Do visto gold à acusação de homicídio — os negócios do empresário acusado de despejar inquilinos com fogo

O empresário, de nacionalidade chinesa, que terá ateado fogo para despejar inquilinos da Baixa do Porto, está acusado e pronunciado por seis crimes de homicídio qualificado, dois de incêndio, um de extorsão tentada e outro de branqueamento de capitais.

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Paulo Pimenta

Além do prédio da Baixa do Porto ao qual terá mandado atear fogo, originando a morte de um dos inquilinos, Chenglong Li, o empresário chinês, que desde a semana passada a está a ser julgado por seis crimes de homicídio qualificado (um consumado e cinco tentados), dois incêndios (um consumado e outro tentado), um de extorsão tentada e outro de branqueamento de capitais, foi confrontado sobre outros negócios em que se envolveu a título pessoal e por via da sua empresa Alvoradoásis - Unipessoal, Lda.

O primeiro negócio de todos deu-lhe acesso a visto gold. Em 2016, o investimento de 500 mil euros na compra de quatro lojas do Leiria Plaza deu-lhe entrada directa como residente em Portugal e na Europa pelo período de cinco anos. Este foi o primeiro investimento em território nacional, ainda a título privado. Acabaria por ser o primeiro investimento já através da empresa que o levaria à prisão preventiva e a arriscar a pena máxima.

Em três anos, o seu património e o da empresa foi crescendo. Na segunda sessão de julgamento, nesta terça-feira no Auditório Municipal de Vila Nova de Gaia, depois de ser transferido do Tribunal Criminal de São João Novo, onde decorreu a primeira sessão na semana passada, o investidor foi questionado sobre outros investimentos. Por explicar estão algumas transacções feitas para a China, de dinheiros que resultam de negócios do empresário de pouco mais de trinta anos de idade acusado de ter morto um inquilino no prédio, ao qual terá mandado atear fogo para o desocupar antes de assinar a escritura da venda do mesmo.

A título individual, comprou em 2016 as quatro lojas do shopping Plaza Leiria, uma casa na Avenida de Beira-Mar, em Vila Nova de Gaia, em 2017, e um apartamento no Campo Grande, em Lisboa. Com a empresa Alvoradoásis, além do prédio que ardeu perto do mercado do Bolhão, comprado em 2016, adquiriu ainda, segundo o próprio, uma garagem na Avenida da República, em Gaia, em 2018, por quatro mil euros, e um terreno por 22 mil euros, na mesma avenida onde comprou a casa de Gaia, onde tem morada fiscal.

Perante a juíza, Chenglong Li diz ter criado a empresa para a compra do prédio e para futuros investimentos. Tanto este imóvel como as quatro lojas de Leiria foram adquiridos sem acesso a crédito bancário. Só para as casas de Gaia e de Lisboa é que recorreu à banca, segundo afirma em tribunal.

Para o primeiro investimento, que lhe valeu o visto gold, recorreu a empréstimo do pai, que lhe terá disponibilizado 500 mil euros. Esse valor terá sido devolvido anos mais tarde em transferências realizadas a partir da sua conta pessoal para a China já quando estava preso preventivamente. Mas o dinheiro que foi parar à sua conta do Millenium BCP, o único banco onde diz ter conta em Portugal, terá sido transferido dos cofres da sua empresa. O investidor explica esse movimento bancário com a justificação de que teria passado dinheiro da sua conta pessoal para a Alvarodoásis e agora estava a recuperá-lo.

Transferências para a mãe e para a sogra<_o3a_p>

Fica por explicar o motivo pelo qual o valor dessa transferência, cerca de 600 mil euros, mais 100 mil euros do que o valor adiantado inicialmente pelo pai, foi feita para as contas da mãe e da sogra. Mas há mais dúvidas levantadas em diferentes estâncias. Uma delas é a circunstância de o arguido não ter sido interpelado pelo banco para justificar as transferências tendo em conta o montante elevado das mesmas, sendo que o empresário está a pagar créditos de dinheiro que pediu à banca para comprar as casas. O investidor garante não ter sido contactado pelo BCP para qualquer justificação. Adiantou ainda ter acesso a um cartão de crédito Prestige, mas questionado durante a sessão negou estar vinculado ao Private Banking do Millennium BCP, uma sala privada de atendimento personalizado e confidencialidade absoluta. Negou ainda ter contas em paraísos fiscais, adiantando que, além da conta que tem no banco português, tem mais três – em Macau, China e Canadá.

Quanto aos créditos bancários que contraiu no BCP, diz estar a pagá-los com o rendimento que aufere do arrendamento das lojas de Leiria. Pela casa de Gaia paga ao banco 600 euros mensais. Pela de Lisboa desembolsa 400 euros todos os meses. Na sessão desta terça-feira adianta receber por três lojas do shopping Plaza 1200 por mês e por uma quarta 5 mil euros por ano. A esse valor é descontado 28% que vai para o Estado.

Encontros em espaços nocturnos<_o3a_p>

Quanto à relação que tinha com outros três arguidos portugueses acusados de extorsão e de terem sido contratados para atear o fogo no prédio que matou um dos inquilinos, continua a afirmar estar relacionada com uma parceria noutro investimento que estaria na calha na Baixa do Porto. Afirma que todos os encontros que teve com os mesmos foram profissionais, tendo um tido lugar no Tamariz, espaço nocturno do Porto onde estiveram até às cinco da manhã, tendo sido a conta, no valor de 3700 mil euros, assegurada pelo principal arguido, como confirma o próprio perante a juíza.

O julgamento do empresário acusado de homicídio e fogo posto no prédio do Porto do qual era proprietário começou na quarta-feira passada. Há mais quatro arguidos no processo - três de nacionalidade portuguesa respondem por crimes de homicídio consumado ou tentado e extorsão. A esposa do dono do imóvel e a empresa de ambos são acusados de branqueamento de capitais.

Chenglong Li terá mandado atear fogo a um prédio do qual era proprietário, adquirido em Dezembro 2016 na Baixa do Porto na zona do Bolhão por 625 mil euros. A a 28 de Novembro de 2018 assinou contrato promessa de compra e venda (CPCV) para o vender a novo proprietário. A escritura estava marcada para 31 de Maio de 2019, com a garantia de que o prédio estaria livre de pessoas e bens. O empresário terá negociado com os inquilinos do terceiro piso para abandonarem o imóvel, tendo chegado a oferecer o máximo de 40 mil euros. Mas a família não aceitou o acordo. 

A 2 de Março de 2019 deflagra um incêndio no imóvel que deu origem à morte de um dos inquilinos. Recorde-se que este foi o segundo incêndio no prédio do número 100 da Rua Alexandre Braga. O primeiro foi em Fevereiro do mesmo ano. Os dois fogos terão deflagrado a mando do proprietário do imóvel para conseguir esvaziar o edifício onde ainda residia a família, no terceiro piso. Se até ao fim do Maio o prédio não estivesse desocupado, o sinal do CPCV, cerca de 200 mil euros, seria devolvido a dobrar ao comprador interessado, representando prejuízo. Se o vendesse o investimento duplicaria para cerca de 1,2 milhões de euros. Chenglong Li acabou por vender o imóvel já quando se encontrava em prisão preventiva.<_o3a_p>

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