Eleições no Brasil: esquerda e direita travam guerra de narrativas na segunda volta

A Lupa, parceira do PÚBLICO na cobertura das eleições do Brasil, verificou algumas das principais declarações dos dois candidatos às próximas eleições.

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Apoiantes de Bolsonaro e Lula em Brasília Reuters/UESLEI MARCELINO

A segunda volta das eleições brasileiras é marcada, até este momento, por uma ofensiva da esquerda, que resolveu contra-atacar a direita usando as mesmas armas. Continuam circulando peças desinformativas que tentam jogar o actual Presidente, Jair Bolsonaro (PL), contra o eleitorado cristão.

Por outro lado, diversos conteúdos tentam vincular o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a criminosos. Confira algumas das peças desinformativas que tiveram elevado alcance e interacção nas redes sociais e que foram avaliadas pela Lupa:

“Bolsonaro afirma num podcast que vai botar colo de Melo [Collor de Mello] como Ministro da Previdência do trabalho para ele confiscar a sua poupança e sua Aposentadoria”

Legenda no vídeo que se tornou viral no WhatsApp e noutras redes sociais

Avaliação da Lupa: FALSO

O vídeo foi recortado e tirado de contexto para sugerir que Bolsonaro teria dito que pretende nomear o ex-Presidente e senador Fernando Collor (PTB-AL) ministro e que juntos vão confiscar aposentadorias [reforma]. As declarações de Bolsonaro foram extraídas de uma entrevista dada pelo presidente ao Canal Pilhado, no YouTube, no último domingo (dia 9). Ele comentou em dois momentos que essa declaração é feita por opositores e não se trata de um plano de seu governo. Na mesma ocasião, o Presidente negou que o senador alagoano vai assumir algum ministério em um eventual segundo mandato.

No primeiro momento, após quatro minutos do início da gravação, Bolsonaro afirma que dizem que ele nomeará Collor como ministro para juntos confiscarem reformas, mas não menciona nomes. “Agora estão falando duas coisas, primeiro que eu sou canibal e a outra que o Collor vai ser ministro e nós vamos confiscar a aposentadoria dos aposentados”, disse o Presidente.

Já na segunda ocasião, após 1 hora e 45 segundos do início da transmissão, Bolsonaro afirma que o deputado federal André Janones (Avante-MG), reeleito nas eleições deste ano, foi o responsável pela desinformação. “Segundo o Janones, eu vou colocar o Collor de Mello como ministro da Previdência e do Trabalho e vou confiscar a aposentadoria de todo mundo, não sei quantos milhões de aposentados. Tem gente que acredita”, expôs o chefe do Executivo.

No seu perfil no Facebook, Janones publicou uma imagem na qual alega que, caso Bolsonaro seja reeleito, o ex-Presidente Collor será nomeado ministro e que, por isso, teme pelo confisco de auxílios e reformas. Procurado pela Lupa, o deputado federal não se pronunciou sobre as declarações.


“- Lamento as cenas de tumulto que ocorreram em Aparecida durante a minha visita

- Mas acho que nenhum padre ou bispo deve dizer onde posso ou não fazer campanha

- A postura arrogante de alguns religiosos explica o crescimento da igreja evangélica e o fracasso da igreja de Roma”.

Texto em tweet viral atribuído ao candidato à presidência, Jair Bolsonaro (PL)

Avaliação da Lupa: FALSO

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Agência Lupa

A equipa de campanha de Bolsonaro desmentiu a publicação e afirmou se tratar de uma montagem. No perfil Twitter do candidato, não há nenhum registo do tweet que está sendo atribuído a ele nas redes sociais. A única publicação relacionada à sua passagem em Aparecida, foi às 23h19 de ontem, 12 de Outubro de 2022, onde Bolsonaro agradeceu sua participação na celebração, enfatizou a importância da data para parte da população brasileira e desejou forças para “lutar pelos valores da Virgem e de seu filho Jesus Cristo”.

O tweet não aparece na base de dados do Projeto 7c0, que captura automaticamente tweets de políticos e emite alertas para quando eles são apagados. Os administradores do perfil publicaram uma nota dizendo que se trata, muito provavelmente, de uma montagem.

Em buscas no Google, não há nenhuma notícia ou registo dessa suposta declaração de Bolsonaro. Há, apenas, matérias jornalísticas falando sobre confusões que ocorreram do lado de fora do templo, envolvendo apoiantes do candidato. Foram procurados os termos “Bolsonaro” e “Aparecida”, além de buscas em conjunto com outras palavras relacionadas: “tumulto”, “lamento”, “twitter” e “tweet”.


“Lula e o traficante Mister M do complexo do alemão, faz o L pra tomar uma cervejinha… rs”

Texto que acompanha foto que se tornou viral em diversas redes sociais

Avaliação da Lupa: FALSO

Foto
Agência Lupa

A informação analisada pela Lupa é falsa. O homem que aparece na foto é o actor e modelo Diego Raymond. Ele foi envolvido com o tráfico de drogas e chegou a ficar preso por nove meses, em 2010. Em 2011, ele saiu da prisão e começou a trabalhar no instituto AfroReggae. No mesmo ano, foi absolvido de uma denúncia por associação ao tráfico e, desde então, não tem acções pendentes com a Justiça.

Raymond era conhecido como Mister M no Complexo do Alemão. Dos 16 aos 25 anos, ele foi ligado a uma organização criminosa e chegou a ser segurança do chefe do tráfico na região. Em 2010, ele se entregou voluntariamente à polícia e ficou preso por nove meses. Actualmente, ele é actor e está no elenco de duas produções da Globoplay.

Diego se manifestou em sua rede social sobre a circulação das fotos dele com o ex-Presidente Lula: “O ‘cidadão’ na foto é Diego, actor de série de sucesso (estreia da nova temporada de A Divisão prevista para meados de 2023), modelo, atleta de futebol americano e de crossfit, absolvido de todas as acusações e que teve uma origem difícil, como a maior parte dos brasileiros, mas segue a luta diária do preto e pobre”, disse.


“O PT é uma facção criminosa que precisa ser desarticulada o mais rápido possível”

Legenda de post que se tornou viral no Facebook

Avaliação da Lupa: FALSO

A sigla CPX, estampada no boné utilizado pelo candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em visita ao Complexo do Alemão, é usada no Rio de Janeiro para se referir aos complexos de favelas existentes na capital carioca.

Logo, não é verdade que o petista usou o boné em apoio a organizações criminosas nem que a sigla se refere ao termo cupincha, que significaria pessoas próximas a esses grupos.

O termo CPX, inclusive, é utilizado por órgãos públicos. No resumo da Lei de Diretrizes Orçamentárias do governo do Rio de Janeiro para 2023, por exemplo, há citação ao termo CPX em referência ao Complexo da Maré. A Polícia Militar do Rio de Janeiro também já utilizou a sigla no Twitter para se referir aos complexos de favela da cidade.

O portal Voz das Comunidades, que divulga notícias das favelas do Rio de Janeiro, reiterou que CPX é uma sigla para “complexo” e que o termo é muito utilizado nas redes sociais por moradores jovens. Também explicou que o boné “não tem nada a ver com o tráfico” e significa “uma manifestação de representatividade para as comunidades do Rio de Janeiro”

O site oficial do ex-Presidente Lula também emitiu nota sobre o ato no Complexo do Alemão ressaltando que “CPX significa complexo” e que, no discurso que fez no Alemão, o candidato petista “destacou a importância de um governo com justiça social e amor”.


Este trabalho resulta de uma parceria entre o PÚBLICO e a Agência Lupa.

Autores: Catiane Pereira, Gabriela Soares e João Heim
Edição: Chico Marés, Leandro Becker e Maurício Moraes

Nota do editor: o PÚBLICO respeitou a composição do texto original, com excepção de algumas palavras ou expressões não usadas em português de Portugal.

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