Pediatras do Hospital de Matosinhos estão quase todos de quarentena

No Pedro Hispano, só uma médica da pediatria não está de quarentena, depois de se ter percebido na quarta-feira que o director do serviço estava infectado com o novo coronavírus. Mas há vários noutros hospitais.

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Paulo Pimenta

Há já muitos médicos e outros profissionais de saúde que contactaram com doentes com covid-19 e que por isso estão de quarentena em casa. E é cada vez mais elevado o número dos que estão mesmo infectados com o novo coronavírus. Isto está a obrigar à transferência de pacientes, à mudança de escalas e até à colocação em quarentena de um serviço no hospital de Matosinhos.

No Pedro Hispano (Matosinhos), só uma médica da pediatria não está de quarentena, depois de se ter percebido na quarta-feira passada que o director do serviço estava infectado com o novo coronavírus. Mas o médico não é o único caso positivo. Na própria direcção desta unidade de saúde vários profissionais ficaram contagiados. Tudo terá começado já na sexta-feira da semana passada quando, após uma reunião de vários directores de serviço, um dos médicos que esteve presente foi diagnosticado com covid-19.

Os outros clínicos fizeram testes e percebeu-se que vários tinham sido contagiados. Antes disso, porém, o director da pediatria já tinha reunido com a sua equipa, o que fez com que praticamente todo o serviço tivesse que ficar de quarentena e impossibilitado de assegurar as escalas da urgência metropolitana do Porto, que está concentrada no hospital de S. João. Por causa disto, a escala de quinta-feira e da madrugada de sexta-feira teve que ser efectuada por internos do S. João e pela única pediatra de Matosinhos que não esteve presente na reunião do serviço de pediatria.

“Estou em casa e não tenho sintomas nenhuns. Da minha equipa, constituída por 17 pediatras e vários internos, apenas dois fizeram os testes, tendo os resultados sido negativos”, contou ao PÚBLICO o director do serviço de pediatria do Pedro Hispano, Cidrais Rodrigues.

Mas este não é caso único. Uma ginecologista do Centro Materno Infantil do Norte (CMIN) teve mesmo que ficar internada porque o seu estado inspira cuidados, soube o PÚBLICO. Dentro do CMIN há ainda vários enfermeiros infectados e um grande número de profissionais de saúde estão em quarentena.

No serviço de oftalmologia do hospital do S. João uma parte substancial dos profissionais de saúde está igualmente em casa, depois de se ter descoberto que um doente estava infectado, revelou um responsável que pediu o anonimato. Também há profissionais de saúde dos hospitais de Gaia, de Aveiro e de Santa Maria da Feira nesta situação. “O problema é que os médicos não estão a ser testados por sistema”, lamenta o responsável do S. João.

No hospital de Santa Maria, em Lisboa, há “uma dúzia de profissionais de saúde” infectados, adianta Nídia Zózimo, médica que chefia uma das equipas de urgência desta unidade. Aqui, vários profissionais de saúde foram para casa só depois de se ter decidido efectuar testes aos doentes com pneumonia. Percebeu-se então que dois tinham covid-19.

Além do caso do Santa Maria, o secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos, Jorge Roque da Cunha, revela que “há seis médicos, três dos quais internados, dois enfermeiros e dois técnicos de fisioterapia infectados no hospital do SAMS [sistema privado de saúde dos bancários]”.

“É preciso fazer testes por sistema e com rapidez aos profissionais de saúde que contactam com doentes em todos os hospitais sem passar pela linha de apoio ao médico [que valida os casos que têm critérios para serem considerados suspeitos e testados], que não está a conseguir dar resposta”, critica. Roque da Cunha diz mesmo que a atender médicos especialistas há do outro lado desta linha “internos do primeiro e segundo ano” a validar casos, o que “não faz qualquer sentido”.

Dificuldade em fazer testes

Mas os profissionais de saúde não estão a ser testados com rapidez apenas porque a linha de apoio ao médico está a funcionar com grandes deficiências. “Também há falta de reagentes para fazer os diagnósticos laboratoriais e isso devia ter sido pensado antes. Devia haver uma reserva de reagentes, tal como de equipamentos de protecção individual. Na altura da gripe A, em 2009, estávamos mais bem preparados, levou-se tudo mais a sério.”

A dificuldade de fazer testes é de tal ordem, conta, que uma médica de um centro de saúde que atendeu um doente com covid-19 — e que a linha de apoio ao médico considerou não ter critérios para efectuar o diagnóstico laboratorial — “vai pagar 120 euros do seu bolso para perceber se está infectada no laboratório privado”. “Isto é gravíssimo”.

“Tem sido um drama para ligar à linha de apoio ao médico. Houve dois casos positivos no meu agrupamento de centros de saúde que estiveram três dias à espera dos resultados dos testes, sendo que no final um deles deu positivo. Os profissionais de saúde deviam ter via verde para fazer os testes”, defende.

A Ordem dos Médicos denunciou na terça-feira que 20% das pessoas infectadas em Portugal são profissionais de saúde e alertou que a falta de equipamentos de protecção individual está a ser o calcanhar de Aquiles do combate ao novo coronavírus. O secretário de Estado da Saúde contrapôs, porém, que nessa altura havia apenas cerca de três dezenas de profissionais infectados, 18 deles médicos, entre os 448 casos positivos existentes nessa altura.

Ontem, o balanço da Direcção-Geral da Saúde dava conta de seis mortes e cinco casos recuperados de um total de 1020 casos já confirmados, mais 235 do que no dia anterior. O número de casos suspeitos ascendia a 7732, mais 1671 do que na quinta-feira.

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