Preto no branco: a importância da educação anti-racista na primeira infância

As crianças não dependem apenas da família para recolherem informações sobre as normas sociais e muito menos para construírem as suas próprias crenças num mundo racialmente desigual.

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Miguel Feraso Cabral

A cultura popular diz-nos que as crianças não vêem cor ou que não percebem o conceito de raça. Há quem defenda que conversar sobre preconceito, discriminação, xenofobia ou racismo é como lavar o cérebro a seres tão jovens que não têm capacidade para pensarem por si próprios. Então, como é que explicamos os comentários racistas que continuam a ser proferidos por crianças? Vamos continuar a varrer para debaixo do tapete o que não deve ser tratado como mau comportamento? Será justo mantermos a culpa nas pessoas adultas que as educam?

Investigadores como o professor de Antropologia e Psicologia Lawrence Hirschfeld sugerem que as crianças não só reconhecem as diferenças raciais a partir de idade pré-escolar, como também desenvolvem preconceitos raciais que não se assemelham, necessariamente, à perspectiva das pessoas adultas que as rodeiam. O argumento é simples: as crianças não dependem apenas da família para recolherem informações sobre as normas sociais da cultura dominante em que estão inseridas e muito menos para construírem as suas próprias crenças num mundo racialmente desigual.

A confusão instala-se quando o raciocínio imaturo das crianças associa que uma pessoa que é semelhante a si numa determinada dimensão (por exemplo, a cor da pele) é também idêntica noutras dimensões (por exemplo, o nível de inteligência ou o tipo de habilidades). Daí a importância da representatividade negra e de outras minorias étnicas, pois é através da observação que as crianças formam estereótipos e tendem a seguir determinados grupos em detrimento de outros.

Olhemos para os livros ilustrados, para os programas de televisão e para as canções e os filmes infantis. A cultura branca de classe média é apresentada como um padrão em termos de aparência, beleza, linguagem, práticas culturais, alimentação e assim por diante nas sociedades ocidentais. A partir desta padronização e categorização social, as crianças ou incluem ou excluem outras de determinadas actividades.

Naturalmente, a exclusão dá azo à agressão, seja ela emocional ou física. Afinal, quem é que gosta de se sentir desprezado ou injustiçado apenas pela cor da sua pele? Para evitar a perpetuação deste tipo de desigualdades sociais, o silêncio não pode nem deve ser solução, mesmo que, para muitas pessoas, este seja um tema desconfortável de se abordar.

Todas as crianças têm o direito a uma educação intercultural para que possam pensar criticamente sobre as questões raciais e as pessoas adultas também para que, em conjunto, façam parte da mudança positiva! Em vez de se tentar ocultar a poluição racial que ainda existe na sociedade portuguesa, porque não explicar às crianças que, tal como existem pessoas com cabelos de cores diferentes, também existem pessoas que têm cores de peles diferentes? Por que não explicar-lhes o conceito de melanina e que o racismo não é um problema individual, mas social?

Infelizmente, em muitas situações, as crianças não recebem explicação alguma e nem por isso as dúvidas desaparecem. Em vez disso, as crianças deveriam ser envolvidas em actividades e conversas abertas, honestas e adequadas à idade sobre como funciona o racismo, a razão pela qual ainda existe desigualdade racial e o que podem fazer a respeito. Este é um trabalho complexo, mas importante para qualquer educador/a anti-racista que queira empoderar as novas gerações e alterar velhos estereótipos que se mantêm inalterados.

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