Portugal poderia fechar amanhã torneira do gás ou petróleo russo, diz ministro dos Negócios Estrangeiros

MNE destaca “boa base de optimismo” contra divergências no alargamento da Aliança. Admitindo que a guerra se arraste, prevê “derrota estratégica” da Rússia.

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Gomes Cravinho participou na reunião informal dos ministros dos Negócios Estrangeiros da NATO Reuters/MICHELE TANTUSSI

O ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, garantiu este domingo, que Portugal poderia “fechar amanhã a torneira do gás ou do petróleo russo”, quando a União Europeia (UE) tenta negociar um embargo energético à Rússia, acreditando num acordo nas próximas semanas.

“Aquilo que está a dificultar não é nada do campo político, mas sim do campo técnico e económico [porque] há uma assimetria de impacto das sanções. Portugal, por exemplo, não teria nenhuma dificuldade em fechar amanhã a torneira do gás ou do petróleo russo, [mas] outros países têm uma dependência, muito em particular a Hungria, mas também a Eslováquia e a Bulgária têm dificuldades”, declarou João Gomes Cravinho.

Falando no final da reunião informal dos ministros dos Negócios Estrangeiros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO), em Berlim, o chefe da diplomacia portuguesa explicou que “esses países [mais dependentes] pedem apoios, pedem períodos transitórios, pedem que haja, da parte da Comissão Europeia, um investimento forte no desenvolvimento de outras soluções, nomeadamente gasodutos, oleodutos e isso, naturalmente, não se faz de um momento para o outro”.

De acordo com João Gomes Cravinho, ao nível dos Estados-membros, “as discussões continuam, mas o objectivo é partilhado por todos, que é o de cortar a dependência europeia dos combustíveis fósseis vindos da Rússia”.

Já quando questionado sobre prazos para os 27 chegarem a acordo sobre aquele que é o sexto pacote de sanções à Rússia, apresentado pela Comissão Europeia no início de Maio, o governante estimou que, “durante o próximo par de semanas, em princípio, haja soluções que satisfaçam a todos”.

“Estamos todos unidos quanto àquilo que é o objectivo de fundo, que é o de reduzir e eliminar a dependência do petróleo e do gás”, vincou João Gomes Cravinho, rejeitando que este novo pacote de medidas restritivas seja suavizado.

“Qualquer que seja a solução, o pacote terá seguramente um impacto muito significativo para a economia russa e para a capacidade russa de alimentar a sua máquina de guerra”, adiantou João Gomes Cravinho.

Em causa está um sexto e novo pacote de sanções contra Moscovo devido à invasão da Ucrânia, no final de Fevereiro passado, após a Comissão Europeia ter abrangido, no anterior conjunto de medidas restritivas, a proibição da importação de carvão.

O pacote mais recente, apresentado por Bruxelas há duas semanas, prevê uma proibição total de importação de todo o petróleo russo, marítimo e por oleoduto, bruto e refinado, para assim haver uma eliminação gradual da dependência energética europeia face à Rússia, que permita assegurar rotas de abastecimento alternativas e minimizar o impacto nos mercados globais.

“Base de optimismo”

O ministro destacou que existe uma “boa base de optimismo” relativamente à adesão da Finlândia e Suécia à NATO, que permitirá resolver as “questões em aberto”, nomeadamente as divergências apontadas pela Turquia.

“Penso que há uma boa base de optimismo [porque] todos nós estamos conscientes de que divergências que possam existir são sempre pequenas face àquilo que é verdadeiramente importante, que é o reforço da Aliança e o reforço da segurança da Finlândia e da Suécia”, declarou João Gomes Cravinho.

O chefe da diplomacia portuguesa realçou que “a Turquia, a Finlândia e a Suécia estão num processo de diálogo para resolver as divergências”, após Ancara se ter mostrado reticente face ao alargamento da Aliança Atlântica.

“Aquilo que aconteceu hoje foi uma repetição, já entre nós – a 30 [e sem os chefes da diplomacia finlandesa e sueca] –, do apoio fortíssimo em relação à adesão da Finlândia e da Suécia e a própria Turquia diz que tem como objectivo que a Finlândia e a Suécia possam entrar, mas tem algumas preocupações e a Finlândia e a Suécia saberão como resolver as questões em aberto”, adiantou João Gomes Cravinho, em declarações aos jornalistas portugueses.

Para permitir a adesão da Finlândia e da Suécia à NATO, é necessário o aval dos 30 membros da Aliança Atlântica.

Na véspera da reunião na capital alemã, o Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, manifestou-se desfavorável à entrada da Finlândia e da Suécia na NATO, por acolherem militantes curdos que a Turquia considera como terroristas.

Foi a primeira voz dissonante no seio dos 30 aliados a propósito desta matéria.

A entrada de um novo Estado-membro na NATO requer unanimidade, o que significa que a Turquia poderá bloquear a adesão dos dois países escandinavos, cuja candidatura deverá ser formalizada nos próximos dias.

Porém, já no sábado, o porta-voz de Recep Tayyip Erdogan veio garantir que a Turquia “não fecha a porta” à entrada destes dois países nórdicos na Aliança Atlântica.

Na sequência da guerra na Ucrânia, a Finlândia e a Suécia iniciaram um debate sobre a adesão à NATO, que, a concretizar-se, significará o abandono da histórica posição de não-alinhamento dos dois países.

“Derrota estratégica” da Rússia

Gomes Cravinho admitiu que a guerra da Ucrânia se alastre no tempo, embora acreditando numa vitória ucraniana face à “derrota estratégica” da Rússia, causada pelo “gravíssimo erro” do Presidente russo com a invasão.

“Por um lado, tornou-se claro que a Rússia não tem capacidade para conquistar os seus objectivos a curto prazo e sem custos elevadíssimos e isso é positivo, mas por outro lado, sabemos também que a Rússia tem uma capacidade militar que torna extremamente difícil que as forças ucranianas consigam repelir, no curto prazo, forças invasoras da Rússia e, portanto, a nossa expectativa neste momento é que isto pode durar na medida em que nenhuma das partes tem capacidade militar para resolver a situação num prazo curto”, disse João Gomes Cravinho.

O ministro disse acreditar que a Ucrânia possa sagrar-se vencedora da guerra: “Acredito, acredito. Quando falamos de vencer ou perder uma guerra, não são conceitos simples, [porque] pode haver uma situação em que um lado até tem algum ganho territorial, mas a um custo tão elevado que, efectivamente, constitui uma derrota e aquilo que é fundamental é que a Rússia tenha aqui uma derrota estratégica, o que significa que qualquer avanço que possa ter tem um custo tão elevado que nunca o faria se soubesse de antemão o custo.”

De acordo com o ministro português, “também é derrota estratégica se a Rússia não consegue alterar as fronteiras por via da força”. “É, creio que para todos, muito visível que houve aqui um gravíssimo erro” do Presidente russo, Vladimir Putin, disse o ministro, acrescentando: “Um erro de cálculo e também na metodologia escolhida para resolver as dificuldades com a vizinhança, e esse erro paga-se muito caro”.

Reforçando que “a Rússia está a caminho de uma dura derrota estratégica”, o chefe da diplomacia portuguesa adiantou que, depois disso, a NATO “voltará a falar” com Moscovo, “num quadro em que se tornou evidente que não se pode voltar a repetir este tipo de comportamento internacional”.

Assim, a Aliança Atlântica pretende “estabelecer um diálogo com a Rússia”, mas sem “permitir absolutamente qualquer ganho de causa, qualquer tipo de expansão territorial, qualquer tipo de vantagem conquistada pela força” e visando ainda salvaguardar “condições para que os vizinhos da Rússia se sintam absolutamente seguros”, concluiu João Gomes Cravinho.

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