Tribunal condena saudita defensora do direito de as mulheres conduzirem

Com parte da pena suspensa, os cinco anos e oito meses de prisão da sentença agora conhecida estão prestes a terminar. Loujain al-Hathloul, na cadeia desde Maio de 2018, deve ser libertada no fim de Fevereiro.

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Protesto da Amnistia Internacional junto à embaixada de Riad em Paris a pedir a libertação de três activistas sauditas, incluindo Hathloul BENOIT TESSIER/Reuters

A activista dos direitos das mulheres Loujain al-Hathloul foi condenada a cinco anos e oito meses de prisão por um tribunal saudita especializado em crimes de terrorismo. Hathloul, com 31 anos, está detida desde Maio 2018, quando o regime de Riad prendeu várias mulheres conhecidas pela sua luta pelo direito de conduzir – semanas depois, chegava o dia histórico em que as sauditas ganhavam o direito a conduzir nas estradas do seu país.

O tribunal suspendeu de imediato dois anos e dez meses da pena, o que somando aos dois anos e sete meses que Hathloul já cumpriu indica que será libertada em menos de três meses. Segundo a sua família, é precisamente isso que vai acontecer, com a libertação prevista para o fim de Fevereiro. Segue-se uma proibição de viajar de cinco anos.

Só no início de Dezembro é que a activista dos direitos das mulheres soube que era acusada de estar em contacto com Estados “hostis ao reino” e de “ter fornecido informações classificadas como secretas”, acusações que peritos das Nações Unidas têm descrito como “espúrias”. Segundo o site de notícias Sabq, foi condenada por “diversas actividades proibidas pela lei antiterrorismo”.

“As acusações contra Loujain não mencionam nenhum contacto com Estados ‘hostis’. Citam explicitamente contactos com a União Europeia, o Reino Unido e os Países Baixos. Alguma vez a Arábia Saudita os considera inimigos?”, questionou a irmã da activista, Lina al-Hathloul, quando se conheceram as acusações. “Também não mencionam nada sobre informações sensíveis, só evocam o seu activismo. É acusada de ter falado da situação dos direitos humanos na Arábia Saudita em conferências internacionais e com organizações não governamentais.”

Elizabeth Broderick, presidente do grupo de trabalho da ONU sobre discriminação contra mulheres e meninas, pediu a libertação imediata de Hathloul, que diz ter sido julgada “por exercer os seus direitos fundamentais à liberdade de expressão, reunião pacífica e associação”.

O ano passado, a Amnistia Internacional denunciou que tinha sido torturada e alvo de assédio sexual na prisão.

Uma das mais conhecidas defensoras do direito das sauditas a conduzir, Hathloul já tinha passado 73 dias na prisão, em 2014, depois de ter tentado entrar na Arábia Saudita a conduzir vinda dos Emirados Árabes Unidos. Na altura, estudava Sociologia na Universidade Sorbonne de Abu Dhabi e tinha uma carta de condução válida em todos os países do Conselho de Cooperação do Golfo, a organização de países regional que a Arábia Saudita integra.

Então com 25 anos, Hathloul já tinha participado numa campanha contra a proibição, em 2013, publicando um vídeo no Youtube em que conduzia desde sua casa até ao aeroporto da capital saudita, assim como outro em que surgia de rosto e cabelos descobertos, num desafio aos religiosos ultraconservadores do reino.

Quando as sauditas ganharam finalmente o direito a conduzir, em Junho de 2018, quase nenhuma das que tinham lutado por esse direito pôde festejar ou sequer falar sobre isso. Ou estavam detidas, como Hathloul e outras, ou tinha-lhes sido ordenado que ficassem em silêncio para não arriscarem a prisão.

Alguns justificaram essas detenções com a necessidade de Mohammad bin Salman, o príncipe herdeiro, apaziguar os religiosos wahabitas, mas muitos viram também uma mensagem destinada às sauditas, uma forma de sublinhar quem foram os homens a dar-lhes a liberdade de conduzir e não elas a conquistá-la. “Mostra a misoginia do sistema”, disse na altura ao PÚBLICO Hana al-Khamri, escritora e analista saudita. “Nada ameaça a existência do regime autoritário saudita tanto como permitir que as pessoas acreditem que a mudança vem de baixo e acontece graças às mulheres que por ela lutam desde 1990.”

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