Violência global agrava-se pelo nono ano consecutivo, Portugal é o sétimo país mais pacífico do mundo

O Afeganistão é, novamente, o país mais violento do mundo, de acordo com o relatório de 2023 do Instituto para a Economia e Paz. Portugal sobe um lugar, para a 7.ª posição.

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A invasão russa fez com que o impacto da violência na Ucrânia aumentasse 479% Reuters/VALENTYN OGIRENKO
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O mundo é, pelo nono consecutivo, um lugar mais violento devido à instabilidade política e à aceleração dos conflitos armados, cada vez mais internacionalizados. Mais de 90 países estão envolvidos em algum tipo de confronto externo, e cada vez mais sangrentos: no último ano, 238 mil pessoas morreram em todo o mundo devido a esses conflitos, um aumento de 96%, com um custo económico de 17,5 biliões de dólares (15,5 biliões de euros), 13% do PIB mundial em 2022.

Estas são algumas das conclusões do 17.º Índice Global da Paz do Instituto para a Economia e Paz (IEP), publicado esta quarta-feira, que coloca o Afeganistão como o país mais violento do mundo pelo sexto ano consecutivo, seguido de Iémen, Síria, Sudão do Sul e República Democrática do Congo, enquanto a Ucrânia registou, no último ano, a maior deterioração dos seus níveis de paz, caindo 14 lugares, para a 157.ª posição.

De acordo com a classificação do IEP, um think tank com sede na Austrália, a Islândia continua a ser o país mais pacífico do mundo, posição que ocupa desde 2008, seguida da Dinamarca, Irlanda, Nova Zelândia e Áustria. Portugal aparece na sétima posição, subindo um degrau no índice, enquanto Espanha mantém o 32.º lugar.

A Líbia, pelo seu lado, foi o país que registou a maior melhoria nos níveis gerais de paz devido à cessação do conflito armado entre os dois governos paralelos do país, embora a tensão política continue a ser elevada, subindo 14 lugares, para a 137.ª posição. Já os Estados Unidos mantiveram a 131.ª posição.

“O Índice Global da Paz de 2023 destaca a dinâmica contrastante da militarização e dos conflitos. Por um lado, a maioria dos países está a reduzir a sua dependência das Forças Armadas, enquanto, por outro lado, um número crescente de conflitos está a internacionalizar-se. As mortes em conflitos são as mais elevadas desde o genocídio no Ruanda, que causou mais de 800 mil mortes e desencadeou uma onda de acção global”, refere Steve Killelea, fundador e presidente executivo do IEP, nas suas conclusões.

Embora o relatório destaque algumas melhorias pontuais em regiões como o Médio Oriente ou a América do Norte (graças sobretudo ao Canadá), as boas notícias não conseguem fazer subir a média global face ao aumento da violência noutras regiões como a América Central, as Caraíbas e a América do Sul, de acordo com as conclusões do relatório. De facto, 79 países registaram um aumento dos níveis de conflito, incluindo a Etiópia, a Birmânia, Israel, a África do Sul e a Ucrânia. No total, 91 países estão envolvidos em alguma forma de conflito externo, contra 58 em 2008.

A Etiópia ocupa um lugar de destaque no relatório, que sublinha a extraordinária violência do conflito na região de Tigré, que terminou no ano passado com um acordo de paz entre o governo etíope e a Frente de Libertação do Povo de Tigré (TPLF), com um custo de, pelo menos, 100 mil mortes, número que sobe para 200 mil acrescentando as mortes causadas pela fome gerada pelos combates desde o início do conflito em 2022.

Na África subsariana, o Mali registou a maior deterioração dos níveis de paz, com um aumento de 154% nas mortes relacionadas com o conflito, enquanto a violência contra civis aumentou 570%.

Todos estes conflitos representam um custo quase incompreensível: o impacto da violência na economia mundial aumentou em quase um bilião de euros, atingindo um recorde de 15,5 biliões de euros devido às despesas militares resultantes da guerra na Ucrânia. Isto representa cerca de dois mil euros por cada habitante do planeta, segundo o IEP, numa estimativa que revela uma enorme disparidade económica: nos dez países mais afectados, a violência custou, em média, 34% do seu Produto Interno Bruto, contra apenas 3% dos dez menos afectados.

Guerra na Ucrânia

A invasão russa, iniciada em Fevereiro de 2022, fez com que o impacto da violência na Ucrânia aumentasse 479%, com um custo de 449 mil milhões de dólares (410 mil milhões de euros), 64% do seu PIB.

A guerra na Ucrânia é responsável pelo declínio global da segurança na Eurásia e na Rússia, que, paradoxalmente, teria visto a sua classificação de paz subir se não tivesse lançado a invasão.

Em termos globais, as despesas militares aumentaram 17% desde 2008, com a China (mais 164 mil milhões de euros), os Estados Unidos (59 mil milhões de euros) e a Índia (36,5 mil milhões de euros) à cabeça.

De acordo com aquele instituto, este custo poderia ser muito mais elevado no caso do cenário muito grave de um bloqueio chinês a Taiwan, um território cuja soberania a China reivindica há décadas e que, desde há meses, se tornou um sério ponto de fricção entre Washington e Pequim. O índice mostra que, se tal bloqueio se concretizasse, a produção económica global cairia 2,5 biliões de euros só no primeiro ano, ou seja, 3% do PIB mundial.

Cerca de 60 por cento desta perda ocorreria na China e em Taiwan. Estima-se que a economia da China diminuiria 7% e a de Taiwan quase 40%.

O relatório do IEP destaca ainda a crescente tendência da utilização de drones em muitos conflitos, nomeadamente na Ucrânia, Etiópia e Birmânia. O número total de ataques com drones aumentou 40,8% em relação a 2022, com o número de diferentes países e grupos que utilizam veículos aéreos não tripulados em cenário de conflito a crescer 24%.

“Depois das guerras no Afeganistão, no Iraque e na Síria, e agora na Ucrânia, é óbvio que os Exércitos mais poderosos não podem prevalecer sobre uma população local com bons recursos”, considera o presidente executivo do IEP.

“A guerra tornou-se, na maioria dos casos, impossível de vencer e um fardo económico cada vez mais pesado. Isto é ilustrado pelo impacto de um possível bloqueio económico a Taiwan, que causaria uma recessão económica global duas vezes maior do que a crise financeira global de 2008”, adverte Killelea.

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