Morreu a compositora finlandesa Kaija Saariaho, aos 70 anos

Kaija Saariaho foi a compositora em residência na Casa da Música, no Porto, em 2010, e regressou a esta instituição em 2019, para fazer a estreia portuguesa da sua obra Ciel d’hiver.

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A compositora finlandesa Kaija Saariaho dr

A compositora finlandesa Kaija Saariaho morreu esta sexta-feira, aos 70 anos, em casa, em Paris, anunciou a família, em comunicado. "Devasta-nos anunciar que Kaija Saariaho morreu esta manhã, pacificamente, em casa, em Paris", lê-se num comunicado assinado pelo marido e pelos filhos da compositora.

A família acrescentou que em Fevereiro de 2021 a compositora foi diagnosticada com um glioblastoma multiforme, um tumor cerebral agressivo, que, apesar de letal, não afectou as suas capacidades cognitivas.

Kaija Saariaho manteve a doença em privado, a conselho do seu médico, de modo a poder centrar-se no seu trabalho. Fez, no entanto, questão de que o seu diagnóstico fosse "tornado público", após a sua morte de modo a alertar para a importância da detecção precoce de tumores cerebrais, e para as dificuldades diárias com que se deparou durante os dois últimos anos: os obstáculos como utilizadora de cadeira de rodas, também em espaços culturais, e as insuficientes medidas de protecção em locais públicos, que colocam em risco pacientes com imunidade reduzida.

Segundo a família, a compositora esperava igualmente que "os protocolos de tratamentos experimentais" a que se sujeitou no Hospital Pitié-Salpêtrière, em Paris, possam vir a contribuir, "mesmo que em pequena escala", para o avanço da investigação sobre "condições como a sua".

"Durante a sua doença, Kaija Saariaho teve a felicidade [...] de estar envolvida em muitas apresentações da sua música, e na estreia dos seus mais recentes trabalhos: as Saarikoski Songs, a peça de música de câmara Semafor, a obra orquestral Vista, o madrigal Reconnaissance, a recriação da sua primeira música de cena, Study for life, e a sua aclamada e última ópera, Innocence.

Os últimos meses da vida de Kaija Saariaho, indica a família, foram dedicados à conclusão do seu Concerto para Trompete, Hush, que será estreado no próximo dia 24 de Agosto, em Helsínquia, com Verneri Pohjola como solista, e a Orquestra Sinfónica da Rádio Finlandesa dirigida pela maestrina Susanna Mälkki.

Nascida em Helsínquia, em 1952, Kaija Saariaho compôs para diferentes formações, de pequenos ensembles a orquestras, tendo assinado óperas, composições para teatro e dança e música electroacústica.

Kaija Saariaho foi a compositora em residência na Casa da Música, no Porto, em 2010, e regressou a esta instituição em 2019, para fazer a estreia portuguesa da sua obra Ciel d'hiver, integrada na programação Música no Feminino.

Lichtbogen, Graal théâtre, Laconisme de l'aile e L'aile du songe são algumas das suas peças integradas no repertório de formações portuguesas como a Gulbenkian, a Metropolitana de Lisboa, o Remix Ensemble e a Orquestra Sinfónica do Porto, além do Grupo Música Nova, de Cândido Lima, que revelou a compositora ao público português.

Entre as obras de Saariaho destacam-se igualmente as óperas Émile e L'Amour de loin, ambas com libreto do escritor Amin Maalouf, e ambas apresentadas em Portugal, no âmbito da Temporada Gulbenkian de Música, em Lisboa, em 2013 e 2016, e na Casa da Música, no Porto (Émile).

Na temporada 2014-2015, Kaija Saariaho foi mentora do compositor português Vasco Mendonça, no programa internacional Mestres Discípulos.

A gravação de L'Amour de loin, estreada no Festival de Salzburgo, em 2000, pela Orquestra Sinfónica Alemã de Berlim, sob a direcção de Kent Nagano, foi distinguida com o Prémio Grammy, em 2011.

Em 2021, venceu o Leão de Ouro de carreira da 65.ª edição do Festival Internacional de Música Contemporânea, da Bienal de Veneza, "pelo extraordinário nível técnico e expressivo que alcançou nas partituras para coros".

Na altura, a Bienal de Veneza destacou que Kaija Saariaho alcançou o reconhecimento não só pelo trabalho artístico original para voz, mas em particular pela composição Oltra Mar, de 1999, "uma obra-prima absoluta" para coro e orquestra, "harmonicamente complexa, mas de composição clara", e influenciada pelo impressionismo.

"A música ousada, sensível e exploratória que criou, sobreviverá a todos nós", conclui a família de Kaija Saariaho.

Notícia actualizada a 3/06 com informações sobre a causa de morte da compositora

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