Tea Törmänen: “A energia nuclear é uma das melhores formas de produção de energia”

Os membros da RePlanet encaram as alterações climáticas e questões ambientais de uma perspectiva científica e abordam-nas de uma forma optimista, de quem quer resolver problemas com a tecnologia.

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"A energia nuclear tem uma pegada muito pequena", diz Tea Törmänen Vincent Kessler/REUTERS

A finlandesa Tea Törmänen integra uma organização que quer defender o ambiente de forma diferente. Chama-se RePlanet, existe em vários países europeus e na Austrália, e define-se como “pró-ciência e pró-humanidade”. Centram-se na ciência e na tecnologia. “Pensamos que estavam muito em falta no movimento ambientalista. A maioria dos grupos opõe-se a tecnologias como a edição de genes ou energia nuclear, que está demonstrado serem ferramentas eficazes para resolver alguns dos nossos problemas” disse ao PÚBLICO, por telefone, antecipando a conversa que vai decorrer online esta segunda-feira, no site da Fundação Francisco Manuel dos Santos.

Tea Törmänen participa no ciclo de debates e entrevistas digitais sobre alterações climáticas comissariadas por Carlos Fiolhais e David Marçal e a sua conversa online tem o título “Que fontes de energia usar?”. Porque é que a RePlanet, sendo uma organização ambientalista – presente em Portugal desde o início de Outubro – defende a energia nuclear?

“A energia nuclear é uma das melhores formas de produção de energia”, diz esta bióloga. “Tem uma pegada muito pequena. Não é necessário muita mineração, porque o urânio é um mineral com alta densidade energética, por isso basta uma pequena quantidade para produzir muita energia. E as centrais nucleares não causam emissões de dióxido de carbono (CO2)”, defende. “E pode fornecer energia durante 24 horas, sete dias por semana.”

Mas é caro construir centrais nucleares, e também mantê-las em funcionamento. Lançar o projecto de uma nova central é uma obra complexa, e sujeita a muitos atrasos. Até que ponto pode a energia nuclear ser útil para a emergência climática? “Não gosto de declarações de que temos de ter tudo pronto até 2030, por exemplo. Vamos continuar a precisar de energia limpa muito tempo depois disso”, diz Tea Törmänen.

“Precisamos de construir constantemente centrais eólicas ou solares, porque terão de ser substituídas a certa altura. Com as centrais nucleares é a mesma coisa”, defende. “E não basta chegar à neutralidade carbónica, chegará uma altura em que teremos de começar a tirar CO2 da atmosfera, e então vamos precisar de muita energia limpa. Temos de nos preparar para as necessidades energéticas para além da neutralidade carbónica”, afiança.

Aquilo em que a RePlanet aposta é nos chamados reactores modulares pequenos, com menos potência do que os reactores tradicionais – que embora despertem muito entusiasmo em vários países, ainda não existem. “Na Finlândia existe uma proposta para construir estes reactores em estaleiros navais e produzi-los em série. Quando se começa a fazer produção em massa, torna-se mais barato”, diz. “Estas centrais nucleares mais pequenas poderiam ser utilizadas para ter um aquecimento urbano mais verde, por exemplo. Ainda usamos combustíveis fósseis e queimamos lenha para aquecimento”, exemplifica.

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“A UE devia tornar-se tecnologicamente neutra. Devíamos ter ao mesmo nível todas as opções tecnológicas de baixas emissões de carbono", diz Tea Törmänen Studio Korento - Harri Mäenpää

Há várias centrais nucleares na Europa que usam combustível fabricado na Rússia, ou em países da Ásia Central, e também na Finlândia, o que levou algumas organizações ambientalistas a apelar que as sanções à Rússia incluam esse tipo de combustível. Estamos perante outra dependência da Rússia, tal como o gás? “Sim, absolutamente. Mas felizmente o urânio é muito mais fácil de obter de outros países, comparado com o gás. Na Finlândia temos adquirido algum combustível nuclear à Rússia, mas agora há planos para mudar de fornecedor.”

Tea Törmänen também faz parte do partido Os Verdes da Finlândia, que mudou de posição em relação ao nuclear recentemente. “Sim, era contra a energia nuclear, mas no programa do partido que foi aprovado na Primavera, foram acrescentadas algumas declarações pró-nuclear. Eu estive na reunião em que estas mudanças foram votadas. A posição do partido alterou-se nos últimos cinco a seis anos”, relata.

“Tem havido mudanças no movimento ambientalista também. Nós [a RePlanet] éramos a única organização ambientalista pró-nuclear, mas tivemos a surpresa agradável de ver que, quando o Parlamento Europeu aprovou a Taxonomia Verde [sistema de classificação das actividades económicas que podem ser designadas como investimentos sustentáveis na UE e que inclui a energia nuclear e o gás], só a Greenpeace processou a União Europeia por incluir o nuclear. As outras organizações ambientalistas focaram a sua atenção apenas no gás natural. É uma viragem”, diz Tea Törmänen.

“Julgo que é um sinal de que os tempos estão a mudar e de que estão a surgir vozes pró-nuclear no movimento ambientalista tradicional. Sei que muitas organizações ecológicas jovens em vários países estão a defender a energia nuclear”, completa.

Todas as energias geram resíduos

Os resíduos radioactivos, que são um dos principais motivos para outras organizações ambientalistas contestarem a energia nuclear, não são um problema para a RePlanet. “Achamos que o problema já foi resolvido. Na Finlândia existe o primeiro repositório final de resíduos nucleares do mundo”, diz Tea Törmänen. Refere-se a um depósito profundo de combustível nuclear usado na ilha de Olkiluoto, cuja construção não despertou a oposição das populações locais – ao contrário do que aconteceu com outros projectos, noutras partes do mundo.

“Os resíduos da produção de energia com combustíveis fósseis são libertados para a atmosfera e é por isso que temos a crise climática. Já a quantidade de lixo que resulta da produção de energia nuclear é muito reduzida, se levarmos em conta a quantidade de energia produzida e temos várias soluções para eles. Podemos armazená-los, poderemos ter reactores rápidos em que se utilizam os resíduos nucleares para produzir energia outra vez”, enumera.

“Todos os métodos de geração de energia produzem resíduos, por isso precisamos de reciclar. Até nas energias renováveis: os materiais das turbinas de vento, e dos painéis solares, são muito tóxicos, não podem simplesmente ir parar a um aterro”, sublinha Tea Törmänen.

O Pacto Ecológico da União Europeia prevê que esta seja a primeira região do mundo a atingir a neutralidade carbónica, até 2050. Mas para a RePlanet, o método para lá chegar devia ser diferente. “A UE devia tornar-se tecnologicamente neutra. Devíamos ter ao mesmo nível todas as opções tecnológicas de baixas emissões de carbono, como o nuclear, as eólicas e a fotovoltaica”, defende a activista finlandesa.

“Existem metas para as renováveis, mas pensamos que esta não é a abordagem certa. Devíamos ter metas apenas para as emissões e cada país devia poder decidir que método de baixas emissões usaria. Tendo uma meta para as energias renováveis, pode acontecer o que estamos a ver com a discussão sobre a biomassa – é renovável, mas queimar lenha também emite CO2”, sublinha.

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