Prémio Pritzker a Chipperfield: o apelo do intemporal na arquitectura

Premiar a arquitectura de David Chipperfield é reconhecer o legado da arquitectura clássica, dos ritmos e das proporções intemporais. Mas não significa um regresso ao passado.

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Neues Museum em Berlim Reuters

O Prémio Pritzker da arquitectura não pára de surpreender. Nos últimos anos, distinguiram-se arquitectos com trabalho reconhecido em habitação e equipamentos sociais. Até o presidente do júri, o chileno Alejandro Aravena, lembrou a precisão com que David Chipperfield (o mais recente vencedor) responde a cada projecto, a cada programa arquitectónico, mesmo que isso o leve a "desaparecer" no espaço.

É essa diferença de postura — como um actor que se mexe com a personagem — que distingue a arquitectura de David Chipperfield, que consegue criar edifícios icónicos em Milão, no MUDEC, ou em Seul, nos escritórios da Amorepacific. Mas quando intervém no Neues Museum de Berlim aponta os holofotes ao que já existia.

Um edifício que sintetiza as diferentes formas de estar de David Chipperfield é precisamente a sua casa de férias em Corrubedo, na Galiza. Trata-se de um edifício com duas fachadas: a que está voltada para uma rua histórica, discreta, quase imperceptível, e a que está voltada para o mar, numa interpretação da arquitectura vernacular com formas mais livres.

Não existe, portanto, nenhuma fórmula para construir, e David Chipperfield sabe-o como poucos, mais de cem projectos depois. As imagens da sua expansão do Museu Arqueológico de Atenas continuam a dar protagonismo à fachada original, oitocentista, relegando os novos volumes propostos para uma presença mais contida. A leveza da intervenção assume a aparência de um projecto de paisagismo, mas sem deixar de acompanhar o museu preexistente com proporções clássicas.

É precisamente nos ritmos e na proporção que a arquitectura de David Chipperfield se evidencia, o que talvez explique como os seus projectos são, em geral, tão bem aceites. Como se poderá imaginar, em alguns casos, as reacções são menos consensuais. A altura da Casa Nobel de Estocolmo foi questionada por grupos de preservação do património, e até pelo rei da Suécia — levando o arquitecto a responder, numa carta, às várias críticas que foram feitas. Mas a ponderação no seu desenho, e a capacidade de procurar compromissos, foi fundamental para validar muitos dos seus projectos.

Premiar a arquitectura de David Chipperfield é, pois, reconhecer o legado da arquitectura clássica, dos ritmos e das proporções intemporais. Mas não significa, de todo, um regresso ao passado. Apenas é o reconhecimento de algo que nunca deixou de existir: a criação de espaços que transmitem serenidade, equilíbrio e harmonia.

Também não significa este Pritzker que haja menos espaço para a inovação. David Chipperfield já elogiou a versatilidade do tijolo, na diversidade de modos de construir que alguns dos materiais mais intemporais conseguem trazer. Esse equilíbrio, entre o conhecimento das gramáticas mais intemporais e a inovação, continua a ser um desafio para o ensino da arquitectura.

Entre a tradição e a reinvenção do clássico, pressente-se a falta uma ligação ao intemporal, num mundo tão amarrado ao imediato. A resposta de David Chipperfield, que talvez tenha eco nas novas gerações de arquitectos, lança uma janela de intemporalidade na criação de cidades sustentáveis.

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