Covid-19: Segunda vaga na Índia regista maior número de casos diários

O número total de casos confirmados é apenas ultrapassado pelos EUA. Restrições locais começam a ser implementadas para conter os contágios.

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Os crematórios têm trabalhado a "100% da capacidade para cremar os corpos dentro do prazo” FRANCIS MASCARENHAS/Reuters

A Índia registou um novo recorde de mortes por covid-19 e 25.9170 novos casos esta terça-feira, o maior número de casos diários confirmados a nível mundial, segundo a Reuters. Em algumas cidades indianas, o metal dos crematórios começou a derreter devido ao trabalho e à procura constante.

O alerta do ministro da Saúde indiano, no início de Março, de que o país estava na “fase final” da pandemia, não fazia adivinhar que, um mês depois, a situação sanitária se tivesse agravado ao ponto de o sistema de saúde ter chegado “ao seu limite”. Em Nova Deli, quase não há camas nas unidades de cuidados intensivos” e os profissionais estão “a reportar uma imensa falta de oxigénio”, disse Arvind Kejriwal, chefe do governo de Deli, citado pelo New York Times.

O cenário é semelhante por todo o país. Há hospitais a atingir a capacidade máxima, há falta de oxigénio e de outros materiais médicos, e os resultados dos testes à covid-19 estão a demorar dias a ser conhecidos, atrasando a resposta individual ao distanciamento e outras medidas de segurança.

Há uma semana, os cadáveres acumulavam-se no exterior do hospital público em Raipur, no estado de Chhattisgarh, porque os profissionais de saúde não esperavam que “tantas pessoas morressem ao mesmo tempo” de coronavírus e os crematórios não conseguiam responder à procura, refere o Guardian.

Nas grandes cidades, os crematórios têm trabalhado “constantemente a 100% da capacidade para cremar os corpos dentro do prazo”, disse à Reuters Kamlesh Sailor, presidente do fundo que dirige o crematório na cidade de Surat. Devido à procura ininterrupta, partes de metal dos crematórios começaram a derreter, além de se sugerir que o número de mortes pode ser superior ao balanço oficial.

Segunda vaga esmagadora

Na primeira vaga, o número de mortes reportado na Índia – sem distinção entre mortes por covid-19 e outras causas – foi significativamente inferior ao dos EUA. Segundo o New York Times, os especialistas apontaram para o facto de muitos dos países poupados serem mais pobres, com uma população mais jovem, mais resistente pela maior exposição a micróbios e a outros coronavírus, e onde o quotidiano se passa em espaços mais ventilados, onde o SARS-CoV-2 se dissemina com mais dificuldade.

Se essas características se mantêm, o que mudou com a segunda vaga? Segundo o presidente da Fundação de Saúde da Índia, K. Srinath Reddy, em declarações à BBC, o Governo indiano transmitiu uma ideia de “triunfalismo” e disse que a pandemia estava a ser derrotada. Consequentemente, “algumas vozes cautelosas deixaram de ser ouvidas” e as práticas de distanciamento social e o uso de máscara começaram a ser ignoradas.

Realizaram-se eventos superdisseminadores, como campanhas políticas sem indicações dos protocolos de segurança, e outros tipos de encontros sociais, como casamentos e jogos de críquete com mais de 130 mil espectadores, a maioria sem máscara, conta a BBC. Várias imagens nas redes sociais espelham essa realidade: milhares de pessoas juntaram-se em comícios políticos e num festival hindu junto ao rio Ganges.

As mutações do vírus também podem ter um papel importante nos níveis elevados de contágio – nomeadamente a brasileira e a britânica, e uma dupla mutação descoberta na Índia. “A taxa do aumento de casos nesta vaga excede largamente a taxa de crescimento da primeira vaga”, sugerindo que o vírus “é provavelmente mais infeccioso”, disse Gautam Menon, professor de Física e Biologia na Universidade de Ashoka, segundo o diário britânico The Guardian.

Apesar de o país ser o principal produtor mundial de vacinas, o ritmo da vacinação também não tem conseguido competir com o crescimento de casos. Da população de 1,3 mil milhões, apenas 1085 milhões receberam a primeira dose da vacina contra a covid-19, o equivalente a 1,3% da população.

Numa tentativa de acelerar o processo e combater casos de escassez de vacinas, as autoridades de saúde admitiram recorrer à importação das vacinas. Na semana passada, autorizaram a utilização da vacina russa Sputnik V. E, com a crescente crítica, o primeiro-ministro Narendra Modi anunciou a vacinação de pessoas com mais 18 anos a partir de 1 de Maio.

Juntamente com as restrições aplicadas localmente, as autoridades indianas esperam atenuar os efeitos da segunda vaga e evitar uma “grande tragédia”, nas palavras do chefe do executivo de Deli. Com alguma resistência, devido aos efeitos económicos do anterior confinamento, várias cidades encerraram o comércio e impuseram restrições nos encontros sociais.

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