberdade de existir, são as férias e o Verão que nos permitem ter o tempo de desfrutar a necessária metamorfose que nos convida a ressuscitar em vida, e reencarnar sem mudar de carne.

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Não é para todos, mas é, literalmente, para quem quiser: A transformação de um amor de Verão.

As crónicas de Gustavo Carona são patrocinadas pela Fundação Manuel António da Mota a favor dos Médicos sem Fronteiras

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