A manifestação pela Habitação e a ausência de Moedas

Para Moedas a ideologia é uma coisa má e só acontece aos outros. É uma coisa de esquerda. A sua direita não é uma ideologia, mas sim uma maneira de resolver os problemas das pessoas.

Carlos Moedas esteve na manifestação dos empresários do alojamento local. Explicou que o fez porque há muita gente que tem no sector o seu “ganha-pão” e que sem este negócio não conseguiriam “chegar ao fim do mês”. A questão aqui não é aferir se é ou não verdade que, para alguns, o alojamento local é um pequeno negócio no qual baseiam a sua subsistência. Será certamente verdade. Claro que reconhecer isso não significa que se deva ignorar que o alojamento local agravou o problema da Habitação e que esse problema afeta muitas mais pessoas e de uma forma que obriga a tomar medidas.

Mas voltemos à argumentação de Carlos Moedas. No fundo, defende que, no alojamento local, estão pessoas e famílias que, como as outras que reivindicam casas a preços acessíveis, passam por dificuldades.

Então porque não compareceu à manifestação de sábado, onde era bastante mais evidente estarem pessoas que não têm o ganha-pão assegurado e que têm dificuldades em chegar ao fim do mês? Serão mais atendíveis as dificuldades dos empresários do alojamento local?

Moedas explica: não foi à manifestação de sábado porque não precisa de ir a uma manifestação para estar nas ruas e falar com os lisboetas. Para Moedas, os lisboetas sabem muito bem que ele anda a resolver os seus problemas e não precisam que ele compareça ao seu protesto. Já os empresários do alojamento local, porventura mais inseguros, precisam da sua presença para se sentirem amparados.

Ao mesmo tempo, Moedas denuncia o que não acha bem: há pessoas a fazer política com o tema da Habitação e ele acredita em soluções para os problemas e não nisso de trazer a ideologia para um problema tão grave. Reparem que um político considera que defender uma ideologia enquanto se pedem soluções para o problema da Habitação é uma coisa negativa. Mas reparem sobretudo que faz isso enquanto ele próprio defende uma ideologia: apoia uma dúzia de empresários, mas não os milhares que afirmam não ter casa para viver; faz a apologia da propriedade privada como sendo sagrada em democracia e confia no mercado para resolver o problema, ou seja, defende que toda a nova construção faz parte da solução.

Para Moedas a ideologia é uma coisa má e só acontece aos outros. É uma coisa de esquerda. A sua direita não é uma ideologia, mas sim uma maneira de resolver os problemas das pessoas. Vamos então a essa parte.

Afirmou que, nos dez anos anteriores ao seu mandato, foram construídas em média 17 casas por ano. Por alguma razão ninguém foi verificar este número. É que o anterior executivo – apesar de ter acordado tarde para o problema da Habitação – entregou mais de duas mil casas com rendas sociais. Afirmou também já ter construído mais de mil casas e ainda já ter entregado 1022 chaves. Outra vez: seria útil que alguém confirmasse esses números. É que Moedas beneficiou – sem o reconhecer, o que é pena – do trabalho deixado a meio pelo executivo anterior. Não tem mal nenhum, é o funcionamento da democracia. O mal está em fazer de conta que não é assim e em não ser rigoroso em números que teima em anunciar. Onde estarão as mil casas construídas por este executivo? Já agora: porque não houve avanços nos projetos para rendas acessíveis do Vale de Santo António, Restelo e Av. Das Forças Armadas?

Queixa-se muito de quem usa o problema da Habitação para fazer política, mas não tem feito outra coisa. Montenegro que se cuide. Carlos Moedas, a partir da Câmara Municipal de Lisboa, faz de oposição ao Governo. Isto beneficia quem vive com os impactos da crise da Habitação? Não parece ser o caso. Opõe-se às medidas anunciadas e só lhe ocorre defender o santo alojamento local.

No sábado, Moedas não compareceu à grande manifestação pela Habitação e não terá sido pelas razões que apresentou. Para aqueles manifestantes, as políticas de Costa estão aquém do que é preciso. Acontece que Moedas diz dessas mesmas políticas que são as mais radicais que já viu. Há aqui uma distância que é infinita. É algures nesta distância que poderão ser encontradas as razões para a sua ausência.

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