Queixa contra Presidente João Lourenço e os media públicos angolanos por “tratamento desigual”

Acção popular, assinada por 57 membros da sociedade civil, de activistas a padres, passando por jornalistas e actores, reclama da “falta de isenção e tratamento desigual” dos partidos políticos por parte dos órgãos de comunicação do Estado, que dominam o panorama mediático de Angola.

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Luaty Beirão recebido por João Lourenço em 2018, quando o Presidente angolano recebeu uma série de representantes da sociedade civil Ampe Rogério/LUSA

Membros da sociedade civil angolana deram entrada esta sexta-feira a uma acção popular no Tribunal Supremo (TS) angolano contra o Presidente de Angola e os órgãos de informação públicos, pela “falta de isenção e tratamento desigual” dos partidos políticos.

A acção popular, subscrita por 57 membros da sociedade civil, afectos a várias organizações cívicas, foi entregue na sede do TS, em Luanda, por um grupo encabeçado pelo activista Luaty Beirão. Visa o Presidente João Lourenço, a Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana (ERCA), a Televisão Pública de Angola (TPA), a Rádio Nacional de Angola (RNA), o Jornal de Angola e TV Zimbo, esta última, uma antiga estação privada hoje detida pelo Estado angolano.

Para os subscritores da queixa, a comunicação social tem uma responsabilidade acrescida na consolidação da democracia, mas a actuação dos referidos órgãos, sobretudo neste período de eleições é marcada pela “falta de isenção e tratamento desigual” das forças políticas concorrentes. Mais ainda porque o panorama mediático em Angola está dominado pelos órgãos de comunicação social do Estado.

“A petição vem derivada de uma urgência, uma necessidade urgente de ir mais longe do que fazer constatações. Nós estamos dedicados, não apenas o movimento Mudei, mas existem vários cidadãos e grupos de cidadãos que estão muito atentos à forma como a imprensa trata os diferentes actores políticos”, disse à Lusa Luaty Beirão, à saída do TS.

Segundo o activista, o tratamento desigual é acentuado, sobretudo nesta “altura de eleições, entre aspas”, onde “a diferença é tão atroz, é tão gritante” porque “a distribuição do tempo é completamente desigual e viola os preceitos democráticos de um país que ainda não é e o quer ser”.

Alexandra Gamito, outra das subscritoras da acção popular, afirmou que a iniciativa visa “trazer a verdade e discutir a questão publicamente porque é uma situação que preocupa todos nós”.

“Todos nós temos o direito a ter uma informação diversificada, variada e que trate os vários pontos de vista. Nós não podemos estar a ser manipulados por uma única força e sabendo que muitas pessoas dependem exclusivamente dos meios de comunicação públicos”, explicou.

Entre os subscritores da acção, além de Luaty Beirão e Alexandra Gamito, estão os padres Jacinto Pio Wakussanga e Júlio Candeeiro, o médico Luís Bernardino, os jornalistas José Luís Mendonça e Carlos Rosado de Carvalho, a docente Cesaltina Abreu, o escritor Jacques dos Santos e o actor Orlando Sérgio.

Acção simbólica

Luaty Beirão reconhece que se trata de uma acção com “algum simbolismo”, porque “os órgãos de justiça” em Angola estão “completamente asfixiados pelo executivo”.

“Temos a consciência de ser um acto simbólico, mas necessário”, salientou. “Para tentar ou exigir que seja reposta a legalidade, um pouco atrasado, tendo em conta os dias que faltam para as eleições, entre aspas, mas tinha que ser feito e decidimos fazer em conjunto”. As eleições gerais em Angola estão marcadas para 24 de Agosto.

Mesmo que o gesto não mereça da Justiça o tratamento devido, são “as pequenas gotas” que “acabam por encher o copo” e nunca se sabe “qual vai ser a gota que o vai fazer transbordar”. E, enquanto actores da sociedade civil, explicou Luaty Beirão, é a sua “missão”, continuarem “a despejar gotas nesse copo”.

“Se vai ter consequências práticas, o passado diz-nos que não, o passado nos diz que não vai haver consequências disto”, referiu. “Isto vai ficar aí guardado na gaveta até daqui a uns anos se lembrarem” e responderem de forma “completamente desfasada”, com antes aconteceu com providências cautelares que deram entrada nos tribunais.

A actuação “desequilibrada” dos órgãos de informação angolanos, sobretudo públicos, “já beliscou” o actual processo eleitoral, diz Luaty Beirão. “Basta ver como está a opinião pública quando se pergunta sobre a comunicação social. Ninguém liga, ninguém tem confiança. Portanto, isto está completamente beliscado, isto não é um processo eleitoral, isto é um teatro”.

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