Chega e Iniciativa Liberal – partidos ascendentes no quadro político português

A grande novidade da sondagem do CESOP é aparecer militância tão forte à direita, indícios de que os crescimentos de Chega e Iniciativa Liberal vieram para ficar.

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André Ventura (à esquerda) e João Cotrim de Figueiredo Miguel Manso/DR

Os dados da sondagem do CESOP – Universidade Católica Portuguesa para o PÚBLICO e para a RTP, publicada no dia 23 de julho, trouxeram informação relevante sobre a implantação dos partidos mais recentes no Parlamento. A observação do trabalho parlamentar e político dos três novos partidos – Livre, Chega e Iniciativa Liberal (IL) – já permitiria antecipar alguns resultados que os dados desta sondagem confirmam. Desde logo, a implosão e desaparecimento do Livre, o que aliás nos deixa sem qualquer dado para análise deste fenómeno, para além da omissão de intenção de voto na sondagem. Já sobre o Chega e a IL, gostaríamos de salientar alguns pontos que nos parecem relevantes e para os quais pensamos poder trazer algum esclarecimento.

Muito se tem falado de transferência de voto. Será uma transferência direta de um partido para outro ou há um estágio intermédio na abstenção? Esta questão é especialmente relevante para partidos recentes, sem um historial eleitoral que nos permita maior segurança nas projeções, e, ainda assim, nas sondagens recentes, com crescimentos estimados significativos, com particular destaque para o Chega, que com 7% nas estimativas de resultados eleitorais da sondagem de julho quintuplicaria em nove meses o resultado eleitoral de 2019. De onde vêm as pessoas que agora votariam no Chega e que não o fizeram em 2019? A dimensão da amostra utilizada não permite o rigor necessário para expormos aqui as exatas proporções, mas é suficiente para indicar que os potenciais novos votantes no Chega são pessoas que em 2019 votaram PSD, PS ou abstiveram-se. Já o crescimento da Iniciativa Liberal parece alimentar-se essencialmente de eleitores no PSD, CDS e votos brancos e nulos e abstencionistas.

Mesmo sem as proporções exatas destes efeitos de transferências, podemos apresentar alguns padrões: para os dois partidos, o crescimento do eleitorado tem acontecido essencialmente através da transferência de anteriores eleitores de outros partidos, com o Chega a ter maior capacidade de penetração até ao PS. A IL fica mais perto do eleitorado da direita. Já os abstencionistas de 2019, embora também contribuindo para o crescimento de Chega e IL, estão longe de serem o principal motor de potencial crescimento eleitoral destes partidos.

Na identificação de quem são os eleitores destes partidos vale a pena uma análise mais detalhada do perfil dos inquiridos, embora exatas conclusões sejam impossíveis em face da significância estatística. Não obstante, cingindo a sondagem a perfis demográficos e sociais, há algumas conclusões que se podem tirar com algum rigor: por exemplo, analisando os resultados da sondagem apenas a partir das respostas de mulheres, o Chega baixa de 7% a nível global para 4% e os 3% globais da IL quase desaparecem para menos de 1%. Se nos cingirmos, por outro lado, somente aos homens, o Chega é destacadamente o 3.º partido, com 10%, e a IL apanha o Bloco no 4.º lugar, com 6%. Daqui se conclui que os eleitorados destes dois partidos (Chega e IL) são, neste momento, predominantemente masculinos.

O perfil etário destes eleitorados também é muitíssimo interessante, com o Chega inexpressivo na camada etária mais jovem (18-24) e a IL a alcançar aí o seu melhor resultado. A IL cai bastante nas faixas etárias mais avançadas, sendo inexpressivo na população mais idosa. O Chega destaca-se nas faixas etárias entre os 25 e os 54 anos, tendo uma penetração bastante menor nas faixas etárias acima dos 55 anos.

Um último nível de análise social do eleitorado prende-se com os resultados por grau de instrução, com a IL a crescer à medida que o grau de instrução aumenta, de inexpressivo (abaixo de 1%) no eleitorado sem o 9.º ano de escolaridade a 6% entre o eleitorado com ensino superior. O Chega tem um resultado mais fraco no eleitorado sem o 9.º ano de escolaridade, com 3%. O seu resultado mais forte está na população que terminou o ensino secundário, com 12%, e cai para o nível da IL (6%) no eleitorado com ensino superior.

Em síntese, com base nos dados desta sondagem, ficamos com a imagem do eleitorado do Chega como sendo maioritariamente masculino, entre os 25 e os 54 anos, e com o ensino secundário, enquanto que o eleitorado da Iniciativa Liberal é maioritariamente masculino, jovem adulto e com ensino superior.

A nossa sondagem de julho trouxe ainda um outro dado que ajuda a compreender a solidez do crescimento destes dois partidos. Perguntava-se aos inquiridos se, em seu entender, algum partido da oposição faria melhor se estivesse a governar. Vinte e um por cento dos inquiridos responderam que sim e este resultado nada tem de importante ou surpreendente. Esclarecedor é o resultado do cruzamento das respostas a esta pergunta com a intenção de voto dos inquiridos. Esta percentagem de respostas “sim” varia consideravelmente em função da escolha partidária do inquirido. E se não se estranha que sejam poucos os eleitores PS a responderem que outro partido faria melhor, já se pode considerar ilustrativo dos diferentes níveis de confiança em alternativas governativas as respostas dos eleitores de outros partidos. Devido à reduzida dimensão de alguns dos subgrupos amostrais resultantes desta análise cruzada, não poderemos tomar as percentagens indicadas no gráfico como de enorme exatidão. Apesar disso, as diferenças de resposta entre os diferentes eleitorados indicam que apenas entre os eleitores do Chega ou da Iniciativa Liberal se encontram maiorias apontando que haveria melhor alternativa ao PS. E isto é um claro sinal de confiança dos eleitores destes partidos nas alternativas que estes representam.

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Este é sobretudo um forte indicador de militância, que usualmente encontrávamos no eleitorado de esquerda. Previsivelmente no passado, no eleitorado da CDU ou do Bloco, mesmo durante governos do PS, estes valores deveriam ser semelhantes aos que encontramos hoje no Chega e na IL. Encontrarmos 58% do eleitorado do Bloco e 74% do da CDU a acharem que nenhum outro partido (nem mesmo o seu) conseguiria fazer melhor que o PS é, para partidos assentes em militância forte, um sinal de situacionismo e/ou de desmobilização. Já à direita, esta desmobilização caracterizava sobretudo o CDS e está, aliás, exponenciada nesta sondagem para níveis anormais (86% do eleitorado do CDS acha que ninguém faria melhor que o PS no Governo).

Novidade, novidade é aparecer militância tão forte à direita, indícios de que os crescimentos de Chega e Iniciativa Liberal vieram para ficar.

CESOP – Centro de Estudos e Sondagens de Opinião da Universidade Católica Portuguesa

Os autores escrevem segundo o novo acordo ortográfico​

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