“Hoje estou muito triste”. Papa critica aprovação de lei da eutanásia pelo parlamento português

“Hoje estou muito triste, porque no país onde apareceu Nossa Senhora foi promulgada uma lei para matar”, disse o Papa.

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O Papa Francisco falou de improviso, em espanhol, à margem do discurso que tinha preparado, segundo a Ecclesia Reuters/GUGLIELMO MANGIAPANE

O Papa Francisco criticou este sábado a aprovação do decreto sobre a morte medicamente assistida, considerando que o parlamento português promulgou uma lei para matar.

"Hoje estou muito triste, porque no país onde apareceu Nossa Senhora foi promulgada uma lei para matar. Mais um passo na grande lista dos países que aprovaram a eutanásia", afirmou o Papa, no Vaticano, citado pela Agência Ecclesia.

O Papa Francisco falou de improviso, em espanhol, à margem do discurso que tinha preparado, segundo a Ecclesia, durante um encontro com centenas de representantes da União Mundial das Organizações Femininas Católicas, no Vaticano.

O Parlamento aprovou na sexta-feira o texto sobre a morte medicamente assistida, pela quinta vez, depois de versões anteriores do documento terem recebido duas declarações de inconstitucionalidade, por parte do Tribunal Constitucional e dois vetos do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. No seguimento do último, os deputados fizeram saber que iriam, ainda assim, votar o documento vetado, sem alterações significativas.

O documento deverá chegar ao Palácio de Belém na próxima semana, tendo o Presidente oito dias para assinar a sua promulgação. Apesar de ser um católico convicto, Marcelo Rebelo de Sousa já disse que irá promulgar a lei e que não irá recorrer, como poderia, à objecção de consciência para se escusar a fazê-lo. “Pois se digo que faço isto, é isto que tenho de fazer (...) Eu jurei a Constituição, que obriga o Presidente a promulgar a lei que vetou e que foi confirmada pela Assembleia da República. E eu vou promulgar; é o meu dever constitucional”, disse, na sexta-feira.

A lei que, ao longo de sucessivas alterações acabou por dar primazia à morte medicamente assistida, em vez da eutanásia - ao instituir que só será admitida a eutanásia por um médico se o doente não o puder fazer sozinho - foi confirmada na sexta-feira pelo PS, Iniciativa Liberal, Bloco de Esquerda, Livre, PAN e oito deputados do PSD. Um deputado da bancada social-democrata absteve-se, enquanto quatro outros do PS, a bancada do Chega e do PCP votaram contra. Os 129 votos a favor excederam, claramente, os 116 que eram necessários para fazer passar o documento.

O PSD já anunciou que vai pedir a fiscalização sucessiva do diploma, mas esse facto não deverá atrasar os procedimentos necessários até à sua entrada em vigor, já que só pode ser feita depois de a lei ser publicada em Diário da República. Quando é que isso irá acontecer, antecedendo a sua entrada em vigor, é que não se sabe.

Com o Verão a chegar e o início da discussão do próximo Orçamento de Estado a entrar no calendário, é provável que os quatro meses previstos para a regulamentação da lei sejam excedidos, até dada a sua complexidade.

A discussão da legalização da eutanásia é um processo que teve em início em Portugal já em 1995, mas foi já este século e, sobretudo, depois de 2010, que o tema passou a estar mais presente no Parlamento. A primeira aprovação na generalidade de uma proposta relativa à eutanásia aconteceu em 2020, mas o Tribunal Constitucional iria detectar a inconstitucionalidade de duas das normas ali presentes.

Com a dissolução da Assembleia da República pelo meio, em 2021, o tema passaria para a actual legislatura. Depois de um novo chumbo no Constitucional e de os deputados terem atendido às objecções levantadas, os deputados do PS fizeram saber que iriam confirmar a lei, depois de o Presidente ter exercido, já este ano, um novo veto político.

Ao PÚBLICO, Rui Nunes, presidente da Associação Portuguesa de Bioética, defende que, em termos legislativos, não havia nada a “aprimorar” no diploma, mas lembra que este continua a ser um tema fracturante e que continuará a merecer a objecção de parte da sociedade. Uma regulamentação célere, defendeu, é essencial.

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