Alargamento do mecanismo ibérico ao resto dos países continua num impasse

Direcção-Geral de Energia está mais preocupada com o risco do aumento do consumo de gás ou da “fuga” de electricidade barata para países terceiros do que com o potencial de poupanças.

Foto
Ministros europeus da energia e clima, entre eles a belga e o alemão, reuniram-se esta terça-feira no Luxemburgo EPA/JULIEN WARNAND

A pedido dos líderes europeus, a Comissão Europeia trouxe para a discussão do Conselho de Energia desta terça-feira, no Luxemburgo, uma primeira análise do impacto do eventual alargamento do modelo em que assenta o mecanismo de excepção ibérico que permite baixar o preço da electricidade aos restantes países europeus — e não é exactamente positiva ou encorajadora.

Portugal e Espanha foram autorizados, em Abril, a estabelecer um tecto máximo administrativo até aos 60 euros por megawatt hora para o gás que é utilizado para a produção eléctrica: como grande parte da geração resulta do uso de energias renováveis, o preço final estava a ser significativamente distorcido pelo valor da tecnologia marginal (gás). A excepção ibérica permitiu reduzir as facturas em 17% até agora, segundo o Governo português.

Na avaliação entre os custos e os benefícios da generalização deste tipo de mecanismo, que Bruxelas insiste em descrever como um “subsídio” ao uso do gás na geração de electricidade, os técnicos da Direcção-Geral de Energia mostram-se mais preocupados com o risco do aumento do consumo de gás ou da “fuga” de electricidade barata para países terceiros do que com o potencial de poupanças nas facturas dos contribuintes europeus, avaliado em 13 mil milhões de euros.

O montante não é despiciendo, e, como assinala o executivo comunitário, “poderia ter um efeito benéfico na inflação global”. Mas em termos de receitas fica bem abaixo dos 70 mil milhões de euros previstos com a introdução do preço máximo para as tecnologias inframarginais utilizadas na produção de electricidade, que já foi aprovado pelos ministros da Energia.

O tecto fixado por Bruxelas para as receitas das tecnologias inframarginais (energias renováveis ou nuclear) é 180 euros por megawatt hora (Mwh). As simulações do documento de trabalho avançado esta terça-feira pela Comissão colocam o possível preço máximo para o gás para a produção de electricidade nos 120 euros por Mwh.

“Esta escolha de nível de subsídio procura encontrar um equilíbrio. Queremos assegurar a eficácia da medida para reduzir os preços da electricidade, e evitar que a queima de gás se possa tornar financeiramente atractiva ao ponto de aumentar a sua utilização e reduzir a geração por tecnologias alternativa. É de notar que ao preço actual do gás (cerca de 60 euros MWh) esta medida não produziria quaisquer resultados”, lê-se no documento divulgado pela Comissão.

Durante a discussão, que não foi conclusiva, os ministros de Portugal e Espanha deram conta das respectivas experiências do uso deste modelo. “Tivemos oportunidade, mais uma vez, de esclarecer dúvidas e informação errada que existe relativamente ao mecanismo ibérico”, referiu o ministro do Ambiente e Acção Climática, Duarte Cordeiro, repetindo que a avaliação de Portugal é “muito positiva”.

“Nós não temos dúvidas dos benefícios que o mecanismo nos traz, porque são muito evidentes e fáceis de demonstrar: quando comparamos com o preço de mercado sem o mecanismo, é fácil de demonstrar a poupança gerada”, prosseguiu, lembrando que o sistema permite “pegar nos ganhos excessivos de determinados sectores de energia renováveis e aplicar na redução do preço para os consumidores”.

A sua congénere espanhola, Teresa Ribera, disse compreender o interesse de vários Estados-membros na adopção deste modelo, considerando “natural” que queiram poder beneficiar da mesma protecção de que gozam actualmente os consumidores ibéricos face à alta dos preços. “Este mecanismo funciona como um seguro, que garante a protecção, se o preço do gás aumentar. Entendo perfeitamente que outros Estados-membros queiram beneficiar de uma resposta semelhante”, afirmou.

Pelo seu lado, o ministro holandês para a Política Energética e Climática, Rob Jetten, disse que continuava a ter “muitas dúvidas” sobre a exequibilidade do modelo ibérico a nível europeu. “Ainda temos muitas perguntas sem resposta sobre a segurança do abastecimento e o impacto financeiro deste tipo de mecanismo. Queremos certificar-nos que não tem um grande aumento da procura de gás na Holanda e que não há fuga para o Reino Unido, sem uma resposta sobre quem vai pagar por isso”, declarou.

A Comissão terá de aprofundar a sua avaliação, e também desenvolver as propostas concretas para a aprovação do pacote para uma intervenção de emergência sobre o mercado do gás que apresentou na última semana, a tempo de uma nova reunião extraordinária dos ministros da Energia, que já ficou marcada para 24 de Novembro.

Sugerir correcção
Ler 5 comentários