Crónica no Correio da Manhã defende que mulheres na televisão têm de ter “silhueta perfeita”

Texto ataca apresentadora da TVI Maria Botelho Moniz, por ser “robusta, com tendência para aumentar de peso”, e Cristina Ferreira, por mostrar “braços tomados pela flacidez”. Críticas não tardaram.

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Para Cristina Ferreira, o artigo “merece atenção judicial” Miguel Manso

O antigo jornalista Alexandre Pais usou o seu espaço de opinião no Correio da Manhã (CM) para reagir ao regresso da apresentadora Maria Botelho Moniz ao programa das manhãs da TVI Dois às 10, depois de umas férias, para a aconselhar a “tratar da imagem”, avaliando que esta “é tudo”. A crónica gerou polémica e várias figuras públicas vieram em defesa da apresentadora.

Sobre Maria Botelho Moniz, Alexandre Pais escreve: “Mulher simpática, mas robusta, com tendência para aumentar de peso e raramente usando roupa adequada às suas características, Maria devia concentrar nesse problema, de resolução difícil, o que ele exige: disciplina e capacidade de sacrifício, muito sacrifício.”

Mas o antigo director do desportivo Record, cargo que assumiu entre 2003 e 2013, diz que Maria Botelho Moniz “não estará na melhor estação para isso”, considerando que o exemplo da directora de Entretenimento e Ficção do canal, Cristina Ferreira, não é o melhor. “Basta ver como nas ‘galas’ de domingo a sua directora, de mangas a cava, exibe — e ergue em vez de proteger — os braços tomados pela flacidez do tempo e da falta de ginásio.”

O texto compara então as duas profissionais da TVI com duas da RTP, “exemplos de cuidado e inteligência”, escrevendo que Catarina Furtado e Sónia Araújo, “após os 50, surgem sempre de silhueta perfeita e bem produzidas, em sinal de respeito por si e pelo público”.

Cristina Ferreira recorreu ao Instagram para reagir ao artigo de Alexandre Pais, que catalogou de “execrável”, considerando que “a impunidade sentida nos tempos que correm não faz vislumbrar um futuro risonho”. Cristina Ferreira revela-se ainda chocada pelo facto de o texto ser assinado por um jornalista, que “decidiu tecer considerações sobre os corpos de duas mulheres de forma abjecta e reprovável”, declarando que o artigo “merece atenção judicial”.

A apresentadora acusa o texto de ir “contra todas as regras do jornalismo e da empatia”, avaliando que “a ditadura da imagem imposta ao longo de muitos anos já provocou danos suficientes em algumas mulheres para que continue a existir”. Ao longo das stories, não deixa de sublinhar que no mesmo dia, neste domingo à noite, iria “apresentar um programa com os meus braços flácidos, a minha celulite, a minha retenção e inchaço típicos de um corpo feminino”. E cumpriu.

Outras vozes já se juntaram à de Cristina Ferreira para repudiarem o texto de Alexandre Pais, a começar por Catarina Furtado, visada como um exemplo a seguir em termos de imagem: “Este texto é inadequado e ofensivo”, escreve, declarando que não aceita e devolve o “elogio”.

Também a cantora Carolina Deslandes recorreu ao Instagram para considerar que a culpa não é só do autor, mas “do jornal que permite e promove este conteúdo”, acusando a insistência na ideia de que “se pode falar do aspecto físico das mulheres, do seu corpo, como se fosse um objecto ao qual se atribui uma classificação”.

Já a humorista Joana Marques, que tem muitas vezes colocado Cristina Ferreira no centro da sua rubrica Extremamente Desagradável, recorreu à ironia para se manifestar contra o texto publicado no CM: “Alexandre Pais: o homem que olha para Cristina Ferreira e vê obesidade mórbida”, escreve, questionando: “Como é que uma directora de programas se atreve a não fazer crossfit todos os dias?” E resume: “Senhoras, se quiserem respeitar o público, já sabem. Silhueta perfeita, bem produzidas. Ter coisas para dizer? Secundário. Para isso já estão os homens.”

Alexandre Pais (n. 1946, Lisboa), lê-se no seu perfil da Wikipedia, começou no jornalismo em 1964, no trissemanário Mundo Desportivo, tendo dirigido o diário 24 Horas, o semanário Tal & Qual, os semanários desportivos Off-Side e Jornal do Belenenses, as revistas Mundial, Élan, Tomorrow, Teenager e Dona. Foi director, entre 2003 e 2013, do diário desportivo Record e integrou o conselho editorial da revista Sábado. Entre 2013 e 2017, foi comentador das rubricas Mercado e Hora Record, da CMTV.

Actualmente, assina o espaço Antena Paranóica no Correio da Manhã na qualidade de colunista, mas, segundo a lista de profissionais do sector, já não possui carteira de jornalista.

Em 1974, escreveu Capitães de Abril, em dois volumes, editados pela Amigos do Livro.

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