Direito a não ser “divertido” no trabalho? Francês ganha processo contra empresa que o despediu

Empresa acusou o homem de “incompetência profissional” por não ter aderido aos convívios. Segundo o ex-funcionário, a cultura “divertida” envolvia “práticas humilhantes”, como actos sexuais simulados.

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Francês ganha processo em tribunal sobre o direito de não ser divertido no trabalho Elevate,Elevate

O mais alto tribunal francês decidiu que foi injusto o despedimento de um homem por alegadamente não ser “divertido” o suficiente no seu trabalho, numa empresa de consultoria em Paris.

O homem, mencionado nos documentos do tribunal como Sr. T, foi despedido da Cubik Partners em 2015, depois de se recusar a participar nos seminários e eventos sociais de fim-de-semana que, de acordo com os seus advogados, incluíam “alcoolismo excessivo” e “promiscuidade”.

O ex-funcionário afirmou que a cultura “divertida” na empresa envolvia “práticas humilhantes e intrusivas”, que incluíam actos sexuais simulados, apelidos grosseiros e obrigavam-no a partilhar a cama com outro empregado durante as actividades laborais.

No acórdão deste mês, o Tribunal de Cassação decidiu que o homem tinha direito à “liberdade de expressão” e que a recusa em participar nas actividades sociais era uma “liberdade fundamental” ao abrigo das leis do trabalho e dos direitos humanos, e não um motivo para ser despedido.

De acordo com os documentos do tribunal, o homem foi contratado pela Cubik Partners como consultor sénior em Fevereiro de 2011 e promovido a director em Fevereiro de 2014. Foi despedido por “incompetência profissional” em Março de 2015 por, alegadamente, não ter aderido aos valores de convívio da empresa.

A empresa, que não respondeu ao pedido de comentário do The Washington Post, criticou ainda o tom por vezes “frio e desmotivante” em relação aos subordinados, e a alegada incapacidade de aceitar feedback e pontos de vista diferentes.

Não é a primeira vez que a cultura de consumo de álcool de uma empresa é examinada em processos judiciais. Vários incidentes recentes destacaram o enraizamento do álcool na cultura profissional das empresas, mesmo depois do movimento #MeToo ter destacado a má conduta no local de trabalho a nível mundial. Algumas empresas contrataram “acompanhantes sóbrios” em eventos na esperança de evitar tais questões.

Um consultor da PricewaterhouseCoopers, em Inglaterra, processou a empresa por lesões graves que sofreu num evento de trabalho que tornou numa “virtude competitiva” o consumo “excessivo” de álcool, num processo instaurado este ano no Supremo Tribunal de Londres. Michael Brockie entrou em coma e teve parte do seu crânio removido depois de participar no evento, relatou o The Post.

Em Março, o mercado de seguros Lloyd's of London multou a empresa Atrium Underwriters num valor recorde de 1 milhão de libras (valor semelhante em euros) por “falhas graves”, incluindo uma “noite de rapazes” em que os empregados, incluindo dois executivos seniores, “participaram em jogos de iniciação inapropriados e consumo de álcool em excesso, e fizeram comentários sexuais sobre colegas do sexo feminino”, escreveu o Guardian na altura.

A França está entre os países mais liberais do mundo em relação ao consumo de álcool. A idade mínima legal para beber álcool em público é de 18 anos, mas não há qualquer regulamentação sobre o consumo de bebidas em privado.

Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post

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