Três boas peças interpretadas pelo indispensável Remix Ensemble

Programa do concerto reuniu três obras do século XXI, todas elas reveladoras da mestria de cada um dos seus autores, e também do ensemble da Casa da Música.

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O Remix Ensemble foi dirigido pelo maestro francês Sylvain Cambreling Alexandre Delmar/Casa da Música

Prosseguindo o ano em que a britânica Rebecca Saunders (Londres, 1967) é a compositora em residência, o Remix Ensemble (RE) regressou esta terça-feira ao palco da Sala Suggia, após um longo Verão, com um programa cuja direcção musical esteve (bem) a cargo do francês Sylvain Cambreling.

Numa altura em que se discute baixinho a continuidade dos agrupamentos residentes da Casa da Música, importa perceber, por exemplo, que o RE é o único agrupamento português à sua escala, profissional e dedicado exclusivamente à música contemporânea de tradição erudita; portanto, o único capaz de representar Portugal em festivais estrangeiros, o único que dá a conhecer em território nacional (mesmo que apenas no Porto) a criação musical de tradição erudita dos nossos dias para este tipo de formação e, também, o que torna possível que alguns compositores portugueses cheguem a ter tocadas obras suas para agrupamento de média dimensão.

Independentemente das opções de programação, é inadmissível regressar ao tempo em que tínhamos que esperar que a Fundação Calouste Gulbenkian se dispusesse a trazer a Portugal um agrupamento congénere (do, então por nascer, RE), para a única oportunidade do ano de escutar cá 2 a 5 das centenas ou milhares de peças compostas em cada temporada.

De resto, imagine-se que aos grandes nomes incontornáveis e inquestionáveis do classicismo e romantismo (e por aí fora) tivessem faltado orquestras capazes de materializar as suas ideias: quantas partituras cuja inexistência nos é inconcebível teriam ficado por escrever?

Esta semana, uma plateia bem composta assistiu à interpretação de três obras do século XXI, todas elas reveladoras da mestria de cada um dos seus autores que, sem a pretensão de criar objectos revolucionários, procuraram fazer “bonito e bem feito”, reflectindo o tempo em que vivemos, num programa coerente ao qual pode apenas ter faltado algum contraste.

De Francesco Filidei (1973), o RE interpretou a Ballata nº 2 [2012], um trabalho que entra em diálogo com discursos da tradição, aproveitando com elegância alguns clichés da segunda metade do século XX. Da compositora em destaque em 2022, escutou-se Scar [2018-19], obra composta por encomenda do festival Acht Brücken, com o apoio da Fundação Ernst von Siemens e de outros festivais e organismos, entre os quais a Casa da Música. Saunders movimentou-se num registo algo escuro, com o minucioso trabalho tímbrico a que nos tem habituado, resultando numa partitura tendencialmente lenta, generosa em longos glissandos, da qual irrompem, de onde a onde, gestos mais rápidos e enérgicos.

A obra mais antiga (e mais rítmica) da noite, o Duplo Concerto [2002] de Unsuk Chin (1961), foi dada a escutar já após o intervalo, começando com os solistas – piano e percussão – acompanhados pela percussão do tutti. Circulando nervosamente numa harmonia de tons inteiros, a música abre no seu interior pequenas clareiras de sons mais longos em que é possível fruir a qualidade sonora.

O público presente aplaudiu entusiasticamente.

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