Testar, testar e testar

Defendemos que Portugal deve testar todos os casos suspeitos, pois só assim poderemos ter uma noção real do número de pessoas infectadas e só assim poderemos desenhar um plano de acção que esteja em linha com a realidade e que não seja apenas baseado em projecções.

Numa altura de emergência nacional como a que vivemos, temos que estar cientes da importância de uma acção política responsável e construtiva. Ainda assim, não podemos desassombrar a política na sua essência, com a simples justificação das circunstâncias, com o risco de voltarmos a ter cenários negros como os de um passado bem recente. A memória colectiva do País não pode deitar por terra a responsabilidade governativa – e de oposição também –, podendo a representatividade política dos portugueses ser entregue à inércia e às mãos de Deus. Portugal e a Europa, mais do que nunca, necessitam de líderes políticos com coragem para tomar as decisões difíceis, por mais que elas custem. Esta não é a hora do tacticismo político ou eleitoral; não podemos agora valorizar outra coisa que não seja o combate implacável à covid-19, desde logo porque a sua inicial desvalorização enquanto pandemia significou precisamente chegarmos ao estado em que nos encontramos.

Para adoptar as melhores políticas e tomar as melhores decisões é igualmente importante fazer um exercício comparativo com o que de bom e de mau se tem feito fora de Portugal. Nesse exercício, destaca-se o sucesso da Coreia do Sul, que depois de em Fevereiro ter verificado uma escalada abrupta de casos (iniciada com o “paciente 31”) e de terem chegado a confirmar mais de 900 casos por dia (chegando inclusive a ser o segundo país com mais casos no mundo, imediatamente a seguir à China), a verdade é que conseguiram reduzir esse número para cerca de 100, registando “apenas” 1% de fatalidades. Podemos então chegar à conclusão que o que permitiu esse resultado – para além das medidas de distanciamento social que são já adoptadas no nosso actual dia-a-dia – foi a capacidade de realização em massa de testes de despiste à covid-19, o que se revelou como factor absolutamente essencial para se conhecer a dimensão real do problema, para assim o combater de forma mais eficaz.

Portugal parece falhar de forma gritante nesta abordagem. Existem pessoas à espera 72h para realizar teste de despiste, simplesmente porque o sistema não tem capacidade de resposta. No entanto, sabemos que existe capacidade de resposta em laboratórios privados, em projectos como o “drive in” em várias cidades do país, que muito poderão contribuir para uma melhoria deste índice. Esta não é a hora para embirrações ideológicas e de debate pueril de público contra privado, ou vice versa. Daí a Juventude Popular ter precisamente defendido a criação de um grupo de coordenação das unidades de saúde, unindo sector público e privado sob uma resposta conjunta dos recursos disponíveis que garanta a eficiência e eficácia dos recursos disponíveis, de acordo com o grau de necessidade de resposta.

É precisamente nesta capacidade de resposta que nos devemos todos concentrar. Se as actuais estruturas não estiverem adequadas para conseguir articular esta rede, tal como a Juventude Popular já propôs, as Forças Armadas poderiam então ter um papel mais preponderante na coordenação nacional, preparadas que estão para a gestão de cenários de emergência.

Entretanto, temos mesmo de conseguir testar mais e melhor, se quisermos ser mais eficazes no combate ao vírus. É, aliás, o próprio director-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS) quem o afirma: “We have a simple message for all countries: test, test, test”; e acrescenta: “Test every suspected case.

Nesse sentido, defendemos que Portugal deve testar todos os casos suspeitos, pois só assim poderemos ter uma noção real do número de pessoas infectadas e só assim poderemos desenhar um plano de acção que esteja em linha com a realidade e que não seja apenas baseado em projecções.

Sabemos, no entanto, que para que isso seja possível é necessário um investimento significativo. Mas é também aqui que a nossa análise se deve expandir, tomando boa nota de que a Comissão Europeia propôs já a ativação da cláusula de derrogação de âmbito geral do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), o que permitirá suspender as regras de disciplina orçamental dos Estados-membros. Sabemos que essa activação está dependente de aprovação do Conselho Europeu – provavelmente no dia 26 de Março –, mas este é precisamente um dos casos de excepção em que um Estado não pode abdicar de intervir. Igual nota para o facto de, quase em simultâneo, a comissária europeia Margrethe Vestager ter anunciado que a Comissão Europeia irá permitir o aumento e flexibilização dos auxílios de Estado, aumentando as ajudas directas dadas pelos Estados às empresas. Este novo quadro temporário – estas medidas são geralmente proibidas ou limitadas pelas regras europeias da concorrência – deverá vigorar até ao final do ano, podendo ser prorrogado.

É neste momento muito complicado perceber qual a percentagem de pessoas hospitalizadas, de que faixa etária são e quais os sintomas reais. É necessário alertar para a escassa informação disponibilizada pelas autoridades portuguesas relativamente aos casos confirmados e aos que estão sob vigilância, para que se possa ter uma imagem mais completa do impacto que o novo coronavírus está a ter na sociedade portuguesa, condição absoluta para o desenho das respostas críticas que o Estado e a sociedade terão de apresentar.

Este é o momento para todo o país se unir na consciência desta necessidade imperativa – cívica e patriótica – de cada um cumprir escrupulosamente o seu dever. Esse é um desígnio do qual a Juventude Popular na sua qualidade de organização política de juventude e nos seus fins estatutários jamais se eximirá.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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