“Não houve medo no meu coração”: o relato do manifestante solitário que enfrentou a polícia tailandesa

Anurak Jeantawanich, de 52 anos, enfrentou sozinho fileiras de polícias de intervenção tailandesa que combatiam um protesto anti-Governo.

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Jorge Silva/Reuters

De cabeça para baixo e braços estendidos, um homem empurra, com toda a força, os escudos de várias fileiras de elementos da polícia de intervenção tailandesa.

A fotografia da Reuters — tirada na noite de 16 de Outubro, quando a polícia tentou usar a força para dispersar os manifestantes — tornou-se numa das imagens mais publicadas dos meses de protestos para a destituição do Governo e para reformas ao poder da monarquia na Tailândia.

Para o homem na fotografia, Anurak Jeantawanich, de 52 anos, foi o momento em que tentou travar a polícia. “Senti o perigo a aproximar-se”, disse à Reuters.

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Jorge Silva/Reuters

Tendo testemunhado a repressão sangrenta dos protestos anti-poder instaurado dos “camisas vermelhas” há uma década, tem mais experiência do que muitos dos jovens manifestantes ao lado dos quais se agachou para enfrentar a polícia de intervenção e os canhões de água, por detrás de uma parede de guarda-chuvas coloridos.

Anurak ouviu a polícia a fazer contagem decrescente. Quando a contagem chegou aos três, ergueu-se para os enfrentar. “Olhei cada um deles nos olhos e disse-lhes para não se aproximarem mais porque havia muitos jovens estudantes e raparigas”, contou.

Segundos depois, a polícia começou a disparar o que foi descrito como “água com químicos que causam irritação na pele”, que passou por cima da cabeça dele e atingiu os manifestantes na sua rectaguarda.

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“Corri para os empurrar,” explicou Anurak. “Não houve medo no meu coração. Se a minha filha estava atrás de mim, também lá estavam filhos e filhas de outras pessoas.”

A polícia empurrou-o e Anurak caiu para trás. Descreveu ter sido levantado pelos pés e “feito crowdsurfing, como nos concertos”, pela multidão de polícias, antes de ser algemado e detido numa carrinha da polícia.

De dentro do veículo ouviu os canhões de água a serem disparados e os gritos dos manifestantes, alguns dos quais se dispersaram antes de o protesto ter sido interrompido.

Um porta-voz da polícia tailandesa disse que a polícia de intervenção apenas usou métodos internacionalmente aceitáveis para combater o protesto.

As imagens dessa noite aumentaram a fúria e causaram protestos ainda maiores, até que o primeiro-ministro, Prayuth Chan-ocha, no último fim-de-semana, ordenou o fim das medidas de emergência que tinha imposto no dia 15 de Outubro.

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Jorge Silva/Reuters

Anurak, um activista que vende t-shirts políticas e outros produtos, esteve entre os manifestantes presos por violarem as medidas de emergência. Passou uma noite numa unidade de polícia regional até o tribunal ter rejeitado a petição da polícia para o manter detido.

Afirmou que não hesitaria em fazer o mesmo novamente. “Se tivesse de arriscar a minha vida para proteger jovens e para vencer, fá-lo-ia. Valeria a pena.”