Para quem não ganha é mais fácil falar

Até ao final do Tour, o PÚBLICO traz histórias e curiosidades sobre a corrida e os ciclistas em prova.

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Guarnieri no chão no Tour 2021 Reuters

Jacopo Guarnieri não é dos ciclistas mais renomados do pelotão da Volta a França. Aos 33 anos, esta é a quinta presença na prova gaulesa e nunca ficou sequer perto do top 100. Não é, portanto, com Guarnieri que se titulam notícias e se definem manchetes. É mau sinal? Desportivamente, sim. Mas há vantagens.

Em 2019, falámos nas Histórias do Tour de Anthony Delaplace, um francês conhecido por “placette [pequena praça/lugar]”, por ficar sempre em lugares de pouco destaque nas etapas.

O italiano Guarnieri vive algo semelhante. Não tem a alcunha mordaz de Delaplace, mas reconhece que o pouco destaque que tem, como domestique, lhe permite ter uma voz activa na sociedade.

Dos 184 corredores que iniciaram o Tour, Guarnieri é o único que tem no perfil do Twitter a bandeira arco-íris de apoio LGBTQ+. Nem mesmo Tao Geoghegan Hart, tão activo na temática – ler aqui e aqui , se presta a tal declaração de interesses.

Tal como Tao Geoghegan Hart, Jacopo Guarnieri – que garante que sofreria de bom grado as consequências de assumir opiniões e posições sociais deste tipo – não abdica da luta pela igualdade de género.

O Cycling Weekly fez recentemente um estudo que aponta a ausência de ciclistas LGBTQ+. Contabilizam que, com três a sete por centro de gays ou bissexuais nos Estados Unidos e Reino Unido, deveria haver entre cinco a 12 corredores LGBTQ+ nesta Volta a França. Assumidos, não há nenhum.

“O pelotão e a família do ciclismo têm de aceitar quando alguém estiver confortável o suficiente para se declarar LGBTQ+. Quando essa porta se abrir será mais fácil para quaisquer outros. E a pessoa que o fizer terá todo o meu apoio. Essa porta nunca mais se poderá fechar”, argumentou. E acrescentou: “As pessoas dizem que este desporto é demasiado duro para um homossexual e isso dá-me vontade de rir. Não tem nada que ver com sexualidade”.

Guarnieri explicou ao mesmo site que é a falta de “voz desportiva” que lhe permite ter esta voz social. “Não sou o chefe-de-fila de uma equipa, por isso diria que estou mais livre para expressar sentimentos e opiniões. Sendo um líder, poderia perder algo como contratos ou patrocínios”, apontou.

Esta é uma das lutas de Jacopo Guarnieri, que crê que só pode tê-la... porque não é ganhador. E talvez isto diga mais sobre o ciclismo, a sociedade e a liberdade de expressão no desporto do que sobre Guarnieri.

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