Nova lei anti-gay do Uganda endurece penas e criminaliza a mera identificação como LGBTQ

A Lei Anti-Homossexualidade, já aprovada pelo Parlamento, ainda tem de ser assinada pelo Presidente. Pelo menos 12 ugandeses foram presos na última semana por “prática homossexual”.

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John Musira, um deputado ugandês, exibe uma túnica a favor da criminalização da homossexualidadeed in an anti gay gown gestures as he leaves the chambers during the debate of the Anti-Homosexuality bill ABUBAKER LUBOWA/Reuters

A homossexualidade já é proibida no Uganda, onde a sua “prática” motiva frequentes detenções, uma situação comum a muitos países da África Oriental. Mas a nova Lei Anti-Homossexualidade, aprovada agora pelo Parlamento ugandês, leva a criminalização ainda mais longe, e não apenas no Uganda: a organização Human Rights Watch acredita que esta é a primeira lei a criminalizar a simples identificação de uma pessoa como lésbica, gay, bissexual, transgénero e queer.

“Uma das características mais extremas deste novo projecto-lei é que criminaliza as pessoas simplesmente por serem quem são, para além de infringir ainda mais os direitos à privacidade e as liberdades de expressão e de associação que já estão em risco no Uganda”, afirmou Oryem Nyeko, membro desta organização não-governamental que investiga os ataques aos direitos humanos no Uganda e na Tanzânia.

O projecto de lei original propunha criminalizar qualquer orientação sexual ou identidade de género “contrária às categorias binárias de homem e mulher” com uma punição que podia ir aos dez anos de prisão, escreve a HRW, que pôde submeter as suas opiniões sobre o texto ao Comité de Assuntos jurídicos do Parlamento. Durante o debate, foram aprovadas muitas emendas e a dimensão das novas penas não foi divulgada de imediato.

“Esta câmara não hesitará em restringir seja que direito for, na medida em que reconhece, protege e salvaguarda a soberania deste país e a sua moral”, afirmou a presidente do Parlamento, Anita Annet, congratulando-se com a “aprovação em tempo recorde”. A discussão envolveu a confusão entre abusos sexuais de menores e relações consensuais entre adultos do mesmo sexo e vários discursos homofóbicos; também houve deputados a aparecerem vestidos com túnicas onde se lia “Parem homossexualidade, lesbianismo, gays”.

“O nosso criador, Deus, está feliz com o que está a acontecer… Apoio o projecto para proteger o futuro das nossas crianças”, declarou o deputado David Bahati (do Movimento de Resistência Nacional, partido do Presidente, Yoweri Museveni) durante o debate. “Ninguém nos deve chantagear, ninguém nos deve intimidar”, repetiu o ministro do Comércio e Indústria, Mwebesi Francis.

As habituais referências à soberania na discussão deste tema remetem para as pressões internacionais que já se fizeram sentir no país, por exemplo em 2014, quando Museveni promulgou uma lei idêntica, apesar das críticas e de países doadores terem ameaçado cortar as ajudas, incluindo os Estados Unidos, maior doador do país, então presidido por Barack Obama – na altura, a lei, segundo a qual os “actos de homossexualidade” deviam ser punidos com prisão perpétua, foi travada pelo Tribunal Constitucional, por ter sido aprovada sem o quórum obrigatório no Parlamento.

Museveni tem agora de promulgar ou vetar a nova lei: o chefe de Estado, de 78 anos, tem sublinhado que não vê o tema como prioritário e que quer manter boas relações com os doadores e investigadores internacionais, mas, ao mesmo tempo, acaba de descrever os homossexuais como “pervertidos”. Dias depois das suas declarações, a 17 de Março, a polícia anunciou a detenção de seis homens por “prática homossexual”. Outros seis foram detidos pelo mesmo motivo dois dias depois.

Entre os 62 países membros das Nações Unidas com leis que criminalizam as relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo, segundo dados da ILGA World, 32 estão em África e 20 na Ásia, incluindo quase todos os países do Médio Oriente.

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