Mais de cem mil crianças estão em risco de morrer de fome em Tigré

Os números da subnutrição na região, que foi a mais afectada pela grande fome de 1984, aumentaram dez vezes, segundo estimativa da Unicef. Responsáveis pedem acesso ao local para entrega de ajuda alimentar urgente.

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Refugiados eritreus protestam contra as condições dos campos TIKSA NEGERI/Reuters

A agência das Nações Unidas para a infância (Unicef) disse esta sexta-feira que mais de 100.000 crianças na região de Tigré, Norte da Etiópia, estão em perigo de subnutrição grave com risco de vida nos próximos 12 meses – o que representa um aumento de dez vezes em relação aos números normais no país.

A porta-voz da Unicef, Marixie Mercado, disse ainda que uma em cada duas mulheres grávidas e a amamentar examinadas em Tigré estavam gravemente subnutridas, o que faz aumentar o risco de complicações na gestação e de morte durante o parto.

A região está a ser palco de um conflito entre forças rebeldes regionais (a Frente de Libertação do Povo Tigré) e forças militares da Etiópia e da Eritreia.

“À medida que chegamos a zonas que têm estado inacessíveis por causa do conflito, estão a ser confirmados os nossos piores receios sobre a saúde e bem-estar das crianças”, disse Mercado numa conferência de imprensa em Genebra.

A ONU já tinha alterado antes para o risco da região, que foi já uma das mais afectadas pela grande fome que matou mais de um milhão de pessoas no país em meados da década de 1980, viver uma nova catástrofe. No aviso feito no mês passado a ONU dizia que mais de 350 mil pessoas estavam na fase mais grave fase da escala da insegurança alimentar. O número subiu agora para 400 mil e mais de 90% da população precisa de ajuda alimentar urgente.

Agências no terreno dizem que estão a ficar sem leite de substituição para dar a cerca de 4000 crianças gravemente subnutridas que tratam, em média, por mês.

Marixie Mercado pediu acesso sem condições ao local para poder fazer chegar bens alimentares, apelando às duas partes em conflito que o permitam.

A Reuters esteve no hospital de Wukro, onde viu bebés como Aammanuel Merhawi, de 20 meses, a ser tratados para subnutrição grave. Com um terço do peso que deveria ter depois de a mãe ter ficado sem leite, está a ser alimentado por tubo nasal.

Neste hospital morreram pelo menos três bebés com subnutrição grave, disse a enfermeira Tsehaynesh Gebrehiwot, mostrando os registos: Awet Gebreslassie, quatro meses, 2,6 kg, um terço do peso normal, Robel Gebrezgiher, um ano, 2 kg, menos de um quarto do peso normal, Kisanet Hogus, um ano, 5 kg, pouco mais de metade do peso normal.

No hospital Adigrat, mais a norte, morreram três crianças de subnutrição grave. Médicos nos dois hospitais dizem que antes do conflito, em Novembro, viam, em média, quatro a dez crianças subnutridas. Hoje são mais do dobro.

O acesso humanitário à região foi também pedido pelos Estados Unidos, que insistiram na urgência de um cessar-fogo entre as forças governamentais etíopes e Frente de Libertação do Povo Tigré.

“As partes no conflito na Etiópia devem negociar urgentemente um cessar-fogo sem pré-condições e entrar num diálogo político inclusivo. A retórica inflamada de qualquer uma das partes é contrária a esses objectivos”, disse o porta-voz do Departamento de Estado, Ned Price, através da sua conta na rede social Twitter, acrescentando: “Todas as partes devem garantir o acesso humanitário sem restrições. A electricidade, as telecomunicações e os serviços bancários devem ser restaurados em Tigré.”

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