Covid-19: Supremo Tribunal proíbe acções policiais em favelas do Rio de Janeiro

Decisão foi tomada após o PSB questionar a política de segurança pública do governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, e de o acusar de estimular o conflito armado, e de alguns assassínios terem indignado o país.

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Protesto frente ao Palácio da Guanabara, no Rio de Janeiro, contra a violência policial e a política do governador Wilson Witzel Reuters/PILAR OLIVARES

O Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro determinou a suspensão de operações policiais em favelas do Rio de Janeiro durante a pandemia da covid-19, salvo em casos absolutamente excepcionais.

A decisão assinada pelo juiz Edson Fachin não torna explícito quais podem ser essas situações excepcionais, mas diz que “devem ser devidamente justificadas por escrito pela autoridade competente e comunicadas ao Ministério Público estadual, órgão responsável pelo controlo externo da actividade policial”.

Esta decisão foi tomada após o Partido Socialista Brasileiro (PSB) questionar a política de segurança pública do governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, e de o acusar de estimular o conflito armado, acabando por expor “os moradores de áreas conflagradas a profundas violações de seus direitos fundamentais”.

Durante o mês de Maio, entre os vários mortos relacionados com operações policiais, duas crianças foram mortas durante operações policiais em favelas, no Morro do Salgueiro, em São Gonçalo, e no Morro da Providência, no Centro. Mencionaram o caso de João Pedro Mattos Pinto, assim como uma acção em Maio da polícia que fez mais de dez mortos numa favela.

Em São Gonçalo, um rapaz de 14 anos foi baleado dentro de casa, durante operação das polícias Federal e Civil que se teria como objectivo neutralizar o tráfico de droga. Mas o caso teve uma enorme repercussão a nível nacional, pois o adolescente foi atingido com cerca de 7o tiros. Uma deputada da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro denunciou o caso às Nações Unidas e à Organização de Estados Americanos.

A 20 de Maio, as organizações Amnistia Internacional, Justiça Global e Coletivo Papo Reto criticaram as operações policiais conduzidas durante a pandemia no Brasil, exigindo explicações às autoridades do Rio de Janeiro, um dos estados mais afectados pela violência policial.

“Nada justifica que uma criança de 14 anos seja alvejada mais de 70 vezes. O facto é indicativo, por si só, que, mantido o actual quadro normativo, nada será feito para diminuir a letalidade policial, um estado de coisas que em nada respeita a Constituição”, escreveu o juiz Fachin.

Os factos recentes tornam ainda mais preocupantes as notícias sobre a actuação armada do estado do Rio de Janeiro nas comunidades do Rio de Janeiro. “Nesses casos, deverão ser adoptados cuidados para não colocar em risco ainda maior a população, a prestação de serviços públicos sanitários e o desempenho de actividades de ajuda humanitária”, acrescentou o juiz.

As operações policiais têm sido duramente criticadas por se realizarem num momento em que os moradores permanecem mais tempo nas favelas, devido ao isolamento social recomendado pelas autoridades sanitárias face à covid-19, ficando mais vulneráveis aos confrontos entre polícia e gangues.

Além disso, também actividades de assistência social ficam comprometidas com as acções policiais, como a distribuição de produtos de higiene e alimentação. Algumas pessoas foram mortas quando aguardavam a distribuição de auxílios.

Só de Janeiro a Março, a polícia matou 429 pessoas durante operações no estado brasileiro do Rio de Janeiro, mesmo assim uma queda de 1,6% em relação ao mesmo período do ano passado. Os homicídios também diminuíram, caindo 0,9% neste ano, para 1044 vítimas. 

Na avaliação da Amnistia Internacional, as operações policiais “custam caro aos cofres públicos, não ajudam a concretizar objectivos de segurança pública e são ineficazes para fragilizar o tráfico de drogas”.

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