Diversidade na força de trabalho da Saúde

Se quisermos ter uma força de trabalho em saúde capaz resistir aos desafios futuros, temos de a repensar além dos números. Não podemos preparar para o futuro com ideias e modelos do passado.

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O setor saúde é o que mais crescerá em termos económicos e de mercado de trabalho nos próximos anos, o que resulta principalmente do envelhecimento das sociedades e do aumento do peso da doença crónica. Os cuidados de saúde são “humano-intensivos” (i.e., exigem bastante mão-de-obra) e, ainda que se perspetive um papel relevante para a Inteligência Artificial, adivinha-se uma necessidade crescente destes trabalhadores. Exatamente por isso, a força de trabalho em saúde é apontada como uma componente fundamental de qualquer sistema de saúde.

A Declaração de Bucareste, por exemplo, alerta, na esteira da recente pandemia da covid-19, para a centralidade da força de trabalho da saúde e para a insuficiência de produção destes profissionais para suprir as necessidades futuras (não obstante o evidente de aumento de profissionais de saúde nos últimos anos) assim como problemas como a contratação e retenção de recursos humanos, o desempenho, a necessidade de planeamento ou de aumento do investimento público.

No entanto, e se quisermos ter uma força de trabalho em saúde capaz resistir aos desafios futuros (não só em termos de envelhecimento ou de aumento das doenças crónicas mas também de reemergência de doenças, fenómenos climáticos extremos ou outras pandemias), temos de ser capazes de a repensar para além dos números mas, principalmente, em termos da sua constituição, competências e combinação eficiente das mesmas e das suas expectativas, quer à entrada na formação, quer à entrada e permanência no mercado de trabalho. Não nos podemos preparar para o futuro com ideias e modelos do passado.

Apesar de tudo, assistimos ao longo dos últimos tempos, à emergência de novos papéis (e.g., cuidador informal), de novas profissões (e.g., nas terapias não convencionais) e de novas competências (e.g., digitais). Mas precisamos de avançar um pouco mais. Continuamos presos a um modelo centrado no médico, o que à luz da eficiência, da sustentabilidade e da resiliência do próprio sistema de saúde e da capacidade de garantir a cobertura universal de saúde (essencial para a consecução dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) é manifestamente insuficiente. Atentemos no recente exemplo da polémica levantada pela norma da Direção Geral da Saúde que oficializa a expansão das competências dos enfermeiros especialistas em saúde materna e obstétrica no acompanhamento de gestações e partos de baixo risco.

Outro exemplo crasso da necessidade de repensar a diversidade da força de trabalho, é a saúde pública que se encontra, de uma forma geral, refém de três grupos profissionais (i.e., médicos, enfermeiros e técnicos de saúde ambiental) que, sem desmérito do trabalho que realizam, são insuficientes nos novos modelos em que se pensa a saúde pública e em que é necessário pensá-la – com um foco na promoção da saúde, na literacia em saúde dos cidadãos e na prevenção da doença ou de estados pobres de saúde.

A competitividade de uma sociedade reside, também, no seu capital humano que deve ser saudável para que possa alavancar o país em termos económicos e sociais. O sistema de saúde é essencial para garantir que os cidadãos acedem a cuidados de saúde de qualidade, quando deles necessitam e sem enfrentarem os efeitos empobrecedores da doença. Para que o sistema de saúde cumpra a sua função é essencial uma força de trabalho multiprofissional, multicompetente, diversa e eficiente. Como país, Portugal necessita de começar agora a planear estrategicamente a força de trabalho em saúde do futuro. Por que motivo ainda não o começámos a fazer?

A autora escreve segundo o novo acordo ortofráfico

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