A pandemia pode trazer de volta ao Japão uma velha inimiga: a deflação

Com a ajuda da queda dos preços do petróleo e a pressão exercida por uma economia em forte contracção, a taxa de inflação no Japão voltou a terreno negativo em Abril. Novas medidas de estímulo estão já a ser pedidas.

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Shinzo Abe, primeiro ministro japonês Reuters/KYODO

Pela primeira vez nos últimos três anos, os preços no Japão registaram no passado mês de Abril uma descida em relação ao período homólogo do ano anterior. Uma notícia que, à primeira vista, até pode parecer um motivo de satisfação para os consumidores, mas que representa, no caso da economia japonesa, o regresso de uma das principais preocupações das últimas décadas.

Desde os anos 90 do século passado que o Japão tenta evitar, quase de forma ininterrupta e várias vezes sem sucesso, o risco de cair na armadilha da deflação um fenómeno económico que consiste numa descida persistente dos preços dos bens e dos serviços e que conduz, por causa da alteração de expectativas dos agentes económicos, ao adiamento de decisões de consumo e de investimento que colocam a economia num estado de estagnação.

Agora, ao fim do período longo de tempo em que a ameaça da deflação esteve mais afastada, o perigo regressa. Em Abril, a taxa de inflação homóloga foi de 0,1%, uma descida acentuada face à variação positiva de 0,4% registada em Março.

É verdade que parte da descida agora registada deve-se ao efeito da quebra do preço do petróleo nos mercados internacionais. Se fosse apenas isso, haveria razões para pensar que a taxa de inflação negativa seria temporária. Mas o problema é que a queda do preço do petróleo pode acentuar a pressão deflacionista que, em simultâneo, está a ser exercida pela contracção da economia provocada pela pandemia.

Os dois efeitos em simultâneo podem lançar a economia japonesa na armadilha da deflação e as autoridades do país já perceberam que isso as obriga, tal como fizeram no passado, a adoptar políticas extraordinárias.

“O Governo irá trabalhar em conjunto com o banco central para garantir que o Japão não derrapa outra vez para uma deflação”, afirmou esta sexta-feira o ministro japonês da Economia, Yasutoshi Nishimura.

A dificuldade para o governo liderado por Shinzo Abe e para o banco central do Japão é que, à semelhança do que acontece também na Europa, começa a ter pouco espaço de manobra para introduzir novas medidas de estímulo para a economia.

A dívida pública japonesa é, em percentagem do PIB, a maior do mundo, em resultado das políticas expansionistas ultra-agressivas seguidas ao longo das últimas décadas para contrariar a deflação. E as taxas de juro do banco central estão, há muito, a zero, deixando apenas a possibilidade de utilização de instrumentos alternativas, como a compra massiva de activos.

Foi isso que a autoridade monetária liderada por Haruhiko Kuroda voltou a fazer na semana passada, sendo considerado muito provável que o venha a repetir durante as próximas semanas e meses.

A economia japonesa deverá, de acordo com as primeiras estimativas, ter registado uma contracção de 4,5% no primeiro trimestre deste ano e poderá, de acordo com a maior parte das previsões, vir a sofrer uma queda superior a 20% no segundo trimestre.

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