Luta Livre são novas canções de intervenção pela mão de Luís Varatojo

O músico que esteve na génese de Peste & Sida e A Naifa verte a leitura diária dos media em música que comenta a realidade de todos os dias, a desigualdade social, as injustiças, a desinformação. Política, Ninguém quer saber e Iniquidade revelam também o crescente interesse de Varatojo pelo jazz.

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Nas novas canções, Luís Varatojo toca vários instrumentos e interpreta os textos em jeito spoken word DR

A realidade de todos os dias, a desigualdade social, as injustiças, a desinformação, e um interesse crescente pelo jazz são a matéria-prima para Luta Livre, um novo projecto de Luís Varatojo.

O músico, que esteve na génese de, entre outros, Peste & Sida e A Naifa, contou à agência Lusa que tem estado a editar canções novas, a um ritmo quase mensal, que resultam de um olhar interventivo da actualidade. “De há um ano para cá, comecei a escrever alguns textos sobre notícias que ia lendo no jornal, fui acumulando esses textos e ao mesmo tempo comecei ia fazer uns instrumentais com base em samples que fui fazendo em discos de jazz. Juntei uma coisa à outra para ver o que dava”, explicou.

O resultado são os temas Política, Ninguém quer saber e Iniquidade, lançados apenas em digital entre Fevereiro e Maio, acompanhados de vídeos em animação. Nos temas, Luís Varatojo toca vários instrumentos e interpreta os textos em jeito spoken word, e convoca outros músicos, sempre que a composição o justifica, tendo convidado, para já, nomes como os saxofonistas Edgar Caramelo e Ricardo Toscano e o Coro Gospel Collective.

Depois há um “corta e cola” de excertos que encontra em discos de jazz, que tem comprado sobretudo na última década, e que o fizeram redescobrir Miles Davis, John Coltrane ou Thelonious Monk, apesar de ainda se considerar um “ouvinte e executante de rock”.

O carácter interventivo do projecto sobressai nas letras e reflecte aquilo que Luís Varatojo interpreta da realidade que lhe chega, sobretudo pela rotina diária de leitura dos media. “Dou a volta por vários meios e de vez em quando tiro alguns apontamentos e alguns dão um texto, uma história, outros não”, explicou.

Em Política, o primeiro tema divulgado, Luís Varatojo fala sobre populismos e repete “Associações, sindicatos e partidos/ as classes dominantes têm horror aos colectivos”. Em Ninguém quer saber elenca algumas notícias falsas que encontrou na Internet e em Iniquidade recorda “Algo está mal quando os 40 mais ricos têm mais que os 2 biliões mais pobres/ Batemos no fundo e batemos recordes/ Um novo multimilionário dia sim, dia não”.

Para Luís Varatojo, este tempo de pandemia, que teve um impacto profundo a nível global, confirmou aquilo que escreveu há uns meses para as canções de Luta Livre. “Os assuntos são os mesmos, iniquidade, as notícias falsas, a falta de interesse das pessoas em questões políticas verdadeiras, da cidadania. Acabo por confirmar que [esses temas] acabaram por ficar mais presentes, mais visíveis”, disse.

Ter um estúdio em casa e a vivência das últimas semanas em recolhimento social permitiram-lhe trabalhar em pelo menos mais dois temas, que irá revelar nos próximos meses. Pondera a edição de um álbum. “O plano não era fazer um disco, mas pode chegar a ser, sou capaz de as reunir. Não é pelo mercado, porque não se vendem discos (...) É uma forma de o trabalho ficar fixado fisicamente e não se perder nos confins da Internet para todo o sempre”, referiu.

Sem concertos para os próximos meses, tal como milhares de outros músicos e artistas com actividade suspensa por causa da covid-19, Luís Varatojo só lamenta que esta pandemia tenha confirmado a precariedade e invisibilidade de quem trabalha no sector cultural. “Não temos um estatuto, não existimos para a sociedade, e agora com a pandemia isto vem ao de cima. Todas estas pessoas que andavam a pagar a renda com os concertos e o trabalho que faziam, não podem pagar a renda e ir ao supermercado e o Governo não deu uma resposta eficiente”, lamentou.

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