O ensino profissionalizante que nos falta

Temos aqui um problema: demasiados jovens não encontram resposta apropriada na atual oferta de ensino secundário.

Por estes dias, celebramos o número considerado excecional de candidatos que se apresentam ao Concurso Nacional de Acesso ao ensino superior, mais de 60.000! A grande maioria são jovens que terminaram o ensino secundário este ano na via científico-humanística. E, contudo, a Sedes propõe que cheguemos aos 60% no ensino profissionalizante. A preocupação é menos com números recorde e mais com percursos educativos que levem as novas gerações a integrar-se no mercado de trabalho e a contribuir para o crescimento que nos tem escapado no último quarto de século.

Considerando os jovens que terminaram o ensino secundário em 2020, temos cerca de 50% da coorte a terminar o ensino secundário pela via científico-humanística (53.144) e 25% pela via profissional (27.205). Há uma fatia importante que seguiu outras vias menos representativas ou não conseguiu terminar. É manifesto que temos aqui um problema: demasiados jovens não encontram resposta apropriada na atual oferta de ensino secundário. Há uma intensa discussão de reformas sucessivas para a via mais académica, mas pouco se sabe dos cursos profissionais e, ainda menos, daqueles a quem nenhuma destas alternativas tem servido.

Um estudo recente do ensino pós-secundário inglês (Relatório Augar) chamou a atenção para o abandono a que está votada a metade dos jovens que opta por não seguir um percurso universitário. O pequeno esforço financeiro estatal com os percursos profissionalizantes a nível secundário e pós-secundário é fiscalmente regressivo, desfavorecendo os mais frágeis social e economicamente. Apesar da forte reação do meio universitário, o governo tomou já algumas pequenas medidas corretivas.

Na Dinamarca, uma decisão recente do governo no sentido de diminuir a oferta de cursos com menor pendor profissional teve também fortes reações.

Portugal tem uma maior taxa de licenciados jovens que vários países de tradição escolar germânica, o mesmo acontecendo em relação a Espanha e França (ver iniciativaeducação.org) sem que isso seja a chave do sucesso económico. É, isso sim, a causa de muita frustração de jovens diplomados que se sentem forçados a emigrar para encontrar um percurso profissional ajustado.

Temos uma sociedade cada vez mais desequilibrada com forte emigração e carência de trabalhadores em muitas áreas. E mantemos perto de 25% da coorte jovem a sair do ensino obrigatório sem objetivos, nem uma formação profissional de utilidade imediata nem o acesso a um percurso de ensino superior. É urgente que a atenção se foque no ensino profissionalizante e encontre percursos para todos os jovens que devem ter objetivos claros aos 18 anos. As empresas têm hoje dificuldade em aceitar aprendizes sem qualquer qualificação e aos 18 anos, e sem experiência de trabalho, é demasiado tarde para muitos jovens aceitarem as poucas alternativas que lhes poderão ser oferecidas. Não haverá pior início de vida adulta do que sair de uma escola onde não se integraram bem para um mundo onde não têm lugar.

Na linha do proposto pelo estudo da Sedes, é tempo de reconstruir o ensino secundário com percursos alternativos para 100% dos nossos jovens.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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