O toque do teu dedo pode derreter um glaciar

Porque a Terra “tem uma voz muito subtil” e muitos não estão sintonizados para ouvir “as suas frequências”, a Hyphen-Labs criou um site para compreendermos o nosso impacto no planeta.

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Glaciar de San Rafael, no Chile EPA/Alberto Valdes

O nosso toque tem impacto no degelo, pondo em causa o futuro do planeta e a sobrevivência humana — e o Insidious Rising surge para o mostrar. Disponível na plataforma Google Arts & Culture Lab, este site vem mostrar os efeitos em cascata que as nossas acções provocam, para lembrar que a crise climática é uma responsabilidade colectiva. Criado pelo colectivo britânico Hyphen-Labs, oferece a interpretação audiovisual dos dados do relatório do IPCC de 2019 e de outros estudos sobre as alterações climáticas.

Em conversa com o P3, as fundadoras do projecto, Carmen Aguilar y Wedge e Ece Tankal, explicam que querem mostrar quão interligado o planeta está com o ser humano, nomeadamente no que toca ao degelo. Assim, durante a experiência no site, contribuímos para o desaparecimento de um glaciar e assistimos às respectivas consequências. “Quando tocas, o dedo está a aquecer o ecrã e a derreter o gelo”, explica Ece Tankal, demonstrando que, mesmo que se sinta de formas diferentes pelo globo, todos vamos sofrer com o degelo. No telemóvel, este efeito é provocado pelo toque do dedo no ecrã, enquanto nos computadores é consequência do clique do rato.

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Com o o toque do dedo, nos dispositivos móveis, ou do rato, nos computadores, o utilizador derrete o glaciar. Insidious Rising

A Hyphen-Labs caracteriza-se por explorar os absurdos e as “narrativas especulativas”, cruzando a tecnologia com a arte. Assim, através de uma atmosfera pesada, tanto visual como auditivamente, retratam o “filme de terror” que “estamos a viver”, diz Ece Tankal. Mas para fugir a um discurso que deixa as pessoas “desamparadas e sem esperança”, aqui o final não é trágico; em vez disso, “conhecemos pessoas que estão a tentar reverter a situação”, completa a artista. Reuniram uma lista de “administradores ambientais” (do termo inglês environmental stewards), pessoas e comunidades que estão na “linha da frente” do combate à crise climática, que Carmen Aguilar y Wedge descreve como “as sementes” que podem inspirar a mudança. Acrescenta que quiseram evidenciar “gerações mais jovens, que vão viver mais tempo e ver como é que o mundo vai ser daqui a 50 anos”.

Um dos objectivos deste projecto é dar palco às comunidades que estão a sentir as mudanças em primeira mão. Por isso, convidaram a artista indígena Allison Akootchook Warden que, além de falar pela causa, dá voz à narrativa e a poemas que complementam a experiência. “A Terra tem uma voz muito subtil; muitos de nós não estão sintonizados e não conseguimos ouvir essas frequências”, diz Carmen Aguilar y Wedge. E acrescenta: “A poesia é realmente a voz dos glaciares, destes [nossos] antepassados, a sair. E a Allison faz parte de uma grande linhagem de indivíduos que têm uma relação com as montanhas, com as águas e com os glaciares”.

Insidious Rising foi desenvolvido para ser “simples o suficiente para um avô e um neto poderem conversar acerca disto” e acessível a qualquer um “com acesso a um teclado”, diz Carmen Aguilar y Wedge. Disponível em todos os dispositivos móveis, faz parte da iniciativa Heartbeat of the Earth, onde vários artistas, em conjunto com a United Nations Framework Convention on Climate Change (UNFCCC), expõem dados científicos sobre o clima de uma forma mais criativa e envolvente.

Texto editado por Ana Maria Henriques

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