O Nápoles voltou a ser feliz e é campeão 33 anos depois de Diego

Os napolitanos conquistaram nesta quinta-feira o terceiro “scudetto” da sua história, 33 anos depois de terem chegado ao segundo título com Maradona.

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Nápoles é campeão 33 anos depois de Diego e deixa adeptos em êxtase Reuters
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Terá havido um momento na época em que Nápoles, a cidade, começou a festejar por antecipação o título do Nápoles, a equipa. Talvez a meio de Janeiro, quando destruiu a Juventus em casa por 5-1, talvez na segunda semana de Março, quando se percebeu que a derrota com a Lazio tinha sido uma excepção e não o início de uma queda. Mas, a partir de uma certa altura, todos os golos, em casa e fora, foram registados nos sismógrafos calibrados para monitorizar os humores do Vesúvio. Foram muitos ao longo da época e, nesta quinta-feira, Nápoles explodiu finalmente para o título de campeão da Série A italiana. Trinta e três anos depois de Diego Armando Maradona o ter feito pela segunda vez, o Nápoles voltou a ficar com o “scudetto” e voltou a ser feliz.

De Udine, onde estiveram cerca de 13 mil “tiffosi” napolitanos, ao Stadio Diego Armando Maradona, que abriu as portas aos adeptos para emoções partilhadas e festa até às tantas, aos incontáveis milhares que não quiseram ficar em casa – talvez ninguém tenha ficado, nenhum deles queria esperar mais um dia que fosse. O Nápoles só precisava de um empate, e foi exactamente isso que conseguiu, um sofrido 1-1 frente à Udinese, depois de ter estado a perder.

Aos 13’, Lovric colocou a equipa da casa na frente e, durante quase 40 minutos, o Nápoles andou nervosamente à procura do caminho da baliza. Para salvar a festa, o homem que joga com máscara (mas não jogou de máscara em Udine), Victor Osimhen, fez o empate aos 52’. E a festa, que já se ensaiava nas ruas de Nápoles há vários meses e que estava guardada há mais de três décadas, finalmente invadiu a cidade. Os que estavam no local, invadiram logo ali o campo e correram na direcção dos novos heróis.

Ainda com cinco jornadas por disputar, já ninguém irá conseguir apanhar o Nápoles, que só não foi líder da Série A nas jornadas quatro e cinco. De resto, foi sempre em ritmo acelerado, que os principais rivais não conseguiram acompanhar – nem os dois de Milão, que olham mais para a Champions, nem a Juventus, que teve de lidar com outros problemas extra-futebol. O principal rival acabou por ser a Lazio, mas foi sempre uma perseguição à distância, sem nunca ser verdadeiramente ameaçador.

Há 33 anos que o Nápoles não festejava um título – antes, só tinha festejado dois, em 1987 e 1990, ambos com Maradona. E nesse hiato de mais de três décadas, o clube napolitano teve de bater no fundo antes de se reerguer. Depois de uma despedida amarga de Maradona (que cumpriu uma suspensão por consumo de cocaína e foi para o Sevilha), o Nápoles perdeu craques e força na Série A, caindo para a Série B em 1998. Por lá ficou duas épocas, ainda regressou brevemente ao futebol de primeira em 2000, mas a dinâmica da decadência já se tinha instalado no San Paolo.

Entre a crise desportiva e financeira nos anos pós-Diego, o Nápoles voltou a cair para a Série B e, em 2004, declarou bancarrota, por ter acumulado dívidas superiores a 70 milhões de euros. Sem licença para competir na Série B, desce mais um degrau, para a Série C e é obrigado à refundação.

Entra em cena Aurelio de Laurentiis, produtor de cinema (sobrinho de Dino), romano de nascimento, mas napolitano de alma, que investiu no clube e prometeu devolvê-lo ao topo em pouco tempo.

E sim, houve, renascimento. Em 2007, o Nápoles voltou à Série A, em pleno domínio do Inter, e rapidamente se tornaria no principal animador do “calcio” que, entretanto, entrara no tédio do campeão único – a Juventus foi campeã entre 2012 e 2020. Voltou a ter treinadores de prestígio - Mazzarri, Sarri, Benítez, Ancelotti - e os craques voltaram a povoar o San Paolo – Hamsik, Cavani, Higuaín, Mertens, Insigne. O Nápoles foi-se aproximando – quatro segundos lugares e quatro terceiros nos últimos dez anos – mas o “scudetto” nunca se materializou no San Paolo.

Em 2021, depois de um equívoco chamado Gattuso no banco durante época e meia, chegou a Nápoles um daqueles treinadores que apaixonam, mas que não ganham. Luciano Spaletti já se tinha "aproximado do Sol" nos seus tempos de Roma, mas também ele tinha sido vítima da hegemonia a Norte. Spaletti precisou de uma época para montar a equipa, e pensou-se que este seria mais um ano de transição – saíram Insigne, Koulibaly e Mertens, respectivamente o capitão, vice-capitão e melhor goleador da história do clube. Mas os que entraram, mais os que já lá estavam…

Já sabemos que há uma conexão portuguesa neste regresso do Nápoles aos títulos (o alentejano Mário Rui), mas ele não é o principal protagonista. É impossível não começar pelo goleador, Osimhen, que, em Nápoles, se transformou num dos melhores avançados do mundo. Foi caro (custou 70 milhões em 2020), mas ninguém está agora a olhar para o preço: em três épocas confirmou tudo o que se esperava dele, capacidade atlética e grande atracção pelo golo, 55 marcados pelo Nápoles, já contando com o golo que deu o título.

Outra figura maior do título napolitano é alguém que, antes desta época, era um verdadeiro desconhecido da alta-roda do futebol europeu. Khvicha Kvaratskhelia, o craque georgiano do nome impronunciável, teve impacto imediato na equipa, com golos (14) e assistências (14) actuando, preferencialmente, a partir do flanco esquerdo. E pensar que o Nápoles pagou apenas dez milhões por ele…

E há outros. Desde o ágil Alex Meret na baliza, mais uma parceria defensiva sólida formada por Kim e Rrahmani, a autoridade de Lobotka e Zielinski no meio-campo, Di Lorenzo, e (porque uma equipa não são apenas 11) homens como Raspadori, Lozano, Anguissa, Simeone, Politano ou Ndombélé. Nem que tenham jogado apenas um minuto ou dois, todos eles serão heróis que entram para a história do Nápoles. "Sempre me disseram que iríamos ganhar", foram as palavras de Di Laurentiis no Diego Armando Maradona, ele que não foi a Udine para ficar ao lado dos adeptos. "E ganhámos todos juntos."

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