Somos professores. Não desistimos

É preciso garantir as condições essenciais para que todos possam ver e ouvir os seus professores. É preciso garantir que nenhuma criança ou adolescente fica sem uma refeição. É preciso estar atento a sinais de violência e de abuso.

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Adriano Miranda

Jamais ousem dizer que os professores querem ir para casa descansar. O ensino à distância é mais difícil, penoso, duro e ingrato do que o ensino presencial. Os professores que trabalham pouco em casa são, provavelmente, os que trabalham pouco na escola. Ou, por outro lado, são aqueles que estão exaustos, aqueles que não dominam as tecnologias, aqueles que, simplesmente, não se conseguem adaptar. Ninguém estava preparado para isto. Ninguém.

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Jamais ousem dizer que os professores querem ir para casa descansar. O ensino à distância é mais difícil, penoso, duro e ingrato do que o ensino presencial. Os professores que trabalham pouco em casa são, provavelmente, os que trabalham pouco na escola. Ou, por outro lado, são aqueles que estão exaustos, aqueles que não dominam as tecnologias, aqueles que, simplesmente, não se conseguem adaptar. Ninguém estava preparado para isto. Ninguém.

Apesar de todas as dificuldades, em março de 2020 começamos a ensinar à distância. Muitos desafios, muitas incertezas, muitas preocupações. Não desistimos. Alguns de nós regressaram mais cedo para preparar os alunos para os exames nacionais ou para acompanhar os mais pequenos. Os restantes permaneceram em casa. Em setembro, regressamos todos à escola, alicerçados numa nova esperança: a vacina, o fim da pandemia. Regressamos de máscara na face e álcool gel na mão. Desinfectamos teclados, secretárias, cadeiras. Estamos distantes, mas estamos presentes. Continuamos a dar aulas. Não desistimos.

Neste momento, nós, professores, não estamos na “linha da frente” de nada, na linha da frente estão aqueles que, agora, decidem quem morre ou vive, os que cuidam, os que curam – os profissionais de saúde. Mas temos feito um bom trabalho. Temo-nos adaptado e readaptado. Damos o nosso melhor. Diariamente, damos aulas “em direto” para as casas de muitos alunos, expondo as nossas fragilidades (e as fragilidades de qualquer dia de aula). Tentamos que a aprendizagem, ainda que condicionada, seja significativa. Não desistimos. Tão depressa estamos a dar uma aula presencial a uma turma inteira como, no tempo seguinte, a dar uma aula mista, com alunos na sala e alunos em casa. Há colegas que, mesmo estando infetados, querem continuar a ensinar “de casa para a escola”. Gerimos medos, confortamos, sofremos por não podermos abraçar os nossos alunos. Não desistimos. Andamos de máscara o tempo todo e não nos queixamos. Também temos família em casa, temos colegas que pertencem a grupos de risco. Também temos medo. Mas não desistimos. 

Não há dúvidas de que o ensino presencial é melhor para todos, particularmente para os mais pobres e frágeis, para aqueles que estiveram meses sem aulas, por falta de recursos. O perigo não está nas lacunas de aprendizagem... O perigo reside na fome, na pobreza, na violência, na ausência. É preciso garantir as condições essenciais para que todos possam ver e ouvir os seus professores. É preciso garantir que nenhuma criança ou adolescente fica sem uma refeição. É preciso estar atento a sinais de violência e de abuso. Facilmente se “recuperam aprendizagens”. Recuperar de um cenário de violência ou de um contexto disfuncional é bem mais doloroso e complexo.

Não queríamos, mas, os nossos alunos tiveram de ir para casa. Acreditamos, apenas, que será por um bem maior. E, tenho a certeza absoluta de que, independentemente das circunstâncias, estaremos dispostos a fazer o melhor possível por aqueles que nos são confiados. Como sempre.

Não desistimos. 

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.