A águia-imperial-ibérica já conta com 841 casais em Portugal e Espanha

Outrora quase ausente de Portugal, a águia-imperial-ibérica tem agora 21 casais reprodutores no Alentejo. E há três crias destas aves raras que cresceram e já fazem deslocações até ao Norte de África.

Foto
A Aquila adalberti é uma ave de grande porte, que apresenta um bico sólido e garras potentes Laszlo Balogh/Reuters

Os esforços de preservação da águia-imperial-ibérica estão a surtir efeito: a espécie Aquila adalberti já conta com 841 casais reprodutores na península ibérica, refere um comunicado de imprensa divulgado esta sexta-feira pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF). Em 1980, esta espécie chegou a ser considerada extinta enquanto reprodutora.

Em Portugal, este resultado positivo na recuperação desta ave de rapina deve-se em grande parte a uma maior presença do coelho-bravo, presa da águia-imperial-ibérica. “Aqui os animais estão centrados no Baixo Alentejo, onde são desenvolvidas há vários anos acções de fomento da espécie-presa. O coelho-bravo é a principal presa dos ecossistemas mediterrânicos”, explica ao PÚBLICO o biólogo Carlos Carrapato, técnico superior do ICNF.

Em 2020, aquando da monitorização da águia-imperial-ibérica em território nacional – projecto do qual Carlos Carrapato fez parte –, foram observados 21 casais reprodutores, e cerca de 20 crias voadoras. Se compararmos os resultados obtidos com os de há seis anos, numa operação semelhante, em que se registaram 13 casais no Alentejo, podemos apontar para um crescimento de cerca de 60% da população da espécie entre 2017 e 2020.

“Outra boa notícia é que há águias-imperiais que nasceram no Baixo Alentejo e que têm feito deslocações até ao Norte de África”, conta, orgulhoso, Carlos Carrapato. O biólogo explica que, em 2020, três crias da espécie foram marcadas com emissores GPS/GSM – uma prática desde 2015 –, o que permitiu aos técnicos do ICNF acompanhar todos os movimentos das jovens aves.

“Os dados obtidos revelam que as aves se deslocam, sobretudo, entre o Sul de Portugal e Espanha, tendo algumas voltado a visitar o território original onde nasceram, pelo menos numa das épocas de reprodução seguintes. Há ainda a destacar a deslocação de dois indivíduos para o Norte de África”, lê-se no relatório Situação de Referência das Populações de Águia-imperial-ibérica (Aquila adalberti), Águia-real (Aquila chrysaetos) e Águia de Bonelli (Aquila fasciata), divulgado há três anos.

Foto
A águia-imperial-ibérica, Aquila adalberti Rainer Mueller/GettyImages

Mudança de estatuto de conservação?

A Aquila adalberti é uma ave de grande porte, que apresenta um bico sólido e garras potentes. Nidifica em árvores de zonas específicas (com destaque em Portugal para o Alentejo) onde esta ave de rapina rara pode contar com áreas florestais extensas e calmas, próximas de áreas de cultivo de cereais portanto, geograficamente estratégicas para a procura de alimento. A espécie vive, em média, cerca de 16 anos.

A espécie deixou de nidificar em Portugal desde os anos 1980, chegando mesmo a ser considerada extinta como espécie reprodutora. Há duas décadas, contudo, a presença de um casal Aquila adalberti com ninho foi verificada no Parque Natural do Tejo Internacional. Em 2006, o mesmo aconteceu no Alentejo.

Hoje a águia-imperial-ibérica está classificada, desde 2005, como “criticamente em perigo” em Portugal e, desde 2021, como “vulnerável” na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês).

Havendo hoje 841 casais reprodutores em território ibérico, será que está na altura de mudar o estatuto da única espécie de ave de rapina nativa da península? “Até poderíamos pensar em passar de' criticamente ameaçada' para 'ameaçada'. Seria razoável mas não podemos porque as causas não naturais não estão suficientemente mitigadas”, explica ao PÚBLICO Carlos Carrapato, numa chamada telefónica a partir do Parque Natural do Vale do Guadiana, no Alentejo, onde realiza trabalho de campo.

Foto
A águia-imperial-ibérica, Aquila adalberti David Tipling

Venenos, electrocussão e perseguição

As causas não naturais mencionadas pelo biólogo consistem, por exemplo, no uso ilegal de venenos (sendo uma ave necrófaga, pode ser afectada ao consumir carcaças de animais envenenados), assim como na “perseguição directa” à espécie. Nesses casos, o trabalho a fazer situa-se no campo da literacia ambiental. “O veneno é uma técnica que depende de cada pessoa, temos feito campanhas de sensibilização ambiental para explicar que esta técnica traz muito mais problemas que vantagens”, refere Carlos Carrapato.

A actualização da Estratégia de Conservação da espécie em Portugal e Espanha foi aprovada em 2018. No contexto ibérico, os esforços de conservação têm estado “focados sobretudo na correcção de linhas eléctricas de alta perigosidade e no combate ao uso ilegal de iscos envenenados”, afirma o comunicado. Os resultados do plano de acção conjunto foram apresentados dia 16 de Fevereiro, em Madrid, refere o ICNF no documento.

Há ainda uma preocupação emergente: a criação de centrais fotovoltaicas pode afectar o habitat desta espécie. Em Dezembro de 2022, por exemplo, a organização ambientalista Quercus denunciou a destruição de uma zona de nidificação de um casal de águia-imperial-ibérica por ocasião da construção de uma infra-estrutura energética deste tipo nos concelhos de Fundão e de Castelo Branco.

Sugerir correcção
Comentar